Agora é que é

Inês Teotónio Pereira
DN 2016.04.09
O que eu estranho é que as crianças estudem, que apesar de tudo estudem e aprendam. Desde que tenho filhos em idade escolar, e já lá vão uns aninhos, que se discute o sistema de ensino. Discute-se tudo. O processo é sempre o mesmo: alvoroço, greves, debates, revolta, reportagens, estudos, relatórios até ao "agora é que é". E lá é: faz-se um chinfrim e muda-se uma coisita ou outra. Chama-se a isto "o início de uma reforma do ensino" ou "um novo paradigma para a educação" . Depois, discute-se tudo outra vez até a um novo "agora é que é". E volta tudo ao mesmo. Mudando-se tudo outra vez numa espécie de movimento perpétuo de "reformas". Há exames, depois não há; há manuais gratuitos mas afinal já não são todos gratuitos; há disciplinas obrigatórias que o são num ano mas deixam de ser no ano seguinte; há ensino vocacional, mas só para ver como é; mudam-se os currículos, mas afinal os novos não servem. E lá é outra vez. Entretanto os miúdos vão crescendo. Chegam à universidade aos solavancos - os poucos que chegam - e alguém lhes diz: "O que é que vocês andaram a fazer na escola? Não se concentram, não sabem nada, escrevem você com ç!" E num lacónico encolher de ombros, as universidades adaptam-se aos tempos e tratam de especializar a clientela à qual se chama a "melhor geração de sempre". Se você tem ç, não interessa. Interessa que há mais diplomados do que "dantes". Não conta qual a proporção, em quê, qual a origem socioeconómica dos diplomados e com que exigência. Depois, há os melhores. Aqueles que estudassem onde estudassem, com os piores ou os melhores professores, seriam sempre os melhores. São normalmente os que emigram. Mas isto era dantes. Agora está tudo bem. Já ninguém emigra, a paz e a estabilidade voltaram às escolas, o insucesso acabou, os meninos aprendem, os professores estão felizes e não há nada para discutir. É o milagre socialista em apenas quatro mesinhos. Agora é que é mesmo.

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