VOTAR EM CONSCIÊNCIA

Pe. Gonçalo Portocarrero de Almada
A Voz da Verdade, 2011-01-16
Os católicos têm a mais absoluta liberdade de voto, pois só em circunstâncias de excepcional gravidade a Igreja, através da voz autorizada da sua hierarquia, pode exigir aos seus fiéis que exerçam esse direito de uma forma concreta. Mas não sendo este o caso, na medida em que o episcopado não se pronunciou nesse sentido, cada cidadão cristão está chamado a decidir, em consciência, a modalidade da sua participação no próximo acto eleitoral.
Que a Igreja respeite a liberdade política dos seus crentes não quer dizer que esta decisão não tenha relevância moral, nem que seja indiferente votar ou não e, votando, apoiar qualquer candidato ou partido. Muito pelo contrário. Os cristãos também têm toda a liberdade matrimonial e profissional, mas a escolha do cônjuge ou do ofício não são indiferentes, como também a prática laboral ou a vivência conjugal se devem pautar por exigências éticas. E casos haverá em que determinadas situações – como é o caso do aborto, por exemplo – ainda que legais, não são admissíveis para um católico, porque incompatíveis com o seu padrão moral.
No panorama eleitoral português há várias opções, mas não se vislumbra nenhuma que corresponda aos principais valores cristãos, como são, entre outros, a vida, que a Igreja defende desde a concepção e até à morte natural; o casamento, entendido como a união indissolúvel entre um homem e uma mulher; a família e a educação. De facto, a maioria das propostas eleitorais são assumidamente favoráveis ao aborto, à eutanásia, ao divórcio, ao casamento entre pessoas do mesmo sexo e são também contrárias à liberdade de educação. Por outro lado, a candidatura ideologicamente mais próxima dos valores humanistas está, à partida, descredibilizada junto do eleitorado cristão, pelo seu reiterado apoio às leis anti-vida, anti-casamento e anti-família.
De acordo com o princípio evangélico – dê-se a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus – não seria desejável a existência de um partido ou candidato oficialmente católico, porque um tal absurdo seria uma expressão do mais anacrónico clericalismo que, para além de coarctar a liberdade política dos católicos, atentaria contra a natureza sobrenatural da Igreja que, como é sabido, não tem ambições temporais. Mas seria de esperar que, num país de tão arreigadas tradições cristãs, se apresentassem vários candidatos que, pela sua ideologia humanista e a sua consequente prática política, pudessem constituir uma opção legítima para o eleitorado que se identifica com os princípios da Doutrina Social Cristã e procura quem possa viabilizar as suas aspirações de justiça e de solidariedade social.
Não sendo este o caso, os cristãos coerentes ver-se-ão assim na contingência de se absterem; de votarem em branco; de votarem contra a sua consciência, se o fizerem em forças políticas assumidamente anti-cristãs; ou à margem da sua consciência, se votarem em quem, mesmo professando, em teoria, os princípios cristãos, na prática favoreceu uma política contrária aos princípios éticos e ao bem comum, nomeadamente viabilizando o aborto, o divórcio e o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Se o voto contra a consciência é sempre reprovável, é eticamente aceitável, num contexto de mal menor, votar no menos mau dos candidatos, embora seja um voto à margem da consciência.
Votar em consciência é um imperativo ético para todos os cidadãos, mormente para os cristãos. Mas, que fazer quando a consciência – por falta de ciência ou por falta de coerência – não se apresenta às eleições?!
P. Gonçalo Portocarrero de Almada  

Comentários

António Camacho disse…
Aplaudo!
De facto, temos assistido à coerção explícita dos cidadãos para que não deixem de votar, para que não votem em branco, para que não anulem o seu voto! O que, a meu ver,é chantagem sobre os cidadãos, pois que durante mandatos presidenciais ou detenção do poder legislativo pelos deputados, os cidadãos são completamente ignorados, ou, quando exprimem opinião diversa, são apelidados pelos mais diferentes e vis ápodos pelo simples facto de expressarem os seus valores, ou tentarem expressá-los e tentarem ser ouvidos! Viu-se com a extensão do instituto do casamento ao emparelhamento homossexual - nem direito houve ao referendo, liminarmente rejeitada a petição (que contava com muitas dezenas de milhar mais de subscritores do que o mínimo para subir ao Plenário da AR; e com o parecer da Comissão Parlamentar para que se propusesse o referendo e contendo já as perguntas a referendar!)! Esta mesma coerção atingiu o PR, como se viu na sua comunicação ao País sobre a promulgação da Lei, pois aduzida toda (?) a argumentação para rejeitar a Lei...afinal informa que a promulga!
Estamos a viver com políticos "esquizofrénicos"! A Nação para um lado e eles (suposta deputação da Nação) para outro, olhando para o Povo como um fardo, um tropeço e não o fundamento do seu múnus, Povo soberano na Constituição, mas tratado como vil criado pelos "senhoritos da política"!
Que cada um assuma o que tem de assumir, e se entender que deve abster-se, votar em branco ou expressar no voto (anulando-o) a sua indignação, que o faça, pois isso é acto conforme à prática democrática, sem medos nem sustos de papões! É altura de começar a mostrar que já chega de "pagode"!

António Camacho

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