Uma maioria de tontos



INÊS TEOTÓNIO PEREIRA  DN    14.04.2018


É rapaz ou rapariga? Digam lá a sério: há alguém que não pergunte isto quando sabe de uma criança que vai nascer? Também queremos saber se está tudo a correr bem, se é grande e sobre a azia (não há nada mais chato do que a azia e os enjoos na gravidez). Mas queremos sempre imaginar, e para imaginar temos de saber se é rapaz ou rapariga. E depois o nome. Não interessa nada, o que interessa é a saúde, mas queremos imaginar. Sinceramente, é ou não é? Dizem-me que há miúdos que sofrem por serem rapazes e sentirem-se raparigas, ou vice-versa. Acredito. Se soubessem a quantidade de coisas de que sofrem os miúdos hoje, nós pais vivemos apavorados, pelo menos, com as depressões dos miúdos, a falta de autoestima, o bullying. Mas desta infelicidade em particular não me tinha lembrado. E lembrei-me das marias-rapazes, nas meninas que querem ser rapazes e jogam à bola e andam à luta. Afinal é assunto sério ser maria-rapaz. Que vai ser delas? Esperamos em suspenso que cheguem aos 16 para mudarem de nome? E como é que sabemos se é ou não é assunto sério? Se jogas à bola serás Mário aos 16, se não fores, devias, e se não quiseres é porque a sociedade é castradora, os teus pais conservadores e a tua vida uma prisão. E a maria-rapaz fica sem saber se é a sério ou se é só isso. Diziam-me no outro dia: "Olha, Deus queira que não te aconteça, que não tenhas um filho assim, nessa infelicidade." Também acho, Deus queira. E pensei na compaixão e no amor a dobrar que por ele iria querer ter. Não há lei que nos resolvesse a angústia. Depois pensei nisto, por esta ordem, primeiro: não há mais nada em que pensar? São assim tantos os casos? É mesmo uma questão de liberdade? E se estiverem errados, se a lei for errada, quem vai apanhar os cacos? Não há lados aqui, só um, que é o lado de quem muda o nome e depois o sexo e fica assim, de um género diferente. E lavamos as nossas mãos (lavar as mãos devia ser proibido). Porque numa sexta-feira 13, uns deputados que não ficarão para a história (nunca ficam, os deputados) fizeram história e abriram uma fenda. "A tua filha joga à bola? E ele, dança? Eu trocava os nomes... Vê lá se a miúda não quer mudar de nome. Digo eu, sei lá. Mas a lei já o permite. Eles lá sabem, os que fazem as leis." É um erro, o maior erro da nossa democracia é pensar que eles lá sabem. Se é deputado, se chegou lá, deve saber. Pois não sabem. E depois dá nisto, se eles acham que a Maria de 16 anos pode ser Manel, eles lá sabem. Uma maioria de tontos lá sabe.




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