Um sistema que serve os alunos (e não os professores)

Alexandre Homem Cristo, ionline 1 Abr 2013
Num país onde as boas reformas são as que não saem do papel, qualquer decisão ministerial será sempre acusada de ameaçar os alicerces constitucionais
Anteciparam cenários. Atiraram com números para os jornais. Prometeram o horror. Foi assim que se desenrolou este início do ano de 2013 na educação, pela mão dos habituais alarmistas. Quiseram gerir a expectativa do que no sector seria feito no âmbito da chamada refundação do Estado. Só que nada do que imaginaram se concretizou. Nem o despedimento dos 50 mil funcionários, nem o alargamento do horário de trabalho dos professores. Não que isso tivesse comovido a Fenprof, recordista nacional de profecias falhadas. Quando Nuno Crato apresentou algo bem diferente (mobilidade especial e reorganização das Zonas de Quadro Pedagógico - QZP), a ameaça de uma greve de professores pairou de imediato. Castigar os alunos sempre foi uma poderosa arma negocial. A esquerda, em geral, alinhou nos protestos. E a polémica instalou-se, com manchete em vários jornais. Mas, apesar do ruído, a dúvida veio à superfície: afinal, por que razão são contra a mobilidade especial? Nenhum dos indignados soube explicar.
A mobilidade especial existe há vários anos na função pública. E durante todos esses anos, a Educação ficou de fora. Um professor do quadro recebia o seu salário, tivesse aulas para dar ou não. Não podia ser dispensado, mesmo que o sistema educativo, na prática, tivesse prescindido dele. Ora, o que distingue professores de restantes funcionários públicos que justifique, hoje, essa excepção? Não se sabe. E ninguém, entre os indignados, nos diz. Naturalmente, compreende-se que esses professores sem alunos não fiquem agradados com a novidade do ministério. Mas isso não responde à questão que importa: porquê manter a excepção dos professores quanto à mobilidade especial?
A excepção, de facto, não se justifica. Por duas razões. A primeira é que ao Estado compete a boa gestão dos recursos, humanos e financeiros, e não há razão válida para manter nos quadros um funcionário sem funções. Seja professor ou não. O dinheiro dos contribuintes, apesar das tentativas de quem governa e governou, não estica. E o que se gasta num funcionário sem funções não será investido onde é preciso e onde faz falta. Esta é uma premissa válida por si só, mas ainda mais relevante no contexto em que vivemos. Num cenário de cortes na despesa pública, não se compreende que o Estado mantenha, na sua folha de pagamentos, professores que não exercem funções lectivas, enquanto corta nas remunerações dos que as exercem.
A segunda razão é que a implementação da mobilidade especial não produz efeitos negativos no sistema. É, portanto, o tipo de reforma política que os portugueses exigiram a este governo, quando o elegeram. Isto porque um professor que não tem aulas para dar, é um professor cuja saída do sistema educativo não prejudicará qualquer aluno. E se isto não é evidente para todos, é apenas porque durante demasiado tempo o país se esqueceu que o sistema educativo existe para servir os alunos, e não os professores. Há que parar com o fingimento (ideológico e corporativo) de que o número de professores no sistema educativo não tem relação directa com o número de alunos matriculados.
Em Portugal, a mudança é, por definição, polémica. Num país onde as boas reformas são as que não saem do papel, qualquer decisão ministerial será sempre acusada de ameaçar os alicerces constitucionais do Estado Social. Esta medida do ministério de Nuno Crato não foge à regra. E ainda bem. A mudança que precisamos também passa por quebrar os consensos que nos conduziram à ruína. Sobretudo na educação.

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