Gasolina mais barata é bónus da América

LEONÍDIO PAULO FERREIRA
DN 20 outubro 2014

Se desta vez a guerra no Iraque e na Síria ou o caos na Líbia não fazem subir o preço dos combustíveis, agradeça aos Estados Unidos. Graças às novas técnicas de extração, o Texas e o Dacota roubam protagonismo ao Médio Oriente. E, de repente, ao contrário do que era lógico, o preço do barril de petróleo está em queda, mesmo que aviões bombardeiem os jihadistas e até destruam as refinarias prefabricadas que o Estado Islâmico montou para se financiar.
Depois de ter atingido os 115 dólares em junho, o crude é agora vendido abaixo dos 85. A grande explicação para a descida, pode ler-se no Financial Times, é o boom da produção americana. Esta atinge os 8,8 milhões de barris por dia, mais 10% do que em 2013 (e mais 80% do que em 2008!). E se falta cumprir-se a profecia de que será o maior país petrolífero, a verdade é que a América já morde os calcanhares da Arábia Saudita e tem a Rússia na mira.
Surpreendente é os membros da OPEP não reduzirem a produção para subir preços. E aqui há explicações económicas, mas outras que têm que ver com a geopolítica. Nas primeiras surge a necessidade de os países do Médio Oriente competirem com o crude americano e também não entravar o débil crescimento mundial. Já as segundas são mais complexas, mas entende-se que nem Arábia nem Koweit queiram guerra de preços com a América quando esta, sua guardiã militar há décadas, tenta acabar com os jihadistas que antes recebiam apoio desses países.
Sem a soma das duas lógicas, é incompreensível o ligeiro aumento do número de barris sauditas em setembro, quando os preços já deslizavam, ou a confissão do ministro do Petróleo koweitiano de que não pensa que "haja hoje hipótese de os membros da OPEP reduzirem a produção".
Nenhuma destas monarquias árabes está, porém, com a corda na garganta. O maná petrolífero dos últimos anos permitiu amealhar grandes reservas de divisas, que no caso da Arábia andarão entre 700 e 800 mil milhões de dólares, 20 vezes mais do que as perdas previsíveis.
Que este bónus americano não alivie tanto o bolso dos consumidores como pareceria justo é explicado pela estrutura de preço da gasolina, com o barril a pesar nela menos do que os impostos (mais de 50% em Portugal). Mesmo assim a Economist calcula que o crude baixar dez dólares representa a transferência de 0,5% do PIB global dos países produtores para os outros.
Daí que estas boas notícias para alguns, como os europeus, e más notícias suportáveis para outros (os árabes), possam ser péssimas para a Venezuela ou para a Rússia, como o próprio presidente Putin já admitiu ao queixar-se de que "a economia global vai sofrer se o preço do barril de petróleo continuar nos 80 dólares". Digamos que a América tem uma nova arma.

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