Pedro, um contemplativo decidido

PADRE DUARTE DA CUNHA    VOZ DA VERDADE   13.11.16


Ao longo da vida podemos conhecer muitas pessoas e, graças a Deus, muitas tornam-se amigas. Mas não há dúvida que algumas têm algo de especial e conseguem transmitir uma outra dimensão da vida, e essas são raras. São como as pedras mais preciosas, mais raras.

O Pedro Aguiar Pinto era uma dessas pessoas. Muitos dos seus amigos não têm medo de dizer que era um santo. E, por isso, não têm medo de chorar a sua falta e de pedir a sua ajuda agora ainda mais do que antes.
No sentido mais autêntico deste termo, o santo é aquele que está marcado e é determinado no seu agir pela presença de Deus. Um santo vê melhor que um não santo a vida como Deus a vê, mas também vê melhor Deus na vida. Mesmo quando peca, um santo é diferente. Percebe que ofende a Deus e pede perdão.
O Pedro, através do muito que a sua vida abraçou, deu sinais claros desta sua capacidade contemplativa. Um contemplativo no mundo não é o mesmo que um contemplativo no mosteiro. No mundo, um santo vê Deus através das muitas ocupações e circunstâncias.
O Pedro tinha uma família especial. A Leonor, sua mulher, é uma pessoa ímpar e os dois formavam uma unidade que marcou muitas vidas. O testemunho que davam aos amigos e a muitos noivos que preparavam para o casamento é muito eloquente. Estou certo que na vida de um casal nada é mais importante do que ver Deus no outro e, sobretudo, na comunhão que constituem: os Aguiar Pinto tinham isso como normal. Uma comunhão certamente trabalhada, mas consistente; onde Deus tem todo o espaço para trabalhar os corações. O Pedro via bem essa mão de Deus na mulher e nas filhas. Ele tratava cada uma como um dom. E era capaz de ver o que outros nem sequer imaginavam que estivesse ali. Mesmo as duas filhas que aos olhos do mundo pareciam um problema, de tal modo eram doentes, ele e a Leonor tratavam – porque era assim que as viam – como um tesouro. Um presente de Deus que os levou sempre mais perto de Deus. Esse é outro traço da sua santidade.

O Pedro era um professor de agronomia. Dedicado a questões de agricultura e de ecologia. Não tanto para se deixar emaranhar em debates ideológicos ou se deixar corromper pelos poderosos deste mundo, mas porque a beleza da criação o comovia. O ambiente foi vivido como uma vocação. Um apelo a estudar para conhecer melhor e ser capaz de ver a verdade na totalidade dos seus factores. E assim a sua ecologia fugia de qualquer conotação política e, ao mesmo tempo, era altamente exigente porque queria ver sempre em tudo sinais de Deus. Um cientista assim, para mim, é um santo. Aliás este amor à vida como dom de Deus fez do Pedro um grande lutador pela defesa da vida de todos e especialmente dos mais frágeis, distinguindo sempre muito bem o que é um ser humano de todas as outras criaturas, por mais maravilhosas que fossem.
A sua capacidade contemplativa levou-o a ver muitas boas notícias num mundo pouco virado para elas. Ele reconhecia que o coração do homem é capaz de se entusiasmar com o bem e com o belo. Por isso, com o seu jornal das boas notícias e depois com o “Povo”, um blog e um email diário, ele oferecia a tanta gente um modo de ver a vida e a sociedade com esperança. Um pouco, podemos dizer, à maneira de profeta. Não era só bom senso. Outros são capazes de o ter. Mas capacidade de descortinar o divino no meio de nós. O “Povo”, por isso, nunca foi uma simples soma de textos, nem era uma coisa exclusivamente religiosa, mas foi sempre um olhar cristão para a complexidade da vida.
O Pedro foi alguém muito comprometido a Igreja peregrina. A peregrinação a pé a Fátima que anualmente organizava é disso exemplo. Mais do que um gesto que ele preparava para outros, era uma experiência que o Pedro partilhava com quem quisesse. Além disso, podíamos aqui elencar o muito que foi fazendo sempre pela Igreja. Nos movimentos onde participava ou onde tinha amigos ele viu sempre a Igreja como Corpo de Cristo. E sempre amou o Cristo total: corpo e cabeça, sem querer nunca os separar. E desde que Cristo se tornou central na sua vida, nunca mais deixou de se deixar educar pela vida na comunidade que encontrou. Uma experiência concretizada em tantos gestos onde silenciosamente e fielmente o Pedro ajudava.

Morreu enquanto peregrinava a Fátima. Deixou-nos. Mas um amigo assim não deixa de estar presente, agora tem outra missão. Não era um homem qualquer, era um santo. E um santo, quando morre, é santo para toda a eternidade, contemplará Deus ainda melhor, mas também amará melhor a sua família, os seus amigos, a Igreja e o seu “povo”. Dizendo isso, não tenho a pretensão de me substituir ao juízo de Deus e eventualmente da Igreja, se um dia, como julgo que seria justo, o declarar santo, mas não posso calar o que já sinto, e sei que Deus me compreende e que tantos que o conheceram partilham este juízo. 



Comentários

Mensagens populares deste blogue

OS JOVENS DE HOJE segundo Sócrates

Hino da Padroeira

O passeio de Santo António