Os filhos dos outros e os nossos

Inês Teotónio Pereira
DN20160924

Os pais de hoje chateiam imenso os filhos. Tanto amor é defeito, dizia a minha avozinha. E é. Nós passamos os nossos dias obcecados com os dias dos miúdos. Não lhes damos descanso. Onde estão, o que fazem, o que estudam, com quem se dão, se estão agasalhados, se estão felizes, se têm amigos, o que pensam. E vivemos paranoicos com o futuro deles. Aos 15 anos já deviam saber o que querem da vida. Uma ideia, mais ou menos. Mas não. Os miúdos não têm interesses, meu Deus. Não leem, só gostam de consolas e do YouTube. Acham que wi-fi é gratuito e que o leite nasce do frigorífico. Caminhamos para o fim do mundo e eles são os protagonistas. É o fim. Não dormimos. Além disso não são autónomos (pudera). Depois, olhamos para os filhos dos outros e ficamos deprimidos. Há sempre os filhos dos outros. Aqueles filhos que os nossos pais nos apontavam como a luz do farol. Aqueles filhos dos outros que estão sempre felizes, que têm um futuro brilhante pela frente, que são bons em tudo e que ainda por cima são excelentes filhos dos outros. Aqueles que há um século (na altura em que tínhamos 15 anos), desejávamos secretamente empurrar para debaixo de um autocarro. Agora, estamos todos iguais aos nossos queridos pais: "Olha, o filho da não-sei-quantas, faz surf, voluntariado e já sabe que quer ir para Gestão. Não anda esparralhado nos sofás... Desde o 9.º ano que ele sabe o que quer. E tu?". Pumba. E lá vai uma direita bem enfiada nos queixos da autoestima do nosso adolescente. Não, os pais não aprendem: os adolescentes ambicionam ser uma árvore e não engenheiros. Eles querem vegetar até serem horas de irem vegetar com os amigos. Ponto. Tudo o resto, é uma miragem. Um adolescente descreve-se numa linha: já não são uma coisa e ainda não são outra - estão em trânsito. E os filhos dos outros, caros pais, não existem e a existirem deviam ser vistos por uma equipa de cientistas da NASA.

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