O PS e a dívida

Nuno Saraiva
DN 20151113

O PS acordou com o Bloco de Esquerda a constituição de um grupo de trabalho para analisar e avaliar a sustentabilidade da dívida pública portuguesa que está nos 130% do PIB. Até aqui, nada de mal. Em democracia não pode haver tabus. São aliás conhecidas as posições das esquerdas sobre o assunto. Bloquistas e comunistas são pela reestruturação e os socialistas, mais prudentes, optaram sempre pela posição mais conservadora de recusar movimentos unilaterais e de confrontação que, como percebemos pelo caso grego, estão condenados ao fracasso. Hoje, porém, o responsável pelas relações externas do PS vai mais longe. Ao DN, salvaguardando que "toda a estratégia do programa do PS é dentro da União Europeia", acrescenta que não quer dizer "que não se estude". Numa altura em que o país está suspenso da decisão de Cavaco Silva sobre a indigitação ou não de António Costa como primeiro-ministro, era bom que o PS não descarrilasse e conferisse pretextos ao Presidente da República para ter dúvidas e hesitações sobre a sua solução governativa. Ao contrário do que se possa pensar no Largo do Rato, a retórica europeia sobre o Tratado Orçamental não mudou. A doutrina, concorde-se ou não, continua a ser, sem transigências, a que foi definida por Schäuble e Dijsselbloem. E, por isso, é fundamental ter nervos de aço para resistir às pressões, venham elas de onde vierem. A história diz-nos que não há qualquer razão para temer que um governo liderado pelo Partido Socialista signifique uma ameaça à presença de Portugal no arco europeu. Mas há que ter o bom senso de não fazer declarações que arrisquem más interpretações. O PS está no limiar da governação e convém que perceba, neste patamar e perante as desconfianças e as incertezas que existem, que cada palavra será escrutinada letra a letra. Isto não significa alienar convicções, apenas prudência elementar. Talvez fosse bom deixar a Mário Centeno - "ninguém com bom senso pensará em não pagar o que deve" - o confronto com a realidade. Até porque da irracionalidade dos mercados ele percebe. Ou, melhor ainda, que aprendam com o pragmatismo do comunista Octávio Teixeira: "O PCP pode manifestar-se contra o Tratado Orçamental. Mas tem consciência clara de que enquanto o tratado existir tem de ser respeitado."

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