A ética republicana
Nuno Melo
Jornal de Notícias | 11 Agosto 2016
Não sei, nunca soube, o que é isso da ética republicana. Os socialistas invocam-na amiúde, quando querem chamar a si virtudes públicas, que raramente concretizam no exemplo. Inspiram-se em muito da outra República, a primeira. E encontram nos seus líderes, de Afonso Costa a Brito Camacho, referências que celebram. Explica muita coisa.
O regime nascido em 1910 teve tudo de República e pouco de ética. O regicídio foi concretizado em 1908 a partir dos movimentos republicanos, de mão dada com a Carbonária. Não falta quem ainda hoje homenageie à esquerda Manuel Buíça e Alfredo Costa, obreiros do assassinato infame do rei D. Carlos e do príncipe D. Luís Filipe. A estratégia pensada para implantação da Primeira República marcou o essencial do jogo político que se lhe seguiu e lhe traçou o destino até ao estertor. O poder foi sempre o fim em si mesmo. Valeu tudo para o alcançar ou manter. Não por acaso, ficou célebre a frase de Brito Camacho relativamente ao Governo de João Franco, um dos últimos da monarquia:
- "Havemos de obrigá-lo a transigências que rebaixam ou às violências que comprometem".
Os tempos de hoje adoçaram a Esquerda no estilo. Mesmo assim, o relativismo ético está todo lá.
O Estado e a Galp mantêm um conflito que se arrasta nos tribunais. Em causa está a recusa da empresa pagar uma taxa extraordinária que já ascende a 100 milhões de euros relativamente aos anos 2014 e 2015, a que se deverão somar 80 milhões de euros em 2016. Sabendo disso e apesar de tutelar o setor, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Fernando Rocha Andrade, aceitou viajar e assistir a jogos da Seleção Portuguesa, durante o Campeonato Europeu de Futebol, a expensas da Galp. E o Governo precisou de um mês para perceber o que estava em causa.
Fernando Rocha Andrade quis ter visibilidade política sob pretexto da Seleção Portuguesa de Futebol, à conta da Galp. Fazendo-o, abdicou aos olhos do país de condições básicas, mas fundamentais, de isenção e imparcialidade. Sendo que no controlo de danos, tudo o que o Governo revelou depois foi bem pior.
Augusto Santos Silva deu o caso por "encerrado" chamando a si as competências do secretário de Estado, que por seu lado, reembolsando a Galp dos benefícios que recebeu, julgou resolvido o problema. Tudo errado.
O reembolso confessou o pecado original. E se dúvidas houvesse, avocando as funções do secretário de Estado, o ministro Santos Silva comprovou-o. Pragmaticamente, significou que o primeiro-ministro deixou de confiar no secretário de Estado, mas manteve-o no cargo.
A ética republicana tem destas coisas.
Comentários