Estado ou Governo?
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António Bagão Félix
Público 20160523
Público 20160523
As palavras devem ser usadas com sentido de precisão. Este rigor – cada vez menor – deve ser mais exigente quando se escreve ou fala no âmbito público e oficial.
O anterior Governo – creio que na esteira de precedentes formulações – entendeu que documentos oficiais e formulários da Administração Pública deveriam passar a usar um logótipo com a bandeira portuguesa estilizada e, ao lado, GOVERNO DE PORTUGAL, acrescentando a seguir o departamento ministerial respectivo.
Não me detenho aqui no potencial custo destes modernismos aliás, em linha com a constante alteração do nome dos ministérios e das secretarias de Estado, nem nessa pueril “necessidade de marketing” de se querer apor uma “marca” ao nosso Estado. O então Governo definiu a mudança como uma medida de eficiência duradoura, “uniformizando as identidades visuais dos vários organismos estatais”, assim como um meio de – imagine-se! – “reforçar a auto-estima dos portugueses”. Foi correcto o propósito de homogeneizar os logótipos departamentais que se vinham espalhando para satisfação da imaginação criativa por via de concursos.
O que achei lamentável foi o abuso de o “dono” do logótipo e da consequente parafernália documental (e não só) passar a ser o GOVERNO DE PORTUGAL. Basta olhar para uma receita médica do SNS e lá está esta expressão, como se o beneficiário tivesse que agradecer ao GOVERNO DE PORTUGAL a prescrição de medicamentos! Este modo de encimar os “papéis” não é correcto do ponto de vista linguístico e muito menos do ponto de vista político. O Governo é, politicamente, o órgão superior da Administração Pública (artigo 182º da Constituição) mas não se confunde com o Estado como um todo. Este está para além dos Executivos e tem outros órgãos de soberania desde o Presidente da Republica, ao poder legislativo e aos Tribunais.
Em boa hora, o actual Governo alterou o logótipo. Manteve o estilo e a bandeira nacional, mas passou a ler-se REPÚBLICA PORTUGUESA em vez de GOVERNO DE PORTUGAL.
Um pormenor? Certamente alguns dirão que sim, mas para mim, enquanto cidadão, trata-se de uma precisão de que não prescindo. A minha relação enquanto contribuinte, utilizador de serviços públicos, beneficiário da Segurança Social ou noutra qualquer condição é com o Estado e não é apropriável por este ou aquele Governo. Preferiria ESTADO PORTUGUÊS, mas aplaudo a alteração. Mas chega de mudanças e de “marcas”.
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