A crise do euro e a prioridade nacional

Público 2011-09-19  João Carlos Espada
A tese socialista de que a crise do euro deve ser superada através de mais federalismo é certamente digna de avaliação. Mas...

Infelizmente, a reunião dos ministros das Finanças da zona euro, que teve lugar na Polónia, em Wroclaw, não pôs termo à ansiedade global face ao futuro da moeda europeia. Apesar das declarações optimistas, cresce a percepção de que a Grécia pode entrar em incumprimento dentro de poucas semanas. E cresce a apreensão sobre os efeitos desse incumprimento - não só sobre os bancos mais expostos à dívida grega, mas também sobre os países com maiores dificuldades financeiras, entre os quais Portugal. Nesta conjuntura, a prioridade portuguesa é incontornável: usar o pouco tempo disponível para se distinguir da Grécia, mostrando que, apesar das dificuldades de liquidez, o país é solvente.
Esta prioridade nacional parece ter sido percebida pelos eleitores, mais do que propriamente pelos partidos da oposição. Numa recente sondagem internacional promovida pelo German Marshall Fund, os portugueses surgem à cabeça da lista dos que são favoráveis a reduções na despesa do Estado. Que o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda não percebam isto, é compreensível. Mas que os socialistas, que negociaram o acordo com a troika, aparentem não querer perceber é incompreensível e pode vir a ser imperdoável.
A tese socialista de que a crise do euro deve ser superada através de mais federalismo é certamente digna de avaliação. Mas deve ser compreendido que, ainda que fosse viável e desejável, não resolveria as dificuldades imediatas do euro e, sobretudo, de Portugal no euro.
A opinião pública europeia está crescentemente dividida relativamente ao futuro do euro. Essa divisão é hoje particularmente visível na Alemanha, onde a chanceler Merkel, ao contrário do que tem sido dito, ocupa uma posição centrista. Entre a opinião pública, crescem dois blocos rivais: um preconiza a criação de eurobonds e de maior integração europeia; o outro defende a saída da Alemanha do euro e a criação de uma nova moeda com a Áustria, a Finlândia e a Holanda.
O recente acórdão do Tribunal Constitucional alemão veio certamente contrariar os que consideravam inconstitucional a participação da Alemanha nos empréstimos de emergência a países-membros do euro. Mas a argumentação do acórdão reforça as dificuldades para a criação de qualquer sistema permanente de transferência de fundos para outras economias. Isso só acentua a complexidade e inevitável morosidade de qualquer projecto de maior integração europeia.
Por outras palavras, qualquer projecto de maior integração europeia não teria tempo de evitar o possível incumprimento da Grécia. Se este acontecer, a zona euro será confrontada com uma emergência: evitar o contágio do incumprimento grego. Nessa emergência, Portugal só tem uma escolha: distinguir-se do caso grego.
Esta é uma razão poderosa para um consenso nacional, que abranja os partidos do Governo e o maior partido da oposição, em torno do cumprimento acelerado do acordo com a troika. A alternativa à aplicação do acordo com a troika não é a criação de eurobonds: é a descredibilização da economia portuguesa na zona euro, com as tremendas consequências que daí adviriam.
Por outras palavras, a prioridade nacional consiste em distinguir Portugal da Grécia, isto é, mostrar que, apesar das dificuldades de liquidez, Portugal não está insolvente. Essa prioridade só será conseguida através do cumprimento acelerado do acordo com a troika. Todos os actores públicos - políticos, económicos, sindicais, cívicos - são hoje chamados a definir-se perante esta prioridade. E serão amanhã julgados pelos portugueses consoante a definição que assumirem hoje.

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