Sampaio da Nóvoa e a liberdade: uma relação ambivalente

André Azevedo Alves
Observador 9/1/2016

Sampaio da Nóvoa ama tanto a liberdade que quer evitar que os jornalistas abusem dela fazendo perguntas inconvenientes. Tal como nem sequer consegue definir o seu posicionamento face ao 25 de Novembro
A recentemente lançada biografia de Sampaio da Nóvoa – apresentada por Vasco Lourenço e Pacheco Pereira na Associação 25 de Abril – tem por título “Evidentemente, a Liberdade” mas, infelizmente, a relação do referido candidato presidencial com a liberdade é tudo menos clara e evidente. Embora – tal como acontece no título da biografia – a liberdade seja um valor frequentemente invocado pelo candidato, tanto a prática da candidatura como o passado e o presente político de Sampaio da Nóvoa deixam muito a desejar dessa perspectiva.
Começando pela candidatura, é absolutamente lamentável a queixa apresentada por Maria do Rosário Gama – dirigente da APRe! (associação de Aposentados, pensionistas e reformados) e mandatária para a “Cidadania Sénior” de Sampaio da Nóvoa – contra o jornalista José Rodrigues dos Santos. Como a tentativa de intimidação e condicionamento levada a cabo pela mandatária não foi prontamente desautorizada por Sampaio da Nóvoa, é legítimo considerar que a mesma se insere na estratégia da candidatura. É caso para concluir que Sampaio da Nóvoa ama tanto a liberdade que quer evitar que os jornalistas abusem dela fazendo perguntas inconvenientes.
A fazer fé nas sondagens conhecidas até ao momento, existe uma possibilidade real de o candidato Sampaio da Nóvoa passar à segunda volta nas eleições presidenciais. Faz por isso todo o sentido escrutinar também o passado político do candidato e tentar ir além das proclamações grandiloquentes e plenas de chavões mas vazias de conteúdo com que habitualmente brinda quem o escuta. Infelizmente, essa é uma tarefa difícil já que, além da sua passagem pela LUAR (Liga de Unidade de Acção Revolucionária) e da sua constante evocação dos “valores de Abril” e do “anti-fascismo”, pouco é possível saber.
Relativamente ao passado, é sintomático também que o candidato Sampaio da Nóvoa nunca tenha renegado explicitamente os seus tempos de radicalismo revolucionário. Como pertinentemente assinalou Diogo Freitas do Amaral numa recente entrevista à TVI24, não é de todo claro o posicionamento de Sampaio da Nóvoa relativamente ao 25 de Novembro de 1975. E isso é grave para um candidato que, presumivelmente, pretende ir além da extrema-esquerda e cativar também votos da esquerda democrática.
Para quem preza a liberdade, o presente político de Sampaio da Nóvoa não é mais animador. As duas principais forças partidárias que apoiam oficialmente o candidato são ambas de extrema-esquerda: o PCTP-MRPP (que obteve cerca de 60.000 votos nas últimas legislativas) e o Livre (que se ficou por pouco mais de 39.000 votos). Não é possível ignorar, claro, que há uma parte do PS que também apoia Nóvoa mas nem isso é tranquilizador, já que se trata da facção radical que encara como positiva a constituição de uma frente governativa com a extrema-esquerda.
Daí que o mais preocupante em Sampaio da Nóvoa não sejam a quase absoluta falta de experiência politica nem o confrangedor vazio do discurso, mas o que esse vazio oculta. O candidato que corporiza a “geringonça” frentista é um produto típico daquela que é porventura a mais radicalizada micro-cultura do país: as faculdades e departamentos de ciências sociais e humanidades das universidades estatais.
À semelhança da investigadora Raquel Varela, o ex-Reitor – e depois director da iniciativa de Políticas Públicas da Universidade de Lisboa – Sampaio da Nóvoa evidencia uma concepção de “liberdade” própria das elites revolucionárias. Que em 2016 um candidato assim tenha reais possibilidades de passar à segunda volta mostra bem o estado a que o país chegou.

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