A guerra de consensos

Alexandre Homem Cristo, i-online 29 Abr 2013
Um consenso alargado não apaga a identidade dos partidos e não impossibilita o estabelecimento de uma alternativa política
Nas décadas de 1950 e 1960, o Reino Unido foi governado sob aquilo a que se chamou de "política do consenso" ou "contrato contínuo". Independentemente de quem estivesse no poder (Attlee, Macmillan, Wilson), a tomada de decisão era antecedida de uma consulta alargada aos restantes actores políticos, na busca de um entendimento sobre qual deveria ser a acção governativa num determinado sector. Viviam-se tempos excepcionais. No rescaldo da II Guerra Mundial, era fundamental virar a página. Olhando para trás, são muitos os que acreditam que, nos 20 anos que se seguiram ao fim da II Guerra Mundial, essa opção pelo consenso surtiu efeito, evitando crises políticas e consolidando os pilares para o desenvolvimento económico britânico. E, sublinhe-se, nunca este processo resultou no apagar das características que diferenciavam os partidos. Nem nunca se alegou que contribuiria para acabar com as alternativas políticas.
É oportuno relembrar este exemplo histórico para fazer três breves notas. A primeira é que é possível governar através de consensos alargados, mesmo em contextos difíceis. A segunda é que, no Reino Unido, isso aconteceu porque houve uma tomada de consciência de que o consenso era necessário para a melhor defesa do interesse nacional. E a terceira é que a existência de um consenso alargado não apaga a identidade dos partidos políticos, não impede que estes tenham visões políticas diferentes e não impossibilita o estabelecimento de uma alternativa política.
Estas três notas são particularmente importantes no contexto em que o nosso país vive actualmente. Todos falam e discutem a necessidade de consenso político, mas parece que ninguém concorda sobre o que realmente significa esse consenso e quais as implicações (para o país) caso ele não seja alcançado. Sem surpresa, o debate é intenso, mas infrutífero.
António José Seguro recebeu, por parte do governo, uma proposta de diálogo que não soube enquadrar. Seriam verdadeiras as intenções do governo? Ao PS seria pedido que assinasse de cruz os resultados das negociações prévias entre o governo e as entidades internacionais, ou teria realmente um papel activo? E, eleitoralmente, quais as consequências de aceitar sentar-se à mesa com o governo? Com todas estas dúvidas, António José Seguro lidou mal com a incerteza e, claro, com as pressões internas a que tem sido sujeito. Respondeu da pior forma: na sexta-feira à noite, em pleno Congresso do PS, garantiu a impossibilidade de um entendimento.
O erro é dramático. Em primeiro, porque o PS passou meses a queixar-se que o governo não ouvia os seus avisos e, agora, no momento em que o PS é convidado a fazer parte da decisão, afirma que já não quer ser ouvido. Em segundo, porque Seguro rejeitou o diálogo considerando que o PS, querendo ser alternativa política, não pode fazer parte de um consenso alargado. Ora, não existe incompatibilidade - tal como uma coligação não implica uma fusão, também não o implica um consenso alargado. Por fim, o erro é dramático porque, no Congresso dos socialistas, ficou claro que, para o PS, o interesse nacional não prevalece sobre os do partido.
Enquanto o país se entretém a discutir Cavaco Silva, tudo indica que, esta semana, o tal consenso ficou mais longe de acontecer. Ao "que se lixem as eleições" de Passos, Seguro vem dar vivas a eleições, que é como quem diz "que se lixe o país". E, sendo assim, vai mesmo lixar-se.

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