Descansar: ascese e caridade
Pe. DUARTE DA CUNHA VOZ DA VERDADE 11.12.216
Quando encontramos um amigo e lhe perguntamos como está, é comum ouvirmos, para lá do habitual “bem muito obrigado”, o outro dizer que está “cansado”. E de facto a vida moderna é cansativa. Há sempre mil coisas a fazer; o trabalho, a vida familiar, os amigos e a família alargada exigem todos grande dedicação; a distância entre o trabalho e a casa para tanta gente obriga a viagens cansativas em transportes públicos cheios ou no pára e arranca do trânsito.
Quando encontramos um amigo e lhe perguntamos como está, é comum ouvirmos, para lá do habitual “bem muito obrigado”, o outro dizer que está “cansado”. E de facto a vida moderna é cansativa. Há sempre mil coisas a fazer; o trabalho, a vida familiar, os amigos e a família alargada exigem todos grande dedicação; a distância entre o trabalho e a casa para tanta gente obriga a viagens cansativas em transportes públicos cheios ou no pára e arranca do trânsito.
O cansaço sempre acompanhou os seres humanos, e os animais. Porém, a vida moderna parece ter levado o cansaço a todos os campos da vida! A multiplicação dos tipos de cansaço é disso testemunho: um é físico, outro psicológico, outro afetivo e, depois, chegamos mesmo ao cansaço espiritual. A pergunta que se deve fazer é se com a ganância moderna de querer chegar a todo o lado não estaremos a andar por um caminho errado. Daí a questão: o que fazer para que o cansaço não nos domine?
Há coisas que não podemos deixar de fazer, mas algumas talvez seja possível. Nos mosteiros o descanso físico é bem regulado; faz parte da ascese dormir pouco para rezar mais e para estar disponível para o trabalho, contudo, o descanso faz sempre parte da regra.
No tempo moderno o mais dramático é, precisamente, quando ao cansaço das obrigações se junta o cansaço provocado por uma vida desregrada. É preciso, neste caso, recordar que assim como na Idade Média a ascese tinha como objetivo concentrar a atenção do asceta em Deus e levá-lo a agir com caridade vencendo os egoísmos, também hoje, decidir descansar quando se pode tem como objetivo concentrar a atenção em Deus e levar a pessoa a dedicar-se mais aos outros.
Decidir desligar a televisão, o computador ou o telemóvel para ir dormir não é, neste sentido, egoísmo. É, muitas vezes ascese e é caridade. Assim como ajudar os pais ou os esposos em casa para que todos possam descansar mais é igualmente cuidar do ambiente familiar. E é preciso força espiritual para conseguir tomar essas decisões, de tal modo as solicitações são insistentes.
De todos os que sofrem as consequências do cansaço, a família é a primeira a ser afetada. A pessoa cansada tem menos paciência para ouvir o outro, tende a pensar que o seu problema, precisamente porque o cansa, é mais importante, e faltam-lhe forças para escutar o outro! A pessoa estafada tende a não aguentar uma contrariedade e a não conseguir esconder uma irritação. E quando o cansaço se acumula a tendência para a pessoa se fechar em si também cresce e as relações esfriam.
Um dos problemas associado ao cansaço é a pessoa começar a imaginar que a solução é mudar algo. E quando se está muito cansado e se tomam decisões drásticas não é raro que sejam precipitadas. Não se está bem e pensa-se que é preciso fazer algo de diferente! Quantas vezes se julga que, quando se está cansado, se descansa indo ao cinema ou tomar um copo com amigos! E quantas vezes para conseguir uma boa conversa em casa para ultrapassar alguma dificuldade bastaria um bom repouso! Porém, o corpo é o que é, e se não se descansa fica-se mais fechado, mais embirrento, menos entusiasmado, mais rotineiro!
A fidelidade – que não é rotina; a criatividade – que não é mudar por mudar mas melhorar e a contemplação - que é ver o outro e ver Deus com amor são algumas das virtudes que permitem as relações humanas ficarem mais fortes, mas precisam da atenção e dedicação que só quem descansa consegue ter.
Recordemos que o ideal da vida humana é o “repouso”. Participar no repouso de Deus. Essa é a grande meta da nossa vida. O desejo de eternidade corresponde ao desejo desse Repouso. Hoje, porém, na chamada vida liquida, “graças ao número de experiências terrenas que se esperam conseguir fazer, não se sente a falta da eternidade” (Zygmunt Bauman). E assim, em vez do repouso, o que parece atrair os homens de hoje é o fazer mais coisas, a multiplicação de experiências, mesmo que não levem a parte alguma! O repouso, por isso, para tantos surge como um empecilho, próprio dos preguiçosos!
Os santos são aqueles que olham com desejo e com entusiasmo para o repouso que os espera no Céu e, ao mesmo tempo, sentem-se felizes fazendo sacrifícios pelos outros. Muitas vezes isso implica tirar tempo ao repouso para dedicar aos outros, mas hoje, para muitos, o sacrifício é ir dormir mais cedo! O Segredo é preferir descansar em vez de consumir tudo o que há para consumir neste mundo! O Nosso Criador pensou bem a coisa: há dia e há noite, há tempo para descansar e tempo para trabalhar. Seria bom que as circunstâncias ajudassem, mas pelo menos o que cada um pode descansar faça-o, que isso vai ser bom para a sociedade toda.
Comentários