A farsa do "programa"

Vasco Pulido Valente

Público, 20090829

Em nenhuma outra eleição se discutiu tanto e tão ardentemente o programa dos partidos (já se verá porquê). Coisa estranha, sendo público e notório que nunca ninguém leu e, sobretudo, nunca ninguém votou por causa do programa de um partido. A pergunta a que os portugueses vão responder a 27 de Setembro é esta: "Sócrates governou quatro anos. Gostou do resultado? Quer continuar? Como está a sua vida? Pior, melhor, na mesma?" Cada um sabe de si e cada um irá responder conforme o que lhe aconteceu desde 2005 e conforme o que espera até 2013. Houve tempo para Sócrates mostrar quem era - e o que era - e a opinião geral do país com certeza que não muda neste último mês com propaganda espertalhona ou pequenas manobras de pequena política.
A questão do programa foi levantada pelo PS, e assoprada pelos media, para "provar" a vacuidade de Manuela Ferreira Leite. Sócrates publicou um programa com 120 páginas de promessas (não custa nada prometer) e pretende que Manuela o leve a sério e discuta ponto a ponto as fantasias dele. Ora o que interessa, num programa eleitoral (e não de governo), é indicar uma direcção e uma doutrina: e para isso bastam (e sobram) as 40 páginas do programa do PSD. 

No que disse antes, como no que disse agora, Ferreira Leite estabeleceu uma diferença entre ela e o eng. Sócrates. Não se confundem. Nem no estilo, nem no carácter, nem na visão da sociedade, nem no que se propõem fazer. Quando escolherem, os portugueses não escolherão na dúvida e na ambiguidade. O caso é claro.
O que não impediu alguns peritos, perante o programa eleitoral, repito, eleitoral do PSD, de se afligir em público com a falta de explicações suficientes sobre os meios que Manuela planeia usar. Exigem o "como", em pormenor, com financiamento e calendário e, se calhar, com um projecto de decreto-lei. O que é um programa eleitoral ignoram. Que existe entre a intenção e o fim, um Parlamento, um Presidente, um país e o mundo não lhes passa pela cabeça. Que qualquer acção se deve em princípio negociar com as partes que ela directa ou indirectamente afecta não os preocupa. O que eles pedem é uma ficção, em 100 volumes, sobre o presuntivo governo Ferreira Leite. Ou, no mínimo, as 120 páginas de Sócrates. Mas precisamente Ferreira Leite deixou a ficção ao PS.

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