Os emojis de Gabriela

JOÃO MIGUEL TAVARES Público 23/06/2016

O problema está no irresistível impulso do PS para controlar, para não ter a menor noção do que deve ser a postura de um político face à comunicação social.

Vinte e cinco de Abril de 2015. António Costa não aprecia um texto assinado pelo director-adjunto do Expresso João Vieira Pereira e envia-lhe um SMS: “A coberto da confusão entre liberdade de opinar e a imunidade de insultar, o jornalismo é degradado por desqualificados, que têm de recorrer ao insulto reles para preencher colunas. Como não vale a pena processá-lo, envio-lhe este SMS para que não tenha a ilusão que lhe admito julgamentos de carácter, nem tenha dúvidas sobre o que penso a seu respeito.”
Sete de Abril de 2016. João Soares não aprecia um texto assinado pelo crítico Augusto M. Seabra e escreve no Facebook: “Em 1999 prometi-lhe publicamente um par de bofetadas. Foi uma promessa que ainda não pude cumprir. Estou a ver que tenho de o procurar, a ele e já agora ao Vasco Pulido Valente, para as salutares bofetadas. Só lhes podem fazer bem. A mim também.”
Dois de Maio de 2016. José Magalhães não aprecia um gráfico sobre a dívida pública portuguesa que José Rodrigues dos Santos exibe na abertura do Telejornal e escreve no Facebook: “Este talibã toma por parvos e desmemoriados os que lhe suportam as homilias troikistas. Julgo que cumpre com prazer o papel de enxotar audiências do serviço público.”
Dezanove de Junho de 2016. Gabriela Canavilhas não aprecia uma reportagem assinada pela jornalista do PÚBLICO Clara Viana a propósito da manifestação em defesa da escola pública. Escreve no Facebook: “Esta jornalista ainda não foi despedida por escrever factos falsos?” Os “factos falsos” relatados consistiam em: 1) na afirmação de que Jerónimo de Sousa e Catarina Martins tinham estado no palco ao lado de Mário Nogueira, quando eles estiveram apenas diante do palco em frente a Mário Nogueira; 2) na divulgação, por parte da jornalista, dos números estimados pela polícia – 15 mil pessoas – e dos números estimados pela organização – 80 mil pessoas –, em vez de somente os números estimados pela organização. Tudo questões da mais alta gravidade, como se pode ver, e com as quais Gabriela Canavilhas parece entreter os seus desconsolados dias, certamente por já estar fartíssima de ouvir as Variações Goldberg e os Nocturnos de Chopin.
Em declarações ao Observador, Canavilhas desdramatizou o pedido de demissão da jornalista e informou que usa a rede social de modo “informal” e “descontraído”. “Foi um desabafo”, esclareceu. Só não se compreende porque não foi desabafar e descontrair para o piano, tendo essa oportunidade. Ao Expresso, a antiga ministra da Cultura garantiu não ter apelado ao despedimento de Clara Viana. “Apenas perguntei.” “Se tivesse terminado com uns emojis como é meu hábito teria tido esse efeito?”, inquiriu. Eu diria que depende do emoji: se fosse com o sorriso malandro de António Costa, talvez passasse; se fosse com o esgar furibundo de José Sócrates, não.
Mas o problema, receio bem, não está na escolha dos emojis, tenham eles carinha laroca ou ar trombudo. O problema está no irresistível impulso do PS para controlar, para rosnar de forma destemperada e para não ter a menor noção do que deve ser a postura de um político face à comunicação social. Estamos a falar de primeiros-ministros, ministros e deputados com intervenções desbocadas em pouco mais de um ano. Isto não é acaso – é estilo. Um estilo que o PS desenvolveu com o caso Casa Pia, elevou ao seu expoente máximo com Sócrates e que, para mal dos nossos pecados, continua bastante viçoso com Costa. Em linguagem de Gabriela :-((

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