Requiem pela Língua Portuguesa

Público, 2011-02-19
José Ribeiro e Castro
Marquem no calendário: semana negra para a Lusofonia!
Avançou, em Bruxelas e Estrasburgo, a manobra da cooperação reforçada nas patentes, que privilegia Inglês, Francês e Alemão e fere interesses específicos da economia portuguesa. Com o furtivo agenciamento do Governo Sócrates, que fugiu à Assembleia da República, e a conivência do PS e PSD (à excepção de Graça Carvalho e Carlos Coelho), foram demolidos interesses fundamentais e direitos da política linguística portuguesa. Nota alta só para CDS e PCP. Mas ficou tudo muito difícil.
Tenhamos presentes dez linhas elementares:
1.º       Portugal não tem qualquer interesse e deve opor-se firmemente, na Europa, a regimes linguísticos que excluam e discriminem a língua portuguesa.
2.º       Portugal não guarda só o interesse de uma língua igual à doutro Estado-membro. Portugal defende o interesse especial de uma língua europeia global, falada internacionalmente, o que apenas sucede com algumas línguas europeias de que o português é a terceira – o Português, língua da Europa.
3.º       Tudo o que diminua o estatuto europeu da nossa língua enfraquece-a como língua global e fragiliza o seu peso e percepção, na Europa e no mundo. Língua europeia global que se deixe desvalorizar na Europa corre o risco de também perder préstimo no resto do mundo.
4.º       Portugal pode talvez transigir, pontualmente, nalguma área específica, em aceitar uma língua veicular contemporânea – o Inglês – que a todos uniformemente se aplique. Mas os interesses da língua portuguesa são irremediavelmente afectados, se Portugal for consentindo na instalação na Europa de uma “1ª divisão de línguas” de que o Português esteja excluído. Não pode haver uma “1ª divisão de línguas” europeias sem o Português, a terceira língua europeia global.
5.º       Portugal deve opor-se tenazmente à formação, dentro da U.E., de espaços linguísticos regionais, ancorados na selecção de algumas línguas com discriminação do Português.
6.º       O peso e a projecção internacionais do Português, à escala global, são pares do Espanhol e do Francês. Portugal não pode consentir na U.E. a sedimentação de um estatuto para a língua portuguesa que não seja paritário com as línguas espanhola e francesa.
7.º       No espaço da Lusofonia, Portugal é aquele país lusófono que tem a responsabilidade de, na União Europeia, defender e afirmar o estatuto da língua comum. Qualquer fracasso consentido por Portugal na Europa é dano infligido a toda a Lusofonia.
8.º       No domínio da propriedade industrial, apesar da aparente aridez burocrática, a tradução para Português das patentes ocupa lugar de relevo na modernização e actualidade da Língua Portuguesa como língua de Ciência e Tecnologia. Permite ao Português acompanhar a inovação científica e tecnológica, fortalecendo-se como língua viva e completa. A exclusão do Português no regime europeu das patentes, incluindo para vigorarem em Portugal, golpeia um dos veículos mais acessíveis para rodagem, enriquecimento e actualização da nossa língua neste domínios técnicos. Este dano não afecta apenas Portugal, mas fere a Lusofonia na região mundial de mais elevado dinamismo económico e de inovação: o continente europeu.
9.º       A cedência a impérios linguísticos europeus no regime de patentes, desgradua o Português de modo sintomático e baixa-o de divisão no quadro da concorrência linguística, com muito más consequências em extensão imprevisível. Essa cedência representa para a política linguística nacional uma deplorável abdicação crucial.
10.º   Quem se rende à ideia parola e menor de que “moderno” e “cosmopolita” são o Inglês, o Francês ou (pasme-se!) o Alemão, não entende de todo o estatuto internacional do Português. E despreza que o cosmopolitismo moderno é também em Português.
Concorrência, competitividade e inovação jogam-se também aqui. E ganham-se ou… perde-se. Não foi o último acto. Mas foi uma machadada brutal. Uma semana negra. De traição e de abandono.

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