Mensagens

A mostrar mensagens de junho, 2016

O bode está cansado de expiar

JOÃO MIGUEL TAVARES Público 30/06/2016 A estratégia é sempre esta: não fomos nós, foram os outros – foi Bruxelas. É impressionante a quantidade de gente que tem vindo a tratar os britânicos que optaram por sair da União Europeia como se fossem idiotas. Que os ingleses do “remain” achem os ingleses do “leave” um bando de tontos, isso é lá com eles; que um considerável número de portugueses, do alto da sua democracia com 42 anos, apareça a dar lições de sapiência política aos cidadãos de Reino Unido, já me parece bastante patético. Uma pessoa pode lamentar, como eu lamento, que o Reino Unido tenho optado por sair da União Europeia, mas não deveria passar pela cabeça de ninguém dar lições de bom-senso democrático aos habitantes das ilhas britânicas e andar para aí a proclamar que a “emoção” venceu a “razão”. Aliás, tendo em conta que há 20 anos Portugal transformou em estrondoso bestseller o livro de António Damásio O Erro de Descartes, naquilo que pode ser considerado um dos mai

30 de Junho - Santos protomártires da igreja de Roma

Imagem
POVO  30.6.16  Santos Protomártires da Igreja de Roma, 64-67 Hoje a Igreja celebra a memória dos cristãos que sofreram o martírio durante a perseguição de Nero, no ano 64. A culpa do incêndio de Roma recaiu sobre os cristãos, os quais foram cruelmente martirizados. Do lado Sul da Basílica Vaticana há um recinto pequeno, chamado ainda hoje Praça dos Protomártires (primeiros mártires) Romanos. As iluminações que lá se vêem na noite de 26 de Junho, evocam as fogueiras que, pelos anos 64 e 65 extinguiram, ou sublimaram, humildes e heróicas vidas humanas. Roma ardera seis dias e sete noites. Prendem-se primeiro os que são suspeitos de seguir o cristianismo, e depois, conforme as denúncias que se vão fazendo, prendem-se outros em massa, condenados menos pelo crime de incêndio, do que pelo ódio que outros lhes têm. Aos tormentos juntam-se as mofas, homens envolvidos em peles de animais morrem despedaçados pelos cães, ou são presos a cruzes, ou destinados a ser abrasados e acendidos, à ma

Não há um muro

João César das Neves DN 20160630 O dramático resultado do referendo britânico da semana passada deu, como se esperava, origem a enorme chorrilho de disparates.  Para lá dos profissionais da asneira, extremistas de todas as cores a quem tempos turbulentos dão audiência, muita gente sensata decidiu entrar na enxurrada, contribuindo com cenários radicais e abstrusos. Há razões válidas para o vendaval, pois todos estamos justamente confusos e assustados. Não apenas a possibilidade de saída do Reino Unido da União representa um choque terrível num momento difícil da Europa como também a diferença mínima da votação manifesta um país profundamente dividido numa questão essencial. Isso antecipa enormes dificuldades, bem como novos tremores, como o já anunciado referendo escocês sobre a permanência na Grã-Bretanha ou dificuldades acrescidas na dividida ilha irlandesa. Pior, o caso mostra um patente defeito no sistema democrático que surpreendentemente quase passou despercebido. Qua

29 de Junho - S. Pedro e S. Paulo

POVO  29.6.16  «E vós, quem dizeis que Eu sou?» Mt 16,15

Líderes queridos

Graça Canto Moniz ionline 20160628 Portugal não precisa de políticos rendidos a esta lamentável cultura de afetos, mas de líderes que sejam capazes de, sóbria e esclarecidamente, tomarem as decisões difíceis que a situação do país e do mundo exige A democracia fundamenta-se na escolha dos cidadãos; o Estado de direito, na separação de poderes. O que dá consistência e progresso a uma comunidade é a força das suas instituições - económicas, políticas e judiciais -, privadas e públicas, e a autonomia dos seus cidadãos para fazerem escolhas não condicionadas e livres. A ambição máxima de uma sociedade estruturada é que a gestão da coisa pública se institucionalize nestes dois pilares e não domine o espaço comunicacional até à náusea. Esse espaço, em Portugal, está longe de ser o expoente de uma sociedade saudável e madura, vivendo antes dominado pelo culto de personalidades presentes ininterruptamente, quais santos elevados num altar. Os nossos políticos, em vez de se dedicare

O último reduto dos derrotados

Luís Aguiar-Conraria Observador, 20160629 Muitos dizem que David Cameron errou ao convocar o referendo porque o resultado foi o que foi. É exactamente o contrário. Se a maioria do eleitorado quer sair da UE, então é bom que o Reino Unido saia Ficámos chocados com a decisão dos ingleses de sair da União Europeia. Pelo menos, eu fiquei. A Europa sem o Reino Unido não é a Europa. Basta lembrar que, mesmo sem Inglaterra, a língua franca na EU continuará a ser o inglês. E quem já tentou aprender alemão deseja vivamente que assim continue a ser. Independentemente da tristeza de ver os ingleses sair, não deixo de invejar a oportunidade que tiveram de referendar a sua participação. A primeira foi em 1975. Também nessa altura se vivia em crise económica, causada pelo choque petrolífero de 1973, que aconteceu pouco depois da adesão do Reino Unido à CEE (Comunidade Económica Europeia). Também nessa altura deve ter sido fácil atribuir à Europa as culpas de todos os males da crise. Mas

Acham normal não pagar à lavandaria?

Graça Franco RR online 28 jun, 2016 70% das mulheres considera justa a repartição do trabalho doméstico com os homens. Azar meu que faço parte das 30% que vêem aqui uma enorme injustiça . As mulheres portuguesas com emprego fora chegam às férias com mais um mês de trabalho realizado do que os respectivos maridos (mais 24 dias 8 horas diárias para ser exactos). Não é novidade, mas convém fazer do “ óbvio” notícia. Só para a tornar tema de conversa de jantar no maior número de casas. Mero “fait divers”? Errado. Aqui radica boa parte da explicação para a baixa fecundidade nacional, como prova um precioso estudo da FFMS sobre a baixa natalidade em Portugal. O novo inquérito aos “Usos do Tempo de Homens e de Mulheres em Portugal”, realizado pelo Centro de Intervenção Social, permite fazer as contas: no trabalho pago eles gastam em média mais 27 minutos (daí um salário ainda mais alto). Já no trabalho não pago elas dedicam mais uma hora e 12 minutos dedicando um total de 3 horas

Espanha não virou à esquerda

Miguel Angel Belloso DN20160628 Quero crer que os espanhóis que votaram no domingo passado, e que deram à direita a oportunidade de continuar a governar tiveram muito em conta o inevitável empobrecimento a que conduzem as teses populistas que foram determinantes no brexit ou as que na altura levaram Tsipras ao governo da Grécia. Não o esperava, porque a democracia é esquiva e nem sempre garante que os resultados produzam o bem-estar geral e o bem comum, como aconteceu nos casos da Grécia e do Reino Unido. Mas, desta vez, a Espanha teve sorte. Na lotaria que é sempre a democracia, os meus compatriotas demonstraram mais senso comum do que é costume. O que tínhamos de decidir no domingo passado era se queremos manter o país no rumo que o conduza a continuar a ganhar competitividade, que é a base do progresso, ou se, pelo contrário, queremos aplicar os recursos públicos na redistribuição e na despesa social indiscriminada, incentivar a falta de produtividade, a inação dos nossos jov

Comemoração do 65º aniversário da ordenação sacerdotal do Papa emérito Bento XVI

Imagem
O Papa Francisco presidiu hoje no Vaticano a uma cerimónia de homenagem a Bento XVI, pelo seu 65.º aniversário de sacerdócio, afirmando que o agora pontífice emérito “continua a servir a Igreja”. “Vivendo e testemunhando hoje de modo tão intenso e luminoso esta única coisa verdadeiramente decisiva - ter o olhar e o coração dirigido para Deus -, o senhor, Santidade, continuar a servir a Igreja, não deixa de contribuir verdadeiramente com vigor e sabedoria para o seu crescimento”, disse o pontífice argentino perante responsáveis da Cúria Romana, na Sala Clementina, a mesma onde o agora Papa emérito se despediu dos cardeais a 28 de fevereiro de 2013. A iniciativa marcou o regresso, mais de três anos depois, de Bento XVI ao Palácio Apostólico do Vaticano. Francisco apresentou uma reflexão centrada na presença do seu predecessor no Mosteiro ‘Mater Ecclesiae’, do Vaticano, desde onde emana “uma tranquilidade, uma paz, uma força, uma confiança, uma maturidade, uma fé, uma dedica

Europa unida

POVO  28.6.16  Esperamos chegar outra vez a uma Europa unida mas purgada da escravatura de tempos antigos - uma Europa onde cada homem tenha orgulho em dizer "Eu sou Europeu". Esperamos ver uma Europa onde os homens de todas as nações considerem tanto ser europeus quanto pertencendo à sua terra natal sem perderem nenhuma parte do amor e lealdade para com a sua pátria. Esperamos que, onde quer que vão neste vasto domínio ao qual não pomos limites no continente europeu, eles sintam verdadeiramente "Aqui estou em casa, sou também um cidadão deste país" Winston Churchill Amsterdam, 9 Maio 1948

‘Bora lá, Portugal: vamos sair da UE!

JOÃO MIGUEL TAVARES Público 28/06/2016 Adoro quando Catarina faz voz grossa e imagino o pânico de Merkel – um Tuguexit! Uma das consequências maçadoras do Bloco de Esquerda fazer parte da solução de governo inventada por António Costa é sermos obrigados a levar a sério aquilo que Catarina Martins propõe. Antigamente, os congressos do Bloco eram uma breve notícia que líamos ensonados nos diários de segunda-feira. Agora dão origem a várias páginas nos jornais e directos nas televisões. Antigamente, se o Bloco ameaçava com um referendo sobre a permanência de Portugal na União Europeia, o comentário mais longo sobre o tema seria “pfffff”. Agora estamos tristemente condenados a articular palavras. Articulemos, pois, até porque Catarina Martins teve este fim-de-semana o seu momento Pedro Nuno “As Pernas Até Lhes Tremem” Santos. Recordam-se com certeza que em 2011 o então escanhoado vice-presidente da bancada parlamentar do PS disse, a propósito do pagamento da dívida, que estava a

Os extremismos não são uma fatalidade

José Manuel Fernandes Observador 27/6/2016 Em Espanha não ficou tudo igual porque o vento mudou de direcção. A derrota dos radicais do Podemos e a vitória do PP mostram que a Europa não está condenada a sucumbir aos cantos de sereia populistas Domingo, hora do almoço, pavilhão do Casal Vistoso em Lisboa. No palco, quase eufórica, Catarina Martins proclamava: “Estamos só a começar”. Na plateia batiam-se palmas e agitavam-se bandeira – na mesma plateia que minutos antes aplaudira com entusiasmo o delegado do Podemos e apupara o representante do Syriza. No horizonte anunciava-se uma “cimeira das alternativas” – em Portugal, em Espanha ou na Catalunha. Domingo, hora de jantar, Madrid. A euforia de Catarina é arrefecida por um imenso balde de água fria. O seu Podemos, agora em coligação com os comunistas espanhóis, perde votos e deputados. O sonho da esquerda radical de ultrapassar a esquerda moderada do PSOE não se materializa, mesmo com os socialistas espanhóis a perderem tam

Catarina, a Grande contra a Europa

Alexandre Homem Cristo Observador 26/6/2016 O PS aproximou-se do BE e foi essa vitória que os bloquistas exibiram: o PS governa, mas quem manda é o BE. Catarina não foi apenas entronizada líder única do BE, mas também comandante da geringonça. No espaço de um mês, a geringonça foi celebrada duas vezes. Primeiro, no XX Congresso do PS. Agora, na X Convenção do BE. De certo modo, estes foram eventos gémeos: em ambos, vincou-se a viragem à esquerda, criticou-se o rumo do projecto europeu, diabolizou-se o anterior governo PSD-CDS e assinalaram-se as medidas mais populares (populistas?) da geringonça. A maioria das intervenções que se ouviram nesses dois eventos poderia ter sido proferida tanto num como noutro. Algo que, em 2014, seria inimaginável – nessa altura, o BE escarnecia o PS enquanto partido de direita. Quem mudou? Os socialistas – como explicou Mariana Mortágua, foi o PS que se aproximou do BE e não o contrário. Foi, aliás, essa vitória que os bloquistas passaram o fim

Brexit: Um Erro Que Provoca Inveja.

Imagem
José Maria Duque, Nós os poucos, 2016.06.27 Faço parte daqueles que pensam que o Brexit é um erro. Um erro que sairá caro ao Reino Unido e que sairá muito caro à União Europeia. A verdade é que o projecto europeu, apesar de seus muitos erros,  tem conseguido cumprir o seu maior objectivo: a paz. E este período de paz, que nós tomamos como adquirido, é uma novidade na Europa desde os tempos de Roma. Com a grande diferença que a paz actual não é fruto da atenta vigilância de uma super potência, mas sim da boa vontade entre os países da Europa. Esta é a grande genialidade do projecto europeu: relações internacionais já não baseadas no equilíbrios de poder mas sim no desejo de cada país de viver pacificamente com os seus vizinhos. Por isso o projecto europeu não falhou. O seu grande objectivo continua vivo. Neste momento existe uma grande confusão, fruto do modo como o poder da União tem desenvolvido o projecto europeu. A integração política e económica deixaram de ser

Respeito

Henrique Raposo Expresso, 2016.06.25 Apesar de não ligar às suas aulas, Alfredo Tinoco era o meu professor favorito. Passávamos tardes a beber imperais e a conversar num café na esquina da Av. das Forças Armadas com a Av. 5 de Outubro. Era uma tertúlia de três fellinianos: ele, eu e o meu amigo Bruno Vieira Amaral. Não falávamos da matéria ou do ISCTE, mas sim de mulheres, de romances oitocentistas, de cinema italiano, das memórias de cada um, da odisseia que ele viveu na Europa durante os anos da oposição a Salazar. O Tinoco era desconcertante por várias razões. Para começar, fundia uma voz infernal com um olhar meigo; a rouquidão prometia punição mas os olhos garantiam colinho. A meiguice era reforçada por barbas de avô oitocentista e pelo cigarro descontraído e indiferente ao fascismo higiénico. Para terminar, tinha à sua volta uma aura de tranquilidade como poucas vezes senti na vida. Apesar de ser ateu, anarquista e bombista fracassado (LUAR), Tinoco tinha aquele ar de quem

Revolta e choque

Miguel Monjardino Expresso 20160627 Um referendo mostra a clivagem entre Londres e o resto do país e entre as gerações novas e mais velhas. Nada ficará como dantes  O processo de decisão estratégico, todavia, tende a ser sempre rodeado por estas incertezas. Depois do referendo, as sociedades e os líderes europeus deixaram de ter o luxo de ir para intervalo. Temos de compreender o que aconteceu e tomar as primeiras opções.  Que nos mostra o resultado do referendo no Reino Unido?  Sobretudo duas coisas. O país vive do comércio internacional, mas as consequências da Grande Recessão de 2007-2009, a evolução da globalização, o fraco crescimento económico e a queda da produtividade minaram a confiança da maioria da população em relação aos partidos políticos tradicionais.  A guerra civil na Síria e a fragmentação do Médio Oriente transformaram a imigração na questão central do referendo. A identidade nacional e cultural ganhou à economia, às finanças e ao comércio As consequên