Pais e mães

Inês Teotónio Pereira
Ionline 2013-10-19

Por mais megera e severa que seja uma mãe, os filhos têm sempre mais respeitinho pelos pais
Numa época em há mais mulheres do que homens nas universidades, em que os quartéis estão apinhados de mulheres militares, em que os homens cozinham e lavam a loiça e em que toda a gente tem uma opinião sobre o sacerdócio das mulheres, há que dar um esclarecimento no que diz respeito aos pais. É assim: os pais são diferentes das mães. Aqui, meus senhores, não há igualdade de género. Sei que parece absurdo, mas é um facto que um pai e uma mãe são géneros completamente diferentes.
Os filhos olham para os pais de uma maneira, e para as mães de outra. Eles discriminam-nos vergonhosamente. Para eles, cada um tem o seu lugar, a sua função, e são completamente diferentes. Os filhos, por mais liberais, bloquistas ou anarquistas que sejam, são absolutamente segregadores em relação aos pais. Não há cá igualdades neste domínio parental. Em tudo o resto até pode haver. Eles podem até achar que, entre o cão e os irmãos, as diferenças são ténues, mas os pais não. Para eles, os pais são de espécies diferentes.
A grande clivagem tem a ver com o respeitinho. Não é o respeito, é o respeitinho. Por mais megera e severa que seja uma mãe, os filhos têm sempre mais respeitinho pelos pais. Com eles, não fazem farinha, não levantam a crista e não medem forças com o à-vontade com que o fazem com as mães. As mães acabam sempre por ceder e por se deixarem levar pelo mítico amor de mãe. Os nossos filhos são os nossos meninos. Coitadinhos. E os nossos meninos fazem o que querem de nós. É assim desde que existem pais e filhos.
Os pais, não. Os pais até podem querer ser iguais às mães mas, por mais que se esforcem, não conseguem. Não conseguem ser suficientemente vulneráveis com os filhos nem suficientemente racionais com as filhas. Desde o dia em que nascem que os filhos, sabendo isso, fazem o jogo diplomático tipo Israel para sobreviverem aos pais. Eles sabem que a mãe fica doente se eles ficam doentes e que o pai fica desnorteado quando o termómetro passa os 37 graus; sabem que a mãe irá sempre chatear com a sopa e que opai irá sempre chatear com o lixo que não foi despejado e com as luzes acesas; sabem que o pai não se zanga com coisas parvas e que a mãe perde a cabeça só por ver umas cuecas no chão; sabem que os pais têm uma tolerância bastante previsível e que a tolerância das mães depende de 351 factores externos e diários; sabem que os pais não gostam de decidir sozinhos e que as mães gostam de decidir por todos. Eles sabem que pai é pai e que mãe é mãe só pelo simples facto de serem de géneros diferentes.
Os pais querem que os filhos sejam homens responsáveis, corajosos, profissionalmente competentes ou jogadores de futebol com sucesso. As mães só querem que os filhos continuem a ser os seus meninos. As mães choram quando os meninos saem de casa, os pais transformam o quarto do filho num escritório sem um pingo de sensibilidade. É verdade que, com as meninas, as coisas não são tão óbvias mas, ainda assim, as diferenças são abissais. As filhas não levam os pais a sério. Elas não lhes reconhecem competência para as educar. Gostam deles, respeitam-nos mas, tal como as mães, não confiam totalmente no seu discernimento no que diz respeito às crianças. Os pais brincam com as filhas, levam-nas às cavalitas, mimam-nas, protegem as suas meninas, mas não percebem as filhas. Para um pai, uma filha é uma equação atómica. É um dos mistérios mais indecifráveis da natureza humana, uma filha. Os pais têm medo de as magoar, que as magoem, de não as entenderem ou de as ofenderem sem querer; por isso, entregam a gestão da filha à mãe. As filhas são coisas de mulheres; já os filhos são coisas dos dois.
Os filhos têm perfeita noção de que os homens são diferentes das mulheres e sabem, desde o dia em que nascem, que os pais vieram de Marte, as mães vieram de Vénus e eles são os únicos não-extraterrestres da casa.

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