Apenas um papel

DN 20100110

Alberto Gonçalves

O casamento entre pessoas do mesmo sexo é banal no mundo civilizado? É, se entendermos por "mundo civilizado" sete países e um pedacinho dos EUA. O casamento entre pessoas do mesmo sexo veio eliminar uma discriminação brutal? Sim, se admitirmos que uma restrição socialmente imperceptível equivale à escravatura ou às câmaras de gás. O casamento entre pessoas do mesmo sexo é a conquista de um direito fundamental? Claro, se hoje um "direito fundamental" for o "papel" desprezível a que a esquerda sempre reduziu o casamento tradicional. O casamento entre pessoas do mesmo sexo beneficia muitos necessitados? Com certeza: políticos com necessidade de desviar atenções, políticos com necessidade de parecer "modernos", anónimos com necessidade de erguer carreiras à custa de "causas", etc.

Dito isto, não acho que o casamento entre pessoas do mesmo sexo justifique o frenesim indignado de alguns. O medo de que o alargamento a homossexuais anule a alegada relevância do casamento heterossexual deriva do exacto equívoco em que os activistas gay incorrem: o de que o peso simbólico do matrimónio é definido pelo reconhecimento estatal, ou seja, por lei. Obviamente, não é, e não será um "papel" a convencer a sociedade de que um tipo de união é rigorosamente igual ao outro. Embora a formação ideológica da maioria dos integrantes dos movimentos gay os faça sonhar com um Estado absoluto e "padronizador", há quem viva no mundo real e compreenda que os costumes resistem a decretos. Os gays propriamente ditos, por exemplo.

Em Espanha, meia década após a legalização, realizaram-se menos de 20 mil enlaces homossexuais, e com tendência para diminuir a cada ano. Ou uns 99% dos gays locais não entendem que o casamento os proteja da discriminação ou não se sentem discriminados de todo. Por cá, teremos talvez mil ou duas mil bodas por geração, alvo de interesse decrescente dos media e, a prazo, da indiferença geral. Alheias a delírios publicitários, as restantes centenas de milhares de homossexuais prosseguirão as suas vidas. E nós faríamos melhor em prosseguir as nossas.

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