Padre português é o novo reitor da Universidade Pontifícia Gregoriana de Roma
Rosário Lira - RTP 25 Ago, 2016, 12:29
É português e vai ser o novo reitor da Universidade Pontifícia Gregoriana de Roma. Um desafio e uma responsabilidade. Vê a universidade como um grande laboratório da Igreja com alunos de 130 países. Quer continuar a preparar padres para o mundo contemporâneo. Admite que recebe gente nova muito conservadora mas até estes acredita estão dispostos a refletir.
Foi uma escolha do Papa Francisco por proposta do Padre Geral. O padre Nuno da Silva Gonçalves assume a partir do dia 1 de setembro a liderança de uma das mais prestigiadas universidades de teologia do mundo, a Universidade Pontifícia Gregoriana de Roma.
A universidade está confiada à Companhia de Jesus e o reitor tem de ser um jesuíta. Desta feita será um jesuíta português.
Nuno Gonçalves encara esta nova etapa da sua vida como "uma grande responsabilidade e um grande desafio".
À responsabilidade junta a confiança de alguém que confia na sua equipa. "Uma equipa muito boa, muito competente e muito empenhada, tanto professores como funcionários administrativos, portanto sei que posso contar com uma equipa muito capaz com a qual terei muito gosto em trabalhar", refere.
Fundada em 1551 por Santo Inácio de Loyola, a universidade (à data e até 1873 Colégio Romano) tem 2.700 alunos, de 130 países. Portugueses são 20. Um número que se tem mantido constante apesar da crise de vocações. Integra seis faculdades (Teologia, Filosofia, História e Bens Culturais da Igreja, Direito Canónico, Ciências Sociais e Missiologia) e 2 institutos (Psicologia e Espiritualidade).
A propina ronda os dois mil euros/ano. O que custa mais é viver em Roma.
A universidade na sua oferta faz, segundo Nuno Gonçalves, uma combinação entre as ciências eclesiásticas e aquelas que "são importantes para a vida de alguém que irá ter uma responsabilidade na Igreja, no mundo".
A qualidade, segundo Nuno Gonçalves, deve-se a "uma escolha criteriosa dos professores e simultaneamente a um investimento que é feito na formação dos docentes, dando-lhes tempo para a investigação e para a publicação das suas investigações".
Por outro lado, adianta, o ensino é muito baseado na relação que se cria entre o professor e o acompanhamento dos estudantes. "Os alunos não são números, são pessoas que nos estão confiadas para nós ajudarmos a crescer e para guiarmos nesse crescimento". Considera por isso que "esta relação pessoal entre professor e estudante é uma característica fundamental do nosso modo de ensinar".
Centro para Proteção das Crianças continua
Nuno Gonçalves não pretende avançar com grandes mudanças e quer dar continuidade ao trabalho desenvolvido pelo atual reitor. O novo reitor considera que recebe de François-Xavier Dumortier, "uma herança muito boa". Destaca nomeadamente a criação de novos centros de investigação e formação e sobretudo a criação ao longo de seis anos de uma verdadeira unidade académica "baseada no empenho de cada um e na qualidade das relações humanas".
Por isso, Nuno Gonçalves fala numa etapa de consolidação.
Não pretende criar novas unidades académicas porque considera que a este nível houve um progresso mas avaliar as que existem e verificar se correspondem ainda às necessidades da Igreja.
Destaca em particular a fundação do Centre for Child Protection, uma resposta da universidade em ligação com a Santa Sé "para formar pessoas que possam trabalhar no campo da prevenção dos abusos sexuais". Os alunos são preparados para trabalhar com abusadores e crianças vítimas de abusos sexuais. Esta unidade, adianta, é para manter e desenvolver porque "corresponde a uma necessidade da igreja, uma necessidade do nosso tempo e um contributo muito importante que creio eu, a universidade esta a dar à vida da Igreja neste momento".
Acredita que a Igreja não estava preparada para responder aos casos de pedofilia mas também considera que a "Igreja pode dizer que neste momento está na linha da frente na formação e na prevenção". Reconhece que "ainda não está tudo feito mas impulso dos últimos papas, a Igreja está na linha da frente da prevenção e a universidade está a dar o seu contributo".
Laboratório da Igreja
Com estudantes de 130 países a universidade acaba por ser um "grande laboratório da Igreja", refere o novo reitor da Universidade Pontifícia Gregoriana.
Para Nuno Gonçalves, a grande riqueza de estudar em Roma reside nesta junção, num mesmo espaço, de estudantes que vêm de tradições e realidades eclesiásticas muito diferentes.
A universidade incentiva-os a não se fecharem nos seus grupos nacionais nem nos seus grupos linguísticos e a aprender uns com os outros. Até porque, lembra Nuno Gonçalves, "a Igreja do futuro será cada vez mais internacional e a sociedade do futuro será cada vez mais internacional com os fluxos migratórios".
Por isso considera que o facto de os estudantes terem a oportunidade de "conviver lado a lado com colegas que vêm de todo o mundo é um aspeto particularmente enriquecedor" e que quer continuar a incentivar.
A todos, apesar da sua diversidade, pretende dar por igual uma "formação sólida baseada na tradição da igreja. Uma tradição que se confronta com o mundo contemporâneo e que procura ter abertura mental para dialogar com ele".
Geração mais conservadora
Admite no entanto que se nota nos estudantes mais jovens uma tendência mais conservadora. Mas também estes, adianta, "estão abertos a pensar e a aprofundar" e, no diálogo com os professores e os colegas, tem uma oportunidade para "abrir horizontes".
Esta tendência conservadora nota-se mais nos estudantes provenientes da Europa e da América do Norte. O novo reitor associa esta situação à crise de valores do mundo ocidental e considera que "quem quer ter uma vida eclesiástica e comprometida na Igreja sente mais a necessidade de se agarrar a valores seguros".
A esta situação também não é alheia a mudança de sensibilidade introduzida por cada Papa.
A universidade não muda a sua forma de estar por mudar o Papa. Seria impensável em cinco séculos de existência que isso acontecesse, mas adapta-se e procura ser um veículo do pensamento do Papa, nomeadamente através do estudo dos documentos publicados.
Nuno Gonçalves não nega que a formação levada a efeito pelos jesuítas, como se diz, é diferente e aposta mais na qualidade do que na quantidade.
No entanto, lembra que os estudantes que chegam a Roma são estudantes "muito escolhidos, os melhores das dioceses e dos institutos religiosos".
Mas isso não significa que não haja grande heterogeneidade entre eles devido às diferentes formações. E, por isso, o trabalho da universidade mantendo a tradição da pedagogia da Companhia de Jesus é levar que que cada um atinja o seu máximo, criando condições para que isso aconteça mas sempre sabendo que o máximo de um é diferente do máximo de outro.
Nuno Gonçalves garante apenas que os estudantes da Universidade Pontifícia Gregoriana saem da universidade preparados para o mundo de hoje e não estão fora da realidade. "É um estudo feito para dar alguma coisa aos outros e não apenas uma visão interna a Igreja".
Ao abraçar as novas funções, o maior desejo do novo reitor é que haja "harmonia na comunidade académica e que haja valores comuns, capacidade e desejo de trabalhar em conjunto em benefício do corpo discente e dos alunos que são confiados para que possam ser formados o melhor possível".
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