6 razões para acabar de vez com os exames do básico

Comentário de Miguel Morgado em baixo
Esquerda.net 30 de Novembro, 2015 Catarina Martins

Perguntaram-me se eu quereria ser operada por um cirurgião que em vez de testado na escola tenha sido feliz na escola. Não tenho nenhuma dúvida; quero que tenha sido feliz.

1. A memória prega-nos partidas

Recebo mensagens de pessoas que me dizem que fizeram exames no ensino básico e não lhes fez mal nenhum, mas que não têm idade para os ter feito. Estes exames acabaram em 1974 e só voltaram com Nuno Crato. Exames nacionais não são testes de sala de aula nem provas de aferição

2. Sofrer não faz bem

Sobrevivemos ao longo da nossa vida a muitas coisas más. Não as desejamos aos nossos filhos e filhas, ainda que saibamos que não os podemos proteger 
de tudo. Impor algo que traz sofrimento e não serve para nada é uma estúpida crueldade.


3. Os exames não ensinam nada

É possível treinar crianças e jovens para fazer exames sem que tenham aprendido o conhecimento básico de que necessitam para as suas vidas. Impor a pressão dos exames a crianças não é ensinar, promover regras ou método. É incutir medo da escola e o medo está no oposto da cidadania.

4. Acabar com os exames é levar a sério a avaliação
Os alunos e as alunas são avaliados de diversas formas e ao longo de todo o ano, seja por testes ou pela avaliação da sua prestação na sala de aula. Exames nacionais não dizem nada sobre as conquistas e dificuldades dos processos de aprendizagem e criam novos problemas. A lógica dos exames subalterniza todos os dias da escola ao eventual sucesso num dia só e ao fazê-lo menoriza o quotidiano na sala de aula e o papel das e dos professores.

5. Chumbar é ser facilitaste

O ensino básico tem de ser o percurso em que se aprende o conhecimento necessário e acessível a todos e todas. O discurso da suposta exigência dos exames só serve para esconder o falhanço das políticas: tiram-se meios às escolas e depois chumbam-se as crianças que não se conseguirem safar. Exames no básico substituem a exigência da aprendizagem pelo facilitismo da desistência.


6. Eu quero um cirurgião que saiba dar gargalhadas
Perguntaram-me se eu quereria ser operada por um cirurgião que em vez de testado na escola tenha sido feliz na escola. Não tenho nenhuma dúvida; quero que tenha sido feliz, porque se aprende melhor quando se é feliz a aprender. E quero que não se esqueça do que aprendeu no ensino básico, por muito bom que tenha sido, e espero que o seja, na sua especialização. Espero que no ensino básico não se tenha limitado a treinar para fazer exames; que tenha aprendido as bases de que se faz o conhecimento todo e saiba usá-lo nas situações mais inesperadas e que nenhum exame pode prever. Que saiba a Física necessária para gostar do Universe is expanding dos Monty Phyton, a História para perceber a explicação sobre a origem da guerra do Blackadder, a Filosofia para querer ouvir várias vezes o folclore do Ricardo Araújo Pereira. Troquemos o facilitismo de Nuno Crato pela exigência da gargalhada.

Comentário de Miguel Morgado, Facebook, 2015.11.30

Há muito tempo que não se escrevia um texto tão patético como este da Catarina Martins sobre o assunto sério da educação. 
Mas ainda bem que foi publicado. Assim todos ficam a saber a ligeireza, a displicência e a agenda ideológica com que se quer arrasar a educação em Portugal. E tudo a pretexto de um amor lírico à escola pública. Que males fariam à escola pública se a detestassem, desafia a imaginação de um poeta. 
Em segundo lugar, noto que o PS adoptou exactamente a mesma linha na Assembleia da República. A mesma ideologia e a mesma retórica. Sobre o radicalismo do PS em coisas concretas estamos conversados.
Por último, a referência à preferência por um cirurgião que saiba dar gargalhadas faz lembrar uma entrevista de Harold Bloom, o grade crítico literário. em que ele confrontou uma pessoa com preferências idênticas. A conclusão para ele era óbvia: pessoas com esta agenda ideológica odeiam o saber, odeiam a cultura, desprezam o conhecimento. Este foi um tema que fez Harold Bloom, um homem da esquerda, perceber que a esquerda estava intelectualmente falida.
Finalmente, ainda bem que nós todos, independentemente do percurso escolar de cada um, tivemos a experiência de felicidade que nos permite receber este texto com a única reacção possível: uma sonora gargalhada. E, no entanto, se é verdade que apreciamos uma boa piada, não é menos verdadeira a apreensão que nos resta quando nos damos conta que esta coisa é a sério e que tem consequências para a vida dos nossos filhos.

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