DIA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA

DIA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA – 1 DE MARÇO DE 2016
MISSA NA CAPELA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA

Caríssimos irmãos e irmãs!

O Dia da Universidade de Coimbra dá-nos a oportunidade de celebrar a gratidão pela sua história, num serviço de excelência à humanidade ao longo destes sete séculos de existência e na universalidade das latitudes onde chegou a sua influência. 
Estamos agradecidos aos homens que nos precederam e puseram as suas capacidades, trabalho e vontade ao serviço da promoção da cultura, expressão maior da pessoa humana.
Estamos também agradecidos a Deus de quem procedemos e que não cessa de nos criar capazes de penetrar nos mistérios da vida por meio do conhecimento, de construir um mundo acolhedor por meio do progresso das ciências e de orientar as relações humanas e fraternas por meio do uso da razão e da consciência, na liberdade.
Se a biblioteca, o laboratório, a sala de aulas ou os lugares da reflexão simbolizam o desejo humano de aprofundar o conhecimento pelo uso dos métodos científicos, esta capela, hoje reaberta ao culto no coração da Universidade, simboliza a fé enquanto lugar de abertura ao transcendente e caminho de aproximação ao sentido daquilo que somos. 
São variados os caminhos de procura da verdade sobre o homem e sobre o mundo, e, no dia em que se pretender alcançá-la por uma só via perde-se uma perspetiva universal, limitam-se as possibilidades de a conhecer, pois “A fé e a razão (fides et ratio) constituem como que as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade (João Paulo II, Fides et Ratio, 1998).
O Profeta Isaías olha para as paisagens desérticas e áridas de Sodoma e Gomorra, tradicionalmente situadas na região sul do Mar Morto, como símbolo da humanidade pecadora e fechada à glória de Deus e ao bem dos homens. São para ele o resultado de um mundo desorganizado e caótico, dominado pela malícia dos homens, avessos ao bem, que não respeitam o direito nem a justiça, que não protegem os oprimidos nem defendem a causa da viúva. 
Quando se pisam os direitos dos outros, não se respeita o maior bem, que é o bem comum e se perde o sentido ético nas intenções, nas relações e nas ações, produzem-se Sodomas e Gomorras, ou seja, sociedades alicerçadas em sistemas que escravizam e matam. A história está cheia de sinais dramáticos de opções erradas, em que não se respeita o Deus Criador nem se amam as pessoas criadas.
O mesmo Profeta aponta caminhos diferentes quando convida o Povo a dar ouvidos à Lei de Deus inscrita no mais fundo do coração humano, como elemento essencial da definição da sua identidade, quando convida à purificação das suas intenções e das suas ações, enquanto sinais da sua abertura ao respeito pela verdade própria e dos outros.
A terra fértil, que produz frutos que alimentam a vida, transformada em cosmos organizado e harmónico onde todos se sentem bem, simboliza a iniciativa salvífica do Deus Criador e a ação humana alicerçada na verdade e na justiça, como exercício responsável ao serviço da paz.
Apesar de todos os atropelos, crimes e pecados de que tem sido pródiga a história antiga ou recente, é sempre possível mudar de rumo e iniciar caminhos novos, mesmo que muitos sinais apontem no sentido contrário. Apesar de nem sempre se perceber que os erros do passado são lições para o presente, é possível dar passos firmes na procura da verdade mais profunda de nós mesmos, que nos conduzam a um futuro melhor. É uma questão de conversão pessoal e de conversão das estruturas que construímos, que dará origem a um novo modo de estar nesta grande e bela casa que nos foi dada: a terra como lugar onde habitamos, a sociedade como lugar das relações, as instituições como lugares de ação, as famílias como lugares primeiros de promoção da vida.
A página do Evangelho de S. Mateus que escutámos põe-nos diante do ponto de vista humano e cristão acerca do conhecimento do mistério que nos envolve. Por muito que possamos progredir nas várias ciências e que possamos aceder ao conhecimento das leis da natureza e da vida, fica-nos sempre diante um mundo imenso e vasto acerca do seu sentido, da sua origem e do seu fim.
Ao jogar com as diferentes categorias de pessoas, os escribas e fariseus, por um lado, e os que se autointitulam de mestres, pais e doutores, fala-nos da arrogância dos que pensam ser senhores da verdade e já não se deixam deslumbrar pela novidade do mistério que podem descobrir e conhecer.
A humildade abre sempre caminho à sabedoria e permite sempre chegar mais longe por meio do conhecimento. Mestre, pai e doutor, segundo esta linguagem figurada do Evangelho, é todo aquele que se abre à sabedoria enquanto arte de viver em harmonia consigo, com os outros e com Deus.
No fundo, sem desvalorizar o conhecimento, o ensinamento de Jesus no Evangelho, declara que, mais nobre e mais humano é saber viver, o que implica o uso da razão, da consciência e do coração. Enquanto os escribas e fariseus se sentaram na cadeira de Moisés para ensinar o que não faziam e impuseram fardos pesados aos ombros dos outros, o Messias de Deus humilhou-se e deu a vida por todos em sinal de amor, tornando-se o ícone da verdadeira sabedoria.
Esta perícopa bíblica, na sua linguagem datada, por um lado, mas aberta a todos os lugares e tempos da história, por outro, leva-nos a assumir com responsabilidade o sentido de tudo o que somos e fazemos, desde o trabalho e a investigação até às relações humanas, sociais, económicas e culturais. Tudo o que é ação humana tem de estar vinculado a um imperativo, que podemos definir como o bem maior da pessoa.
Toda a mensagem cristã é uma afirmação da grandeza e da dignidade do homem. Em Jesus Cristo, que se fez Homem e se entregou à morte na cruz, Deus humilhou-se para exaltar o Homem.
A nossa vocação de pessoas realiza-se sempre que, com humildade, nos alistamos entre aqueles que, consciente e livremente, percorrem os caminhos da sabedoria, trabalhando com a inteligência do coração ao serviço do bem maior de todos os homens. Essa é a maior glória de Deus.
Neste Ano Santo da Misericórdia, façamos da nossa vida um ato de acolhimento do dom de Deus e da nossa ação um ato de amor ao próximo, sob a proteção da nossa Padroeira, a Imaculada Conceição, Santa Maria, Mãe da Misericórdia.

Coimbra, 1 de março de 2016
Virgílio do Nascimento Antunes
Bispo de Coimbra

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