Uma lista

Público 2011-09-8 Pedro Lomba

Rapazes e raparigas deste nosso Portugal: dentro de algumas semanas estareis, muitos de vós, no primeiro ano das faculdades, começando uma vida nova. Não sabeis o que esperar, se excluirmos esta ansiedade doentia do país que tudo contamina. Há 20 anos, o enredo era mais simples e previsível. Cursávamos sem drama, encontrávamos um emprego sem drama e por lá nos arrastávamos também sem drama. Cavaco Silva garantiu-nos progressões automáticas no Estado; Guterres, juros bonificados na casa; Sócrates, um futuro moderno e cerúleo. Hoje, a vida fácil acabou: os loucos anos 90 transformaram-se nos miseráveis anos 10. As nossas possibilidades tornaram-se limitadas e a grande recessão é hoje o grande retrocesso. Perdidos, compungidos, estais mais do que nunca precisados de orientação. Mas nada de desesperos. Há saídas, há atalhos, há juventudes partidárias. De resto:

- Esqueçam obsessões com a carreira ou com o "temor do desempenho". Aos 18 anos, a mentalidade carreirista, além de um desperdício, é em absoluto inútil. Muitos de vocês nem sequer terão uma só carreira; o mais certo é que tenham várias e em diferentes períodos da vida. Não vivam, por isso, atormentados com notas e resultados. Tenham o bom gosto de desprezar os maus professores e as más aulas. Ponham de lado os troféus de coisa nenhuma. Sobretudo: não cansem depressa o gosto por aprender.

- Dediquem-se à rotina das aulas, mas façam coisas, fundem coisas, proponham coisas. Irritem os instalados que chegaram há 20 anos e nada fizeram nos últimos 15. Comecem uma revista, se quiserem fazer uma revista; uma associação, uma empresa, um movimento, qualquer coisa que não se limite ao protesto e à reivindicação. Sejam lunáticos. Comecem e acabem. Nenhum empregador olha, ou devia olhar, apenas para as qualificações académicas de uma pessoa. O importante são as pequenas pegadas que essa pessoa vai largando.

- Aprendam a ser mecânicos, burocráticos, tarefeiros. A esmagadora maioria de nós não veio ao mundo para ser o Steve Jobs. Aprender a trabalhar numa organização cumprindo tarefas medidas e interiorizando uma disciplina conta mais que aspirar eternamente à originalidade.

- Leiam tudo. Leiam a Ética a Nicómaco de Aristóteles para perceberem o significado da palavra "virtude". Leiam os moralistas franceses do século XVII para perceberem o significado da palavra "hipocrisia". Leiam Stendhal para perceberem que o ser humano até o seu próprio sofrimento finge.

- Preparem-se para viver um ano no estrangeiro. Escolham um destino na Ásia ou na América do Sul. Portugal está cheio. Só terão espaço os que trouxerem espaço.

- Aprendam um ofício, uma experiência, de preferência prática, que nada tenha que ver com o curso. O americano Matthew Crawford escreveu em 2009 um livro precioso que merece memória. Depois de terminar um doutoramento em Filosofia Política, a insatisfação não o largava. Decidiu mudar de vida. Aprendera mecânica na adolescência e abriu uma oficina para reparação de motas. Descobriu a sua vocação.

- Aprendam uma língua estrangeira. Se ainda não sabem inglês, aprendam; se já sabem, aprendam outra. Sigam o exemplo de Durão Barroso, que muito possivelmente não teria presidido à Comissão Europeia se não fosse fluente em francês.

- Leiam sobre uma grande personagem histórica (e que não seja Churchill). Descobre-se muito lendo sobre figuras que foram sobre-humanas no seu tempo, embora tivessem passado pelos piores ordálios. Lincoln, por exemplo: numa certa fase da vida, sofreu uma depressão violenta e ponderou o suicídio. Não existe sucesso sem uma descida ocasional aos infernos.

- Se for preciso, desistam. Pensamos muitas vezes na educação como uma experiência vitoriosa. Acontece que pode ser uma derrota libertadora. Portas que se fecham, mudança de trajectória. E o mais curioso disto é que ainda bem. Aprender seriamente significa ficar exposto a uma derrota possível, a um erro possível. O que não tem de ser um problema. Conheçam as vossas fronteiras. Jurista

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