Convicções educativas
Viriato Soromenho Marques
DN 2016.01.15
O pioneiro da ideia de que caberia ao Estado assumir a tarefa de organizar uma educação pública e universal foi o genial e republicano Marquês de Condorcet. A leitura das suas Cinco Memórias, apresentadas à Assembleia Legislativa francesa em 1791, constitui ainda hoje um deleite para a razão e o coração: Condorcet "ousava" incluir as meninas, em igualdade plena com os rapazes, na escolaridade obrigatória! Condorcet, e mais tarde, John Dewey ou o nosso António Sérgio colocam a educação universal na categoria de "política pública". Trata-se de pensar o futuro de uma nação a longo prazo, em função de objetivos estruturais e constrangimentos que devem ser superados. A produção de uma política educativa deve incorporar o melhor conhecimento disponível na sociedade (e não apenas no governo e no Parlamento), e implica um compromisso construído para vigorar por várias legislaturas entre os principais atores institucionais, sempre em ligação íntima com os centros de investigação e os especialistas. Só a monitorização permanente - recolhida através, por exemplo, dos resultados de exames nacionais credíveis - permite uma avaliação em exercício das políticas, e a sua correção de rumo. Nada disto está a suceder com este governo, que resolveu implementar uma reforma abrupta no início do 2.º período letivo, numa ignorância arrogante do modo de funcionamento das escolas. Apesar dos disparates que li e ouvi a governantes e parlamentares, desprezando o parecer do Conselho Nacional de Educação, penso que o pecado mortal é mais de método do que de conteúdo. Esta mudança confunde política pública (policy) com tática política de curto prazo (politics). Para a primeira é preciso um bem escasso, chamado conhecimento. Para a segunda bastam as convicções, sejam de direita ou de esquerda. De que o inferno da política lusa está repleto.
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