Carta aos peregrinos
MIGUEL TEIXEIRA PINTO
AOS PEREGRINOS DA PEREGRINAÇÃO ANUAL DE COMUNHÃO E LIBERTAÇÃO
Amigos,
Regressado da peregrinação a Fátima, gostaria de partilhar convosco a reflexão do Padre João Seabra sobre a vida e morte do meu querido amigo Pedro Aguiar Pinto.
Dou graças a Deus por 11 anos de grande amizade - conheci o Pedro no primeiro dia da minha primeira peregrinação (8 de Outubro de 2005) -, em que peregrinámos juntos 12 vezes a caminho de Fátima para nos encontrarmos com Nossa Senhora. Para além destas 12 peregrinações a Fátima (esta última concluída com o Pedro já no Céu), tive o privilégio de, ao longo destes 11 anos, ouvir e testemunhar a sua grande sabedoria - vivida de forma sempre tranquila e discreta -, o seu grande amor a Cristo e à Sua Igreja, a sua dedicação à família, o empenho e brio que colocava em todas as actividades e tarefas que desempenhava.
Em todos os momentos sabia propor Cristo a quem o rodeava mas fazia-o sempre no respeito pela liberdade de quem tinha à sua frente. Recentemente vivi, na primeira pessoa, uma situação que é exemplo notável do que afirmo. Por motivos pessoais, que não vou, por razões óbvias, tornar públicas, decidiu que em 2016/17 iria deixar de guiar a Escola de Comunidade que se reúne na Capela das Amoreiras, às 5ªs feiras. Quando, a 22 de Setembro lhe comuniquei que os membros da EdC tinham decidido manter o grupo respondeu-me: "Louvado seja Deus. É mesmo o que gostaria que acontecesse mas achei que não podia sequer sugerir."
Não é por acaso que o lema do Povo era (é): "O Povo opõe-se à massa pois vive da liberdade e consciência de cada um". (Papa Pio XII | Rádio Mensagem de Natal de 1944/ Sobre a democracia / 6.º Natal de guerra).
Sei que o que lhe devo não é mensurável, mas sei que é imenso.
Sei a falta que me faz, mas sei que nunca estarei desamparado.
Este ano comemora-se o centésimo aniversário das aparições do Anjo de Portugal. O Pedro fez muita questão de assinalarmos convenientemente este facto, razão pela qual escolheu para capa do Peregrinar de 2016 uma belíssima fotografia da escultura do Anjo. No último Domingo antes da partida combinámos uma série de pormenores para verificar se seria possível levar os peregrinos à Loca do Anjo para lá fazermos memória dessas aparições. Assim foi, e o povo que guiou tantos anos pôde dizer (no preciso local onde o Anjo se manifestou aos pastorinhos) "Meu Deus, eu creio, adoro, espero e amo-Vos. Peço-Vos perdão para os que não crêem, não adoram, não esperam e não Vos amam", com a certeza de que a segunda parte desta oração é dita desta maneira mas pensada na primeira pessoa do singular.
No dia 13 de Outubro, em Fátima, o Cardeal Pietro Parolin proferiu uma homilia que parecia escrita com o propósito de nos ajudar a perceber a semana que vivemos, e em que afirmava:
"A Palavra de Deus que acabamos de ouvir convida-nos a saber estar ao pé do Crucificado. Não é a experiência apenas de um momento; saber estar ao pé do Crucificado é a sabedoria sobre a qual se constrói a Igreja." Mas, "não basta estar; temos de aprender a estar com o Crucificado, como Maria e João, o discípulo. Na verdade, pode-se estar ao pé do Crucificado como mero espetador, movido apenas pelo desejo de ver o que sucederá. Pode-se estar ao pé do Crucificado como contestador, movido pela recusa de tudo o que provocou aquela cruz. Pode-se estar ao pé do Crucificado como desiludido, sem esperança, convencido de que nunca vai mudar nada e de que a própria mudança é uma trágica ilusão. Pode-se estar ao pé do Crucificado como ressentido, com a sensação de ter sido traído por Aquele em quem se depôs confiança. Como se pode também decidir não estar ao pé do Crucificado, fugindo e escondendo-se à espera de tempos melhores. Por isso não basta estar; temos de aprender a estar lá como se deve. [...]
Se quisermos aprender a estar ao pé do Crucificado, podemos e devemos olhar para Maria, podemos e devemos acolher Maria como Mãe, isto é, como mulher que educa para a verdadeira opção da fé em Cristo através da partilha da sua experiência de discípula e de crente."
Isto que o Cardeal Parolin atesta foi o que sempre vi o Pedro, e a sua família, fazerem. Vi e continuo a ver, agora de forma ainda mais pungentemente assertiva.
No CL usa-se uma expressão que permite traduzir como, perante uma dor tão forte e grande, podemos simultaneamente ter uma certeza de felicidade e do Eterno. A letícia é "profundamente atravessada pela tristeza das coisas, como a face de CRISTO. Mas, sendo a tristeza condição passageira [é] condição do caminho, portanto, nem mesmo o nosso mal nos pode tirar a letícia; ela é como a flor do cacto, que na planta cheia de espinhos gera uma coisa bela.”
A 20 de Setembro, PAP, publicou no Povo um texto em que explica as razões porque vamos, todos os anos,em peregrinação a Fátima. Vale a pena ler, até porque o convite é permanente e está sempre de pé.
"Porque se vai a pé a Fátima?
Em primeiro lugar para responder ao pedido de Nossa Senhora: "Quero dizer-te que façam aqui uma capela em minha honra, que sou a Senhora do Rosário, que continuem sempre a rezar o Terço todos os dias". Por isso vamos e rezamos.
Depois, por muitas razões que nem nós sabemos.
Julgamos que vamos com um objectivo e o que acontece no caminho mostra-nos que afinal era de outra coisa que nós precisávamos.
O tempo, o silêncio, a oração, o sacrifício, a partilha de cinco dias de caminho, logo no início do ano, ajudam a vivê-lo melhor. Porque se a peregrinação é uma parábola da vida, fazê-la, faz-nos querer oferecer o que acontece na vida com a mesma disponibilidade com que o peregrino oferece cada dia.
É uma verdadeira experiência, porque nela descobrimos a inteligência do sentido das coisas.
Vamos mais uma vez de 8 a 13 de Outubro. Não quer vir connosco?"
Disse o Pedro, na mensagem publicada no seu "blog", no dia da partida para Fátima: "O Povo fará parte do meu pensamento e oração."
Para o ano, se Deus quiser, estaremos novamente a caminho. Com o Pedro a guiar-nos.
Ámen.
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