O futuro da direita

Jaime Nogueira Pinto
DN 2016.03.12

A direita governou Portugal durante mais de quarenta anos com o regime nacional-autoritário de Salazar. Por isso, embora tenha tido altos custos, foi normal que a esquerda governasse no ciclo seguinte, em termos de hegemonia ideológica e supremacia política. Quando falo de direita e de esquerda não falo dos conceitos maniqueístas vulgarizados (pela "esquerda"), em que a esquerda são os pobres, os camponeses, as classes trabalhadoras, os intelectuais, os jovens, os progressistas, os bons; e a direita, os ricos, os lavradores (alentejanos), os patrões, os capitalistas, os reacionários, os fascistas, os maus da história. Nem da versão igualmente maniqueísta da "direita", em que a direita são as classes médias empreendedoras, os empresários, os liberais, os europeístas, os antifascistas, o "país real" - os bons; e a esquerda os que vivem de subsídios, os comunistas, os anarquistas, os socialistas, os estatistas, os totalitários - os maus...O que separa a direita da esquerda tem pouco ou nada que ver com estas guerras e epítetos de classe ou de renda: são bases filosóficas distintas como o "pessimismo" e o "otimismo" antropológicos, isto é, o ponto de partida sobre a natureza humana que classifica o homem como "naturalmente" bom ou mau. Santo Agostinho, Maquiavel e Hobbes seriam "de direita" e Rousseau, Marx e Lenine de esquerda.Se o 25 de Abril de 1974 rejeitou os valores de direita, a verdade é que as direitas, com exceção das novas gerações, tinham deixado de pensar politicamente nos últimos anos do Estado Novo. As esquerdas, aproveitando o descontentamento corporativo dos militares com a guerra de África e a transição marcelista, impuseram a sua linha a partir do golpe de Abril. A direita sociológica e até ideológica que sobreviveu, continuou ou recomeçou na política, teve, partidariamente, de se resignar a alinhar e votar nos partidos do "centro", no Centrão democrático social ou social-democrático. Os principais valores da trilogia estadonovista - Deus, Pátria e Família - desapareceram na voragem antifascista do PREC e na correção política que se lhe seguiu. Com medo de incorreções, os líderes partidários das direitas foram-se ficando pelo conservadorismo social-cristão ou por um compromisso de austeridade social-democrática que os seus inimigos qualificam de liberal ou ultraliberal ou "de direita" ou "ultradireita".Partindo de um pessimismo antropológico de base, os valores da direita estão ligados ao realismo geopolítico, ao nacionalismo político, ao conservadorismo familiar e social e à economia de mercado. E, numa altura em que a legislação está sujeita aos caprichos e à chantagem ideológica da esquerda utópica, também aos custos ocultos das mudanças.Se uma comunidade viveu durante muitos séculos com valores de orientação como o patriotismo, o enraizamento, a família tradicional, a propriedade privada, o sentido do transcendente será que se pode deixar de cultivá-los e acabar com eles sem consequências? A acabar: somos hoje uma nação dependente, mas o resto do mundo começou a dar a volta: estes valores (de direita) estão outra vez presentes no Leste europeu, na Ásia, nas Américas. Portugal, que sob este ciclo político-ideológico decaiu e empobreceu para limites nunca vistos, poderá nos próximos anos - e até pela terapia de choque do desastre - estar aberto a um novo ciclo político-ideológico.Às forças políticas e partidos da não-esquerda compete retomar sem medos as bandeiras da direita nacional, ou deixá-las abandonadas ou livres, para quem tiver a coragem e a força de as restaurar.Os dados são estes. Quem os irá lançar?

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