Gaiola dourada

PAULO BALDAIA
DN 2013-08-18


A crise ainda não acabou, mas não faltam razões para estarmos todos mais bem-dispostos, mesmo os 
que estão fartos deste Governo. Sim, politicamente, o crescimento do PIB no último trimestre é mais favorável aos partidos que estão no poder do que à oposição, mas para os cidadãos de uma forma geral são boas notícias, ponto final.
Os comentários gerais transportam-nos, aliás, para uma característica de ser português, muito bem retratada na comédia Gaiola Dourada. O José e a Maria, emigrantes em Paris, são dois profissionais de mão cheia que vivem uma vida humilde e sempre disponíveis para todos os outros. Até aí, só se esqueceram de tratar tão bem de si próprios como tratam dos outros, mas isto (nem bem nem mal) não é uma característica de ser português. Onde eles se revelam portugueses é no modo como lidam com as boas notícias.
Sem querer contar o filme todo, revelo apenas que o José e a Maria tiveram uma dificuldade imensa em lidar com as boas notícias que um dia chegaram pelo correio. Por cautela, facilmente ficaram presos no que de mau podia haver escondido naquilo que de bom chegava.
As cautelas também foram a tónica dos comentários da oposição e dos sindicatos ao crescimento do PIB no trimestre. Mas cautelas e caldos de galinha são uma mezinha tão portuguesa que até na área política do Governo houve quem desse primazia aos necessários cuidados que é preciso ter na leitura destes números.
Não vale a pena embandeirar em arco mas, depois de uma recessão trimestralmente confirmada ao longo de dois anos e meio, o que nos impede agora de puxar pela parte psicológica da economia? Só é preciso acreditar que já batemos no fundo e que estamos a fazer a inversão de ciclo. Podem os empresários começar a investir e os consumidores a consumir. Vamos embora. Melhorar de vida dá trabalho. Arrisquem deixar o conforto da gaiola dourada, levantem voo, sejam livres.
É bem verdade que na gaiola não somos surpreendidos. Não nos acontece dar um trambolhão do alto de uma ilusão, mas também não crescemos. Para criar riqueza são precisas duas coisas simples: vontade de trabalhar e capacidade de arriscar. Se isto tiver mesmo batido no fundo e estiver agora a inverter a tendência, em bom português diz-se que "quem não arrisca, não petisca" e, aos que desconfiam das boas notícias, é preciso lembrar que também é em português que se diz que "quem nasceu para lagartixa nunca chega a jacaré".
Quero acreditar que os portugueses não estão condenados a ser pássaros de gaiola. Está na hora de fazer a diferença, acreditando na nossa capacidade para voar mais alto. Boas notícias são apenas isso, boas notícias. Não há que ter medo.

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