Não são “erros”, mas crimes

JOSÉ MILHAZES   28.11.16   OBSERVADOR

Se Catarina Martins tivesse empregue a palavra "crimes" não teria coragem de lhe chamar "grande homem". Então um grande homem podia tratar tão mal as minorias defendidas com tanto ardor pelo Bloco?


É útil ouvir várias posições sobre uma mesma pessoa, tanto mais quando se trata de uma figura da envergadura de Fidel Castro, mas cansa ouvir a fórmula “se por um lado…, por outro” para justificar mais um ditador carniceiro.
Na semana passada, quando ouvi na Antena 1 uma conhecida professora e investigadora falar do “populismo”, notei que ela apenas foi buscar exemplos à direita, como se essa doença não afectasse a esquerda. Falou de Hitler, mas se substituísse esse nome por Estaline, ninguém daria conta de nada, porque encaixava como uma luva no mesmo texto.
Fidel Castro era um populista e demagogo, ficando os seus discursos longos, ocos e enfadonhos como um dos exemplos mais evidentes disso. O seu ego era mais importante do que o tempo e a paciência dos ouvintes.
É verdade que ele e um grupo de barbudos derrubou a ditadura odiosa de Fulgêncio Batista, mas não é menos verdade que ele impôs uma ditadura igual ou pior, porque as ditaduras não são boas quando são de esquerda e más quando são de direita. Ditadura é ditadura e o resto é demagogia.
O regime de Fidel matou milhares no seu próprio país, muitos mais do que Pinochet ou Salazar, mas se a esses juntarmos as vítimas da “ajuda internacionalista” a Angola, Etiópia, etc., etc. , ele talvez roube a palma da crueldade a Francisco Franco ou a outras figuras odiosas da direita. Por isso, deve-se fazer um minuto de silêncio não pelo carrasco, mas pelas vítimas.
Um parêntesis para falar da “ajuda internacionalista e humanitária” do regime de Fidel. Será que ainda haja alguém que não saiba que não se tratava, nem se trata de ajuda, mas de puro negócio? Será que ainda haja alguém que não saiba que, por exemplo, Angola pagou muito caro pelo “apoio” cubano? O governo do MPLA, ou mais precisamente, o povo angolano, pagaram com as suas riquezas naturais. Será que os médicos exportados por Cuba são voluntários e não recebem salários pelo trabalho que fazem? Claro que recebem, e ainda bem que assim é, mas não me venham falar de internacionalismo proletário ou de ajuda fraternal desinteressada.
É verdade que a medicina cubana fez fortes avanços, mas isso não justifica que grande parte da população viva na miséria. E para que serve uma boa medicina se a população vive em condições desumanas? Não será para ganhar dinheiro com a exportação de médicos e com a realização de operações cirúrgicas pagas pelos estrangeiros com os malditos dólares ou rublos?
É verdade que o embargo económico americano foi contraproducente e dificultou a vida aos cubanos, mas não pode servir para justificar todas as asneiras da “experiência socialista” do regime de Fidel. Não nos devemos esquecer que, entre 1961 e 1991, Cuba recebia apoio do bloco comunista do Leste da Europa, que os comunistas portugueses continuam a considerar o “paraíso perdido”. Então a superpotência soviética não tinha meios financeiros para transformar a pequena “ilha da liberdade” numa montra para o Ocidente, um lugar de “virtudes socialistas” para onde os norte-americanos quisessem fugir, a nado ou de barco, do maldito capitalismo?
Para mim não me estranha este tipo de propaganda, pois ela é copiada a papel químico da soviética, que deu os resultados que todos nós sabemos. Por exemplo, a Segunda Guerra Mundial servia e serve para explicar todas as dificuldades da economia e da sociedade soviéticas, não obstante ela ter terminado em 1945. Os maiores obstáculos à agricultura soviética eram a Primavera, Verão, Outono e Inverno, como rezava uma velha anedota soviética.
Fidel Castro privou os cubanos dos mais elementares direitos cívicos através de um sistema repressivo que pouco diferia do regime estalinista. E é ridículo explicar isso com o embargo norte-americano ou com a defesa da revolução. Não, a explicação disso é simples e clara: o regime de partido único não sobrevive sem ditadura e repressão.
Aqui até estou de acordo com Catarina Martins, do BE, que afirmou que essa força política nunca deixou de denunciar, desde logo um regime de partido único que negava liberdades e que perseguiu pessoas pela sua diferença”. Mas acho estranho, para não dizer intelectualmente desonesto, o eufemismo por ela empregue: “erros”. Não são erros, mas crimes contra a lei e a humanidade. Se Catarina Martins tivesse empregue a palavra “crimes”, talvez não tivesse coragem de lhe chamar “grande homem”. Então um grande homem podia tratar tão mal as minorias defendidas com tanto ardor pelo Bloco de Esquerda?
Ai quando os cubanos e a opinião pública mundial tiverem acesso à informação plural e aos arquivos da polícia política e do Partido Comunista de Cuba! Alguns irão abrir a boca de espanto, mas outros continuarão a justificar os crimes revelados, como as ligações do regime cubano ao tráfico de droga e ao terrorismo na América Latina e noutros cantos do mundo.
Isto não vos faz lembrar o XX Congresso do Partido Comunista, não do Português, que apenas terá lugar no início de Dezembro, mas do PC da URSS, que teve lugar em 1956, quando foram denunciados os crimes de Estaline? A mim faz, assim como me traz à memória a posição de muitos admiradores e seguidores do ditador soviético: foram cometidos erros, mas…
Mas o quê? Sejamos honestos e tiremos as devidas conclusões para que tragédias semelhantes não se repitam. Repito a minha posição: entre Hitler e Estaline, venha o diabo e escolha. Os direitos humanos são universais, e não propriedade da esquerda ou da direita, divisão cada vez mais obsoleta.

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