Empresa e família

António Pinto Leite
Expresso, 2004.04.26

«A desagregação da família, fenómeno historicamente recente, contém um factor multiplicador tremendo.»

UMA DAS preocupações centrais de um gestor ou de um empresário com recta consciência é a de possibilitar a todos os colaboradores um equilíbrio entre a vida profissional e a vida familiar.
Foi neste quadro de preocupações que a ACEGE (Associação Cristã de Empresários e Gestores) encomendou à Universidade Católica um estudo sobre a Família, estudo dirigido, com a qualidade usual, por João Carlos Espada e agora publicado.
Se os responsáveis empresariais cristãos estavam já motivados para a necessidade de protecção dos equilíbrios de vida dos seus colaboradores, ainda mais motivados deverão ficar.
A primeira conclusão do estudo é a de que as tendências verificadas em Portugal estão alinhadas pelas tendências europeia e norte-americana. Portugal não é uma ilha.
O estudo analisa a realidade norte-americana e apresenta indicadores que merecem reflexão.
Desde logo, a emergência absolutamente maioritária de tipologias familiares alternativas, de tal modo que os lares de «casais casados com filhos próprios» é apenas de 24%. Isto é, só um em cada quatro lares.
Depois, a redução drástica de número de pessoas por lar. Em 2000, havia 2,61 pessoas por lar, ou seja, os EUA vivem em perfeito «tête-à-tête» (em Portugal, em 2001, já tínhamos baixado a linha das 3 pessoas por lar).
Também a taxa de divorcialidade aumentou exponencialmente, sendo que só 1 em cada 3 crianças vive com os dois progenitores e a probabilidade de uma criança americana testemunhar o divórcio dos pais é hoje de 1 para 2.
Em Portugal, diga-se, em 1970 havia 163 casamentos para 1 divórcio e, em 2000, havia 3 casamentos para 1 divórcio.
O estudo é francamente elucidativo sobre as consequências desta situação no rendimento das famílias e, sobretudo, nas crianças.
Não se pode analisar este fenómeno apenas a partir da experiência pessoal de cada um. Filhos de pais divorciados ou de mães solteiras podem, como é óbvio, ter um comportamento e uma capacidade de realização, de si e dos outros, superior a filhos de pais casados.
Importante é ver o que, em regra, sucede. Trata-se de relações de probabilidade e não de causalidade.
As crianças americanas que viveram em famílias monoparentais têm uma probabilidade superior em 92% de se divorciarem, três vezes superior de ter filhos fora do casamento, duas vezes e meia superior de virem a ser presas e vinte vezes superior de virem a sofrer maus tratos, nomeadamente por negligência.
A principal conclusão a retirar é a de que a desagregação da família, fenómeno historicamente recente, contém um factor multiplicador tremendo.
O estudo traz ainda uma perplexidade e uma esperança.
Perplexidade, porque uma das investigações realizadas conclui que a probabilidade de um casamento vir a terminar em divórcio é o dobro nos casos em que os cônjuges coabitaram antes do casamento.
Esperança, porque os inquéritos demonstram que a realidade social não teve directamente impacto nos valores culturais dos americanos.
Para 93% dos inquiridos «terem um casamento feliz» continua a ser o objectivo mais importante, sendo que 75% acham que é um «compromisso para a vida» (curioso que 81% dos divorciados acham o mesmo).
Voltando aos responsáveis empresariais, é de notar que 80% das mães entre os 18 e os 29 anos preferiam ficar em casa a ter um emprego a tempo inteiro e 70% dos pais entre os 20 e os 40 anos prescindiriam de parte do salário para ficar com os filhos.
A esperança está aqui, no clamor do coração humano, a que é urgente corresponder.

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