O rosto da misericórdia

Aura Miguel
RR04 Dez, 2015

O jovem Stanislas fura a barreira e avança, veloz, na sua cadeira de rodas, em direcção ao papamóvel. Francisco debruça-se e fala alguns minutos com o rapaz que perdeu as pernas num violento ataque que matou a sua família. A sua história perde-se na infinidade de outras tantas feridas, lutos e horrores que afligem a República Centro Africana.
Quando o papamóvel entrou no estádio de Bangui, na passada segunda feira, sob fortes medidas de segurança, a multidão dos fiéis aclamou Francisco, de forma ensurdecedora. E, enquanto o povo aplaudia nas bancadas, bem distantes da esburacada pista de tartan por onde o Papa ia passar, sob o olhar atento de uma fila quase compacta de capacetes azuis, eis que o jovem Stanislas fura a barreira e avança, veloz, na sua cadeira de rodas, em direcção ao papamóvel.
Francisco debruça-se e fala alguns minutos com o rapaz que perdeu as pernas num violento ataque que matou a sua família. A sua história perde-se na infinidade de outras tantas feridas, lutos e horrores que afligem a República Centro Africana. Talvez por isso - por todos desejarem aquele mesmo encontro pessoal - os aplausos soaram mais forte quando o Papa se debruçou sobre o jovem. Ninguém sabe do que falaram. Mas o que toda a gente viu foi um Stanislas esfuziante, rodopiando na pista fazendo vários “peões” e “cavalinhos” e esbracejando, enquanto conduzia a sua cadeira de rodas para fora do recinto.
“Deus é mais forte do que tudo. Esta convicção dá ao crente serenidade, coragem e a força de perseverar no bem diante das piores adversidades”, disse o Papa, na véspera, quando abriu a Porta Santa na catedral e proclamou Bangui “a capital espiritual do mundo”. Ou seja, o apelo ao valor do perdão e da misericórdia foi proclamado no país que mais deles precisa e numa das maiores periferias do mundo: a capital da República Centro Africana.
Na bula “O rosto Misericórdia”, dirigida aos fiéis do mundo inteiro, Francisco deseja “que o Jubileu seja uma experiência viva da proximidade do Pai, como se quiséssemos sentir pessoalmente a sua ternura, para que a fé de cada crente se revigore e assim o testemunho se torne cada vez mais eficaz”.
A experiência viva desta proximidade e ternura teve-a Stanislas e tantos milhares de africanos que, apesar dos sofrimentos e misérias - ou talvez por isso - não esqueceram o essencial e mereceram a preferência do Papa.
Nós, os mais distraídos do “primeiro mundo”, ainda estamos a tempo.

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