Ideias

Inês Teotónio Pereira, i-online 20 Out 2012


A nossa vida ia correndo melhor ou pior sem precisar das nossas ideias. Se as tivéssemos, melhor, mas não era fundamental
Durante décadas crescemos com a ideia, com a sensação, de que as nossas vidas só podiam melhorar ano após ano. E pior, de que o nosso sucesso nem sequer dependia muito do nosso desempenho. Haveria sempre dinheiro, haveria dinheiro para tudo. Durante anos demitimo-nos de pensar em soluções para problemas que pareciam não existir e demitimo-nos de ter ideias porque não era preciso. A nossa vida ia correndo melhor ou pior sem precisar das nossas ideias. Se as tivéssemos melhor, mas não era fundamental. Crescemos assim. Sem stresse. Agora o mundo mudou e nós, habituados que sempre estivemos à segurança, olhamos para a incerteza e temos suores frios. Agora depende de nós. Das nossas ideias. E mesmo assim… Medo.
Quando acabei este raciocínio entrei em casa. Ideias? Nada melhor que os meus filhos para terem ideias. E foi assim que inaugurei mais uma daquelas conversas provocadas (e não fabricadas) com o intuito de indagar quais as soluções que os meus filhos tinham para o país. Não se falou de política – conceito que eles ainda não interiorizaram –, também não se falou da troika – entidade que eles também ainda não interiorizaram. Foi uma conversa mais leve e acessível sobre economia. Sobre quais os mecanismos que no entender deles podem relançar a nossa economia e ideias inovadoras que captem investidores e consumidores estrangeiros e, por outro lado, medidas inovadoras centradas na internacionalização e nas exportações. Ainda tentei que eles se pronunciassem sobre a política fiscal e sobre o programa de estabilização financeira, alargamento de prazos, redução de juros… Mas nestes temas eles optaram por manter o silêncio. Não se quiseram pronunciar.
Perante um focus group que varia entre os 4 e os 12 anos, a minha expectativa era grande. E a primeira intervenção não quebrou essa expectativa. Primeira ideia: apresentar ao mundo o “novo português”. Segundo um dos meus filhos, é importante para o país que o mundo conheça os “jovens portugueses, o novo português. Tipo, as pessoas do surf, do futebol, da música; tipo, os portugueses que têm estilo e ideias diferentes daqueles, tipo, do fado e das coisas assim mais chatas”. Como? “Então, pelo facebook, pela net e pela televisão! Assim, as pessoas do mundo vêm cá ver esses portugueses e nós vendemos as nossas coisas a eles e eles deixam cá o dinheiro”.
O outro apresentou a sua versão de um processo de industrialização e da missão do AICEP: “Os portugueses constroem coisas, como brinquedos, roupas, motas e carros de corridas e depois vão até aos outros países de comboio com as coisas e vendem por euros e trazem os euros para cá.” Como é que vendem? “Então, fazem uma feira nas ruas dos outros países com cartazes.” E como é que constroem? “São criativos, como nós temos de ser nas aulas.”
Houve também um deles que revelou uma tendência de alguma forma proteccionista como forma de diminuir as importações. Ou seja: “Não podemos dar os nossos euros aos outros!” Mas… como se resolve isso? “Proibimos as lojas de vender iPads, iPods e telemóveis e essas coisas, porque são coisas que as lojas têm de comprar na América.” E então? “Então as pessoas gastavam os euros com as coisas dos portugueses e não com as coisas da América.” E quem proibia? “A polícia.”
E na educação?, perguntei a medo tendo em conta o discurso securitário que dominava a conversa. Não será esta área fundamental para o futuro? E como conciliar o investimento na educação com as limitações orçamentais? Hein? “Ora bem”, disse ele, “mas para isso não é preciso dinheiro… é preciso estudar.”

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