O novo ministro Nogueira

Inês Teotónio Pereira
online 2016.01.12
Não é para todos: ser ministro da Educação e ser elogiado por Mário Nogueira é o mesmo que ser Jorge Jesus e ter o Pedro Guerra como fã.
Finalmente temos um ministro da Educação verdadeiramente socialista. Um ministro que num mero comunicado lacónico acaba de forma lapidar com os exames do 4.o, 6.o e até os exames de inglês do 9.o ano, que iam começar este ano. Um ministro que literalmente não dá cavaco a ninguém. Sim, porque acabar com os exames do 4.o é para meninos, para socialistas de meia-tigela, do centrão; já acabar com os do 6.o e conseguir arranjar um novo exame de Expressões – sim, Expressões – é de homem, é coisa de gente crescida, própria de políticos de referência, de estadistas, vá. Pois este fim de semana percebemos que o novo ministro da Educação não é nenhum menino de coro que foi teletransportado de um laboratório científico para a 5 de Outubro sem saber o que é um ciclo ou uma meta curricular. Nada disso, o novo ministro da Educação é um ministro socialista daqueles que já não se fazem: experiente, conhecedor, que rasga a direito, que não quer saber dos chatos do Conselho Nacional de Educação, que não quer saber de conversas com a chata da sociedade civil ou de debates com os chatos do parlamento. Ele vai direto ao assunto, com a convicção e a audácia dos grandes homens. Um homem com ideias sólidas sobre a estabilidade do sistema, com uma visão – uma visão para as Expressões, por exemplo.
E prova disto é que décadas e décadas após Abril temos finalmente um ministro que é elogiado pela FENPROF. Pois se eu mandasse diria que, além dos DD de Abril, acrescentaria um E finalmente conquistado: o E de elogio de Mário Nogueira. Não é para todos: ser ministro da Educação e ser elogiado por Mário Nogueira é o mesmo que ser Jorge Jesus e ter o Pedro Guerra como fã. Para isso é preciso ser verdadeiramente magnânimo, pensar grande, ser radical, arrojado, ser, enfim, um ministro sem medo. Alguém que não precisa de avaliações externas para avaliar o sistema – ele afere tudo –; alguém que não precisa de pensar nem de conversar – ele faz –; um ministro que sabe que é Mário Nogueira quem mais ordena, que o reconhece como o grande educador nacional e como o verdadeiro dono disto tudo. Temos finalmente um ministro do sistema, daqueles que podem forrar as paredes da 5 de Outubro que ninguém perceberia a diferença entre o papel de parede e o ministro.
Dá pena, eu sei, alguma nostalgia até: estávamos todos habituados a ministros da Educação que mobilizavam os sindicatos, inspiravam a criatividade nos insultos, motivavam greves, davam mote à agitação, irritavam o PCP. E agora? Agora acabou tudo. Quem é que vai fazer greve? As escolas vão abrir todos os dias? Os professores não vão mais para a rua? E o PCP vai fazer o quê, se já nem o ministro dos Transportes chateia, meu Deus? Quem vai pedir a demissão do ministro da Educação? Acabar assim com tradições de vidas não se faz. Faz parte das funções de um ministro da Educação enervar Nogueira e companhia, assim como se espera que o sol nasça todos os dias. Mas este novo ministro, em vez de ir à Nazaré surfar uma onda gigante, resolveu ser radical no governo, desprezar todo o esforço feito durante anos por figuras da esquerda à direita a enervar Mário Nogueira e acabar nos braços da FENPROF. Não há respeito pelas figuras da esquerda à direita, está visto. Agora só falta decretar o fim das escolas privadas, o fim dos contratos de associação, alterar a contratação de professores de forma que o sistema fique com um professor por aluno e anunciar o fim das notas e das avaliações, pois aferir é o que está a dar e as crianças e os médicos deviam rir mais. Enfim, alguém sabe como se organizam manifestações contra sindicatos?

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