Intolerâncias

Correio da manhã, 2010.04.20
Constança Cunha e Sá

Um Estado laico não é um Estado anti-religioso, incapaz de compreender a dimensão pública da fé.
Como seria de esperar, a visita do Papa a Portugal já deu origem a uma pequena e comovente polémica sobre a tolerância de ponto decretada pelo Governo. Os fanáticos do costume decretaram que pretendiam trabalhar nesses três dias a bem da separação do Estado e da Igreja e – pasme-se – em prol da produtividade nacional que, na sua douta opinião, não pode ser abalada pela visita de um "líder religioso qualquer" que decida deslocar-se ao nosso país. Até a CIP e as centrais sindicais, esses pilares da nossa economia, se pronunciaram patrioticamente contra a decisão tomada pelo Governo, alertando para a crise em que vivemos e para a necessidade dos funcionários públicos contribuírem, com o seu trabalho, para o aumento da produtividade e para o desenvolvimento da pátria.
É evidente que este reconhecimento súbito do estado em que nos encontramos não deixa de ser salutar, sendo de esperar, nomeadamente por parte dos sindicatos, exemplos futuros de responsabilidade e compreensão pela situação em que se encontram as finanças públicas e a economia portuguesa. Custa-me a crer que sindicalistas, tão atentos aos custos da visita do Papa, se entretenham depois a promover greves que, para além de não levarem em linha de conta a crise em que nos encontramos, não contribuem certamente para o dito aumento da produtividade. Tudo isto seria um pouco ridículo – e é – se por trás destes nobres objectivos não se escondesse o velho preconceito contra a Igreja e o zelo anticlerical de meia dúzia de figuras públicas, sempre em busca de crucifixos nas escolas e de outros sinais religiosos no espaço público. Ao contrário do que tem sido dito, o que está em causa não é a neutralidade do Estado em relação às diversas religiões, mas a incapacidade de perceber que, num país de tradição católica, o Papa não é um "líder religioso qualquer", como tem sido amplamente referido.
Pretender equipar a visita de Bento XVI à visita de qualquer outro líder religioso (hindu ou muçulmano, como já vi defender) é não compreender a realidade portuguesa e desconhecer totalmente a sua história. Há uma ligação entre o País (e o ocidente, em geral) e a Igreja que um Estado laico deve saber reconhecer. Um Estado laico não é sinónimo de um Estado anti-religioso, incapaz de compreender a dimensão pública da fé. E a crer nalgumas coisas que por aí têm sido escritas, dá ideia de que o Papa, não lhe sendo retirado o direito de viajar pelo mundo, devia ter, pelo menos, a decência de o fazer clandestinamente. De forma a não importunar ninguém. Porque o problema é que este Papa, em particular, importuna.


Constança Cunha e Sá, Jornalista

Comentários

Estou plenamente de acordo com o que Constança Cunha e Sá escreveu.
Mas quero acrescentar mais um tópico para meditar, será que a vinda do Papa não vai abalar as consciênçias dos mais anti-clericais e ateus deste país?
Se não houvesse tolerançia de ponto seria o caos em Lisboa, bom sinal, já o Presidente da Câmara concordou ., com a tolerância. O problema está que O Papa Bento XVI vem questionar-nos sobre valores e principios de vida que devem reger toda a nossa sociedade.
Isto é que perturba, os que estão contra, tipo sindicatos e outros,.
Vamosd ter 363 dias para trabalhar,não são 3 dias que vão dar a Portugal um deficit abaixo doa 3% nem baixar o desemprego
Valha-nos Deus Nosso Senhor....para tanta.......

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