As notas e os pais

Inês Teotónio Pereira
DN 20160611

Os pais têm um problema com as notas: têm uma relação emocional de amor ódio com as notas. Os pais só gostam de notas quando elas são boas e em êxtase quando são excelentes. De resto, detestam notas. E porquê? Porque há um entendimento geral segundo o qual as notas têm como efeito colateral uma avaliação do nosso desempenho como pais. Quando as avaliações dos nossos filhos são boas, quer dizer que somos bons pais; se são más, quer dizer que estamos a falhar. É assim como no desporto: se temos craques em casa, quer dizer que fomos brindados com alguma coisa de divinal, o poder de criar génios. Basta assistir ao comportamento dos pais nas bancadas dos campos de desportos infantis e fica-se imediatamente a perceber que quem está a jogar, a sofrer, a empenhar honra, orgulho e glória dentro das quatro linhas não são as criancinhas de 7 anos - essas só se querem divertir -, são os pais. Apenas os pais. Na matemática é igual. Um filho bom aluno é um diploma que se pendura na parede da sala como símbolo de competência e que exibimos ao café juntamente com bolinhos quando temos amigos em casa.
Nada disso, pode-se pensar, o empenho dos pais nas notas dos filhos é altruístico. E mesmo o sucesso desportivo representa uma "preparação para vida". Só os melhores vencem numa sociedade competitiva como a nossa, diz-se. Pois tenho dúvidas. Desde que Portugal é reino que quem "vence" são os filhos dos amigos do cunhado do nobre da corte ou do líder do PS ou da distrital do PSD ou do genro do marquês de Pombal. As notas contam para pouco e em pleno século XXI continuam a contar pouco. Numa versão menos cínica, as notas também não dizem quem é desenrascado, quem tem espírito de iniciativa, quem é criativo ou quem se consegue safar no Dubai. As notas avaliam o que se sabe naquela altura e não o que se é ou muito menos o que se consegue alcançar. Todos os pais sabem isso. Por isso, o seu fanatismo pelas notas está alicerçado na conversa da copa no escritório sobre quem tem o "melhor" filho. Ponto. E os filhos que se aguentem pois não há nada mais importante que as conversas na copa do escritório.

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