Viciados em telemóveis inteligentes

Isabel Stilwell
Ionline, 2013-12-14
Não precisamos de ser estúpidos para nos viciarmos em telemóveis inteligentes.O Downside quer reabilitar-nos. A tempo do Natal.
Case Study - Dou por mim a acordar e a estender a mão para o telemóvel. Dou por mim, num gesto automático, a clicar no Facebook para ver se há algum comentário novo. Entro no comboio e, em lugar de observar os outros passageiros, e de ir ouvindo e entrando nas suas conversas - uma fonte constante de inspiração e divertimento -, vou verificar se alguém me mandou um novo mail. E há dias em que a viagem acaba sem que saiba se chove ou faz sol - dúvida que, diga-se de passagem, já vi gente mais doente do que eu a resolver abrindo uma aplicação de meteorologia, em vez de olhar lá para fora. Quando sou obrigada a separar-me do objecto, sinto um nervoso miudinho do estilo, "E se alguém me mandou um sms a dizer que o mundo acabou e eu não vi?"
Prevalência - 92% da população residente é cliente de um serviço de telemóveis. A utilização efectiva é de 124 por cada 100 habitantes - há, pelo menos, 24% de portugueses que têm dois telefones. E embora o número de telemóveis activos tenha caído para o valor mais baixo desde 2010, convenhamos que 13 milhões é considerável. E tenderá sempre a crescer. Segundo um estudo da Marktest de Abril de 2013, dos utilizadores de telemóveis, 76% envia SMS, 13,8% acede neles às redes sociais e 12,9% usam-nos para consultar emails. Por mês, o número médio de minutos de conversação é de 147, e enviam-se 6,6 milhões de mensagens. Os smartphones ultrapassam os telemóveis convencionais, representando 55% do mercado.
Diagnóstico - Zach Mainen, que dirige o programa de Neurociência da Fundação Champalimaud, em entrevista ao "Expresso" chamou a atenção para como o nosso cérebro se vicia rapidamente em recompensas. E uma mensagem de alguém de quem gostamos ou um comentário positivo no Facebook é uma recompensa. Funcionam como pequenas doses de droga, explicou. Mas o mais curioso é que, se o prémio lá estivesse sempre, cansávamo- -nos rapidamente do jogo, porque o que nos torna dependentes é o facto de só às vezes conseguirmos ganhar. Mainen diz: "A forma de fazer alguém repetir um comportamento é torná-lo aleatório. Se acontece de vez em quando, isso parece tornar o cérebro mais ávido." Não é, no entanto, uma inevitabilidade, acrescenta, já que podemos fazer escolhas.
Rehab - Não é precisa grande introspecção para perceber o que vai acontecer se passarmos o tempo a interromper a nossa ligação à realidade e às pessoas que fazem parte dela. Nem para entender como é efémera a felicidade de um like, ou os comentários de gente que nunca vimos mais gorda. O caminho da auto-análise, já agora, pode levar--nos a perceber o que fazer para que as recompensas e as surpresas não venham (maioritariamente) de um ecrã.
Medicamento - Tal como o tabaco, que nos maços anuncia que mata, também quem vende iphones cria aplicações para salvar os utilizadores do seu uso! Downside ( www.downsideapp.com), é um "jogo simples que o vai levar a conversar outra vez". O trailer mostra um grupo de amigos num bar, agarrados ao telemóvel, enquanto uma voz em off recomenda que foquem a atenção em quem está na mesma sala. Depois, todos activam a aplicação e colocam o telefone na mesa, com o ecrã para baixo. De repente, um distrai-se e pega-lhe de novo. Perde e paga uma rodada, mas o castigo é a escolha. Os criadores da app garantem que, à medida que a conversa aquece, os participantes esquecem o telemóvel, viciando-se uns nos outros. Comece já a treinar para o Natal.
Nota final - Se está em reabilitação, tenha cuidado com o tédio. Recomenda-se que evite, por exemplo, comentadores a darem palpites sobre o Tribunal Constitucional.

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