Tu és um bem para mim

Franco Nembrini 
20160924
Inicio de Ano 2016/17 CST

Texto adaptado a partir de apontamentos de Inês Dias da Silva, podendo não corresponder verbatim ao que foi dito

Não sou um teórico da educação, mas os meus pais foram dois santos que vi educar.
Os homens quando dão a vida, não dão só a vida, dão também o sentimento da vida, porque a vida biológica, tambem a dão os animais, mas os homens dão um certo sentimento da vida; e todos educamos, sempre, nos encontros que fazemos com todas as pessoas com quem nos cruzamos, seja na caixa do supermercado ou onde for.
Uma criança que passa 9 meses na barriga de uma mãe que está de bem com a vida, provavelmente terá mais hipóteses de ver a vida como uma coisa boa. Ao invés, uma criança que passa os primeiros 9 meses na barriga de uma mãe amargurada, aborrecida com o marido e com os outros filhos, ou mesmo infeliz com a perspectiva do filho que vai nascer, terá mais dificuldade em ver a vida como uma coisa boa. 
Uma mãe, para educar, não tem mais nada a fazer do que estar contente.
Um filho está sempre a observar os pais. Respira o sentimento da vida que têm o pai e a mãe. Não é uma questão de regras e palavras. Graças a Deus é sempre possível recomeçar, mas esta é a lei da vida. Eles não aprendem com as nossas palavras, mas observando-nos, tendo dentro o desejo desesperado que respondamos à única pergunta que é verdadeiramente decisiva.
Lembro-me do momento em que percebi isto verdadeiramente. Adormeci enquanto corrigia testes e quando despertei, vejo os olhos do meu filho por cima do tampo da mesa, a olhar para mim. Não sei há quanto tempo estaria ali. Perguntei-lhe o que precisava, mas ele não pediu nada, não precisava de nada, mas olhava-me como que fazendo a pergunta:
- Pai, garante-me que vale mesmo a pena vir ao mundo.
Se um educador não sente esta pergunta em si, como que a arder, haverá instrução, eventualmente plágio, haverá certamente a violência de mudar o outro, mas não haverá Educação. 
O segredo da educação é não ter o problema da educação. A educação acontece, porque os filhos estão sempre a olhar para nós.
O que os filhos fazem não é um problema porque eles vieram ao mundo, feitos por Deus, bem feitos!!!
Porque foi Deus que criou o Universo e viu que era bom. No fim, havia algo que faltava, porque os animais comiam a erva, ohavam para as estrelas no céu... e... voltavam a comer a erva. Foi preciso uma besta especial, que mesmo estando a comer uma coisa óptima, olhasse as estrelas, se comovesse e perguntasse:
 - Que maravilha! Quem fez isto tudo para mim?!
Então, Deus criou o Homem. 
E Deus continua a criar todos os dias, a criar o coração de cada filho que vem ao mundo. 
Ninguém pode jurar que o sol vai nascer amanhã. Só mesmo pela fidelidade de Deus. E este é o ponto que faz com que a vida seja uma aventura sem fim.
É preciso adultos que saibam responder a esta pergunta, então o problema da educação não são os miúdos, mas somos nós, os adultos.
A educação é um testemunho que se vive, não são regras. O meu pai, ocupou-se da sua santidade e não da minha e por isso lhe agradeço, e assim arrastou 10 filhos a procurar serem como ele. 
À noite entrava no nosso quarto, onde dormíamos 6 rapazes em dois beliches (imaginem a confusão e as guerras que fazíamos). Nunca nos mandou rezar, mas sim, rezava ele. Ajoelhava-se, nessa altura andava já com dificuldade, apoiado numa bengala, doente com esclerose múltipla, e rezava. 
 Pai Nosso...
Isto levava-me a pensar, quem é este Pai a quem o meu pai rezava.
Quem é que põe o meu pai de joelhos?  Ver o meu pai de joelhos era algo que me feria porque para mim, ele era o maior do mundo, não havia ninguém maior.
Eu queria ser como o meu pai...
- Senhor, faz com que eu seja com o meu pai!
Este era um sentimento fortíssimo . E não era que fossem outros tempos, já havia televisão, já havia sexo, já havia política. O meu pai não sabia nada do que não era preciso saber, mas sabia tudo do que realmente era preciso saber. Do bem e do mal, da vida e da morte, da felicidade e da tristeza, da saúde e da doença, da verdade e da mentira.
Eu aprendia só de olhar.
A minha mãe ia todos os dias à Missa, e para isso levantava-se as 5 da manhã. De vez em quando convidava um de nós para ir com ela. Não imaginam o significava para nós, ser escolhido para ir à missa com a mãe. Era como um presente, a escolha e o chocolate quente com nata que tomávamos sempre depois. Podíamos às vezes passar fome, mas havia sempre depois da missa com a mãe, chocolate quente com nata. Esta foi para mim a experiência da conveniência da fé cristã que a minha mãe me ensinou e que os padres e as freiras não conseguiram desfazer. Digo isto, porque mais tarde na catequese fizeram uma vez uma lista daquilo que agradava a Jesus e não agradava a Jesus. E eu fiquei aflito porque tudo o que agradava a Jesus não me interessava nada e só me interessava aquilo que não agradava a Jesus...
- Meu Deus! Como farei para ser cristão?
Graças a Deus ganhou o conceito da conveniência da fé cristã da minha mãe e do chocolate quente com natas.
Durante a missa, que era em latim, a mãe ia-me explicando o que estava a acontecer, mas depois da comunhão, a minha mãe tapava a cara com o véu e eu ouvi-a falar, mas já não era comigo. 
Com quem está a minha mãe a falar?
Eram 5 minutos em que ela já não se importava comigo. 
Com quem está a minha mãe a falar, que tanto a absorve?
Estou certo que a minha mãe vivia a sua vida, com os sacrifícios e o muito trabalho que tinha, pelos 5 minutos que se ajoelhava todos os dias, depois da comunhão.
Preocupemo-nos com a nossa Santidade e não com a dos nossos filhos. 
E não tenhamos medo de errar, porque na educação erramos sempre. Deus confia em nós e os nossos filhos perdoam-nos tudo, muito mais do que pensamos.  O que têm realmente dificuldade em perdoar é a nossa falta de esperança e de alegria.  A nossa incapacidade de dizer: Sim, a Vida é um Bem para ti e para mim.
Escola, esse maldito ídolo.
Há, hoje em dia, um equívoco com o qual é importante acabar. Dizemos aos nossos filhos: Gosto de ti. Mas o que queremos mesmo dizer? Gosto de ti, se a), b) e c) e cada um preencha as alíneas com aquilo que corresponder. Isto é uma chantagem! O que estamos a dizer é: Gosto de ti, se tu mudares.  Mas não pusemos os filhos no mundo assim! Antes, com uma gratuidade à imagem e à semelhança da gratuidade de Deus. O que os pôs no mundo foi uma gratuidade! As alíneas a), b), c) virão, se não forem objecto de uma chantagem que eu lhe faço.
Esta é uma geração que sofre.
É a primeira geração que é mal amada, não é perdoada.
É uma geração órfã .
Uma geração que não agrada a ninguém.
Não agrada aos pais,
Não agrada aos padres,
Não agrada aos professores.
É uma geração que se pune com a culpa de ter nascido!
E surgem então fenómenos que estudam os psicólogos, que não existiam antes. Jovens que se auto-flagelam, e quando se procura a razão profunda para tal coisa, descobre-se que sentem culpa por existir! O nosso testemunho deve dizer:
 - TU és um bem!
Claro que há outros fenómenos que sempre existiram e continuam a existir. Continuam a achar tudo uma porcaria, sempre houve a fase em que tudo mete nojo. 
Que porcaria, a minha família!
Que porcaria a escola!
Que porcaria, a política!
Que porcaria, a sociedade!
Mas dantes, dizíamos: É tudo uma porcaria, mas nós mudaremos o mundo! (E vejam como nos saímos bem..., as asneiras que fizemos!).
Mas hoje em dia o mesmo raciocínio leva-os a dizer: Também eu sou uma porcaria. E por isso maltratam-se.
Precisam de adultos que amem a vida! Se quando nos casámos tivéssemos dito um ao outro, casamo-nos mas só se a), b), c)... estaríamos todos solteiros ainda hoje. 
A escola é uma chantagem diária que os fazemos viver. O valor das crianças não são as notas que tiram na escola! 
A escola é uma estrada (não a única) para chegar à meta, não é a meta.
Confundir a estrada com a meta é um perigo sério na vida.
Conto só uma última história de quando conheci o Padre Bertone que estava a montar uma missão na Serra Leoa, na altura em que tinha acabado de começar a guerra. Tivémos oportunidade de viajar até Africa e conhecer a missão. Impressionados com o que vimos quisemos juntar esforços para montar uma escola na missão onde as condições eram muito más. Mexemo-nos todos, era bonito ver os meus filhos a fazerem telefonemas. Foi o nosso filho mais católico de todos que comentou: Só nos faltava virem agora estes meninos pobrezinhos de África. Ocorreu-me dizer-lhe muitas coisas, mas decidimos eu e a minha mulher, que o que podíamos fazer era levá-lo lá, para que ele visse também o que nós vimos. 
Nas férias do Natal fomos então, a familia toda, visitar a missão do Padre Bertone.
A passagem de avião custou 1800 euros, cada uma, tivémos que mendigar pelos nossos amigos e ficámos com uma dívida que ainda pagaremos um dia. Mas depois desta estadia, o nosso filho agradeceu ter ido ver "o Paraíso no Inferno."
Pois, ir ver, fazer experiência, tocar a carne é condição necessária para distinguir o Paraíso do Inferno.

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