A democracia das mentiras

José Luís Nunes Martins, i-online  15 Set 2012
A eloquência política de hoje pode resumir-se de forma simples: No discurso, considerar sempre boas as coisas que agradam ao povo e más as que ele detesta


Vivemos uma crise da Verdade. A
 demagogia é a ferramenta com que se alcança o poder, se justifica o não cumprimento das promessas eleitorais e se alimenta a vida e a credibilidade das oposições.
São poucos os que pensam e vivem longe do artifício oratório que conduz habilmente as massas até aos objetivos de alguns, utilizando os conceitos de bem e de mal, desrespeitando-os completamente (os conceitos e às massas).
Em momentos de crise, a demagogia tem um valor especialmente importante tanto para os que prescrevem políticas impopulares como para os que se lhes opõem. Parece uma guerra entre partes para quem o embaraço da verdade é o ponto em que se encontram em essencial sintonia.
De tempos a tempos, surgem pessoas capazes de explicar com exatidão, sem hipocrisias, o que se passa e o que há a fazer... mas quase ninguém os quer ouvir, afinal o coro dos outros 99% é bem mais potente e de forma muito diplomática logo os apelida de profetas da desgraça, pessimistas sem soluções, e outros nomes de retórica tão requintada que chegam mesmo a parecer verdadeiros!
Num contexto como o nosso, a competência para governar as coisas públicas devia ser um requisito, com evidências sérias e inequívocas, mas afinal as únicas provas a que os candidatos se submetem são: persuadir e convencer os auditórios internos dos partidos e depois o país... alguns ainda passam pelo governo de uma junta de freguesia ou de uma cidade, mas a maior parte, nem por isso...
Qualquer país, com este tipo de política e políticos torna-se preguiçoso, medroso e palrador. Fazendo aumentar exponencialmente as possibilidades de eleger gente ainda pior para os representar e tomar conta do que não é de ninguém porque é de todos.
Quem governa toma medidas mais e menos agradáveis, mas assim que o cenário se perfila mais negro logo surgem narrativas catastrofistas cheias de boas intenções, na base, e muitos inimigos fabricados pela retórica a fim de se garantir a coesão grupal que impede a liberdade de ação... e de pensamento!
Nas oposições, há muitos a diagnosticar problemas e a prognosticar desgraças, nunca ou quase nunca expressam a realidade e linhas de solução sérias... até eu consigo dizer que duplicaria o salário mínimo por forma a estimular a economia através deste sério incentivo ao consumo, ao qual se seguiria um agradável acréscimo da faturação das nossas empresas, gerando-se depois mais emprego com melhores salários, etc. ...enfim, só tínhamos de nos começar a preocupar em cuidar de controlar as fronteiras tal seria o efeito sedutor para cidadãos (e empresas) de outros países. Simples, não?
A eloquência política de hoje pode resumir-se de forma simples: No discurso, considerar sempre boas as coisas que agradam ao povo e más as que ele detesta. Uma espécie de malabarismo de ilusões em que o público deve estar o máximo do tempo entretido com duelos de monólogos, comédias e tragédias.
Uma das provas curiosas da proliferação da mentira é a pouca utilização desse palavra simples nos discursos. São tantos os eufemismos que existem para ela, que  por aí se pode avaliar o respeito mútuo que nutrem uns pelos outros os nossos políticos. Afinal, a base que os suporta é a mesma.
Se a democracia, por essência, pressupõe um elevado grau de educação e respeito por direitos e deveres fundamentais de vivência e convivência, então, ou nos concentrarmos no que é importante e verdadeiro, aprendemos e respeitamos, para que a competência se imponha ou então... continuamos assim. Para pior.
Na política de hoje não é fácil distinguir candidatos, governantes e oposições.
A democracia que temos talvez não passe de um mero embuste...

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