Deus guarde os nossos políticos!

Saragoça da Mata
Ionline, 2013-08-20

O devotado e benfazejo Político nutre tanto amor pelos irmãos que, sacrificando-se, se mantém o máximo de anos possível a ocupar os cargos que tão penosamente o castigam

Deus guarde os nossos políticos!
É que ser político é uma vida dura de sacrifícios e disponibilidade total ao bem estar dos concidadãos. Político não tem vida própria. Tudo é sacrifício, suor e lágrimas em favor da colectividade. São noites não dormidas para participar em intermináveis reuniões partidárias, para garantir que elimina todo e qualquer concorrente interno que lhe faça frente no propósito de servir o Povo. São as campanhas eleitorais, em que tem de estar de cara alegre para espalhar a boa-nova da cartilha partidária junto dos infiéis. Tudo para nossa felicidade. São as visitas eleitorais às cresces, às escolas, aos mercados e feiras, são os comícios e arruadas, tudo em prol do Povo.
Deus sabe o que sofre um político, tudo para nosso bem e da Nação.
E os sacrifícios a que o Político se sujeita na sua vida privada? Coitado! Ao invés dos concidadãos, não consegue constituir uma família normal, em que os Pais ajudam os filhos com os trabalhos de casa, vão às reuniões na escola, os levam ao judo e ao piano. Os filhos do Político são abandonados ainda antes, ou logo depois, de nascer, para que o progenitor possa dar tudo o que tem em nosso benefício. Para cuidar da coisa pública o Político nem vê os filhos crescer, gozo último da paternidade. O Político não acompanha os primeiros passos dos rebentos e dificilmente está presente nas récitas de flauta ou de ballet dos petizes. As reuniões dos núcleos, das concelhias e secções, das distritais e nacionais, consomem-no.
Os estudos e a profissão do político são as suas filhas enjeitadas. Dedicado à exigente vida partidária ou ao jugo que lhe é imposto pelos cargos públicos (para que tenhamos vida), o Político tem de fazer formação "expressa". Daí que tenha de obter o merecido grau académico fora de horas e sem estudar as matérias exigidas pelos curricula. Bem queria poder estudar, como os demais. Mas, por nós, sacrifica o direito a dominar a arte, a ciência e a técnica. Basta-lhe o título. O mesmo quanto à profissão. Como tudo dá para que os concidadãos tenham uma vida realizada, lá sofre as agruras de ter de renunciar à carreira. Quando entra para a política, saiba ou não fazer alguma coisa, nunca mais cessa a oblação de si mesmo em prol do todo. Qual voto religioso, passa a servir apenas um Senhor: o bem dos portugueses. Seja médico, juiz, advogado, jornalista, gestor, por nós prescinde da própria vida, para suportar o sacrificado ofício de zelar pela coisa pública.
O altruísmo do Político vai ao ponto de, apesar de todos os sacrifícios, nos impedir de o aliviarmos do fardo que carrega: o devotado e benfazejo Político nutre tanto amor pelos irmãos que, sacrificando-se, se mantém o máximo de anos possível a ocupar os cargos que tão penosamente o castigam. É por nós, só por nós, que é deputado, presidente de câmara, presidente de junta, 20, 30 ou 40 anos. Mesmo reformado, insiste em servir. E quando não consegue servir-nos num cargo, assume devotadamente outro. Nos poderes públicos ou nas empresas deles dependentes. A entrega é tanta que até contra a Lei luta, para poder manter-se no sagrado ofício. E ainda há quem tenha coragem de dizer mal do Político. Que blasfémia!

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