Silêncio de elevador
Carla Hilário Quevedo, i-online 13 Out 2012
O silêncio no elevador é mais do que boas maneiras: é uma questão de sobrevivência
“Para que andar vai?”, perguntou o homem. “Para o quarto”, respondi eu. “Ah, vai para o quarto...”, repetiu, contrariando todas as regras do bom senso que mandam que não se faça uma piada ao velho estilo do Parque Mayer com alguém que não se conhece, sobretudo num elevador. Enquanto pensava se tinha realmente ouvido aquilo que acabara de ouvir, o homem era cuspido no terceiro, deixando-me a mim sozinha e em paz até ao andar seguinte. Nunca mais me aconteceu coisa parecida. Meter conversa no elevador não é proibido, mas há de certeza um pacto antiquíssimo entre os seres humanos que os faz calar mal se abre a porta e se põe o pé no ascensor.
Parece que o tradicional e desejado silêncio de elevador é uma expressão da ansiedade reconhecida e agora descrita por um especialista da Universidade da Carolina do Norte. Lee Gray, depreciativamente conhecido por “o tipo do elevador”, fez um estudo comportamental, como não podia deixar de ser, e chegou a conclusões inesperadas como: andar de elevador é mais seguro que andar de carro. Não é uma novidade que interesse aos agorafóbicos, que continuam a ir pela escada, mas, parecendo que não, é uma informação que fazia falta. Diz Gray que a ansiedade que temos sempre que pomos o pé no elevador está directamente relacionada com a nossa ignorância sobre como anda aquela traquitana para cima e para baixo. Não sabemos como funciona, não vemos o motor, por isso não sabemos o que nos poderá acontecer. Não sabia que um elevador é um pequeno mistério, mas estamos sempre a aprender. Na verdade, o que Gray impinge é a ideia de que tudo se resolve com a leitura de um manual de instruções. Depois de percebermos um bocadinho da física e da engenharia da coisa, ficamos tranquilos. O conhecimento sobre roldanas de ferro fundido trará paz aos nossos corações. Pode até ser, mas nem isso nos fará falar num espaço tão pequeno sempre com gente a mais.
Mais que a ansiedade de não saber como funciona o bicho de metal, é o incómodo de estarmos na companhia de vizinhos, colegas de trabalho ou estranhos que nos faz ter um comportamento pouco natural no elevador. Nunca estamos à vontade. Às vezes nem sozinhos. Lee Gray diz que é uma atitude esquisita. Mas será realmente assim tão estranha? Os metros quadrados são poucos e o contacto é intenso. Não admira que o silêncio impere. Como fugir no caso de haver uma troca de palavras menos agradável? O silêncio no elevador é mais do que boas maneiras: é uma questão de sobrevivência.
Imaginemos que em vez dos habituais dez andares portugueses de média temos as dezenas e centenas das torres norte-americanas. Mesmo com um elevador supersónico, mais veloz do que uma bala, pronto a chegar ao destino uns meros segundos após tocar no botão, continua a haver um problema. Lembremos que o estudo é feito nos Estados Unidos, por causa de uma ansiedade tipicamente americana. São muitas horas passadas em elevadores, mas as conclusões podiam ter sido tiradas aqui ao virar da esquina. Quando se trata de intimidade com estranhos, não há diferença entre dez e 130 andares.
O silêncio no elevador é mais do que boas maneiras: é uma questão de sobrevivência
“Para que andar vai?”, perguntou o homem. “Para o quarto”, respondi eu. “Ah, vai para o quarto...”, repetiu, contrariando todas as regras do bom senso que mandam que não se faça uma piada ao velho estilo do Parque Mayer com alguém que não se conhece, sobretudo num elevador. Enquanto pensava se tinha realmente ouvido aquilo que acabara de ouvir, o homem era cuspido no terceiro, deixando-me a mim sozinha e em paz até ao andar seguinte. Nunca mais me aconteceu coisa parecida. Meter conversa no elevador não é proibido, mas há de certeza um pacto antiquíssimo entre os seres humanos que os faz calar mal se abre a porta e se põe o pé no ascensor.
Parece que o tradicional e desejado silêncio de elevador é uma expressão da ansiedade reconhecida e agora descrita por um especialista da Universidade da Carolina do Norte. Lee Gray, depreciativamente conhecido por “o tipo do elevador”, fez um estudo comportamental, como não podia deixar de ser, e chegou a conclusões inesperadas como: andar de elevador é mais seguro que andar de carro. Não é uma novidade que interesse aos agorafóbicos, que continuam a ir pela escada, mas, parecendo que não, é uma informação que fazia falta. Diz Gray que a ansiedade que temos sempre que pomos o pé no elevador está directamente relacionada com a nossa ignorância sobre como anda aquela traquitana para cima e para baixo. Não sabemos como funciona, não vemos o motor, por isso não sabemos o que nos poderá acontecer. Não sabia que um elevador é um pequeno mistério, mas estamos sempre a aprender. Na verdade, o que Gray impinge é a ideia de que tudo se resolve com a leitura de um manual de instruções. Depois de percebermos um bocadinho da física e da engenharia da coisa, ficamos tranquilos. O conhecimento sobre roldanas de ferro fundido trará paz aos nossos corações. Pode até ser, mas nem isso nos fará falar num espaço tão pequeno sempre com gente a mais.
Mais que a ansiedade de não saber como funciona o bicho de metal, é o incómodo de estarmos na companhia de vizinhos, colegas de trabalho ou estranhos que nos faz ter um comportamento pouco natural no elevador. Nunca estamos à vontade. Às vezes nem sozinhos. Lee Gray diz que é uma atitude esquisita. Mas será realmente assim tão estranha? Os metros quadrados são poucos e o contacto é intenso. Não admira que o silêncio impere. Como fugir no caso de haver uma troca de palavras menos agradável? O silêncio no elevador é mais do que boas maneiras: é uma questão de sobrevivência.
Imaginemos que em vez dos habituais dez andares portugueses de média temos as dezenas e centenas das torres norte-americanas. Mesmo com um elevador supersónico, mais veloz do que uma bala, pronto a chegar ao destino uns meros segundos após tocar no botão, continua a haver um problema. Lembremos que o estudo é feito nos Estados Unidos, por causa de uma ansiedade tipicamente americana. São muitas horas passadas em elevadores, mas as conclusões podiam ter sido tiradas aqui ao virar da esquina. Quando se trata de intimidade com estranhos, não há diferença entre dez e 130 andares.
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