Os neurónios espelho e a campanha política

PEDRO AFONSO Observador 16/08/2015

Infelizmente, os vínculos dos cidadãos com os políticos são cada vez mais frágeis e erráticos.

Uma das maiores descobertas recentes das neurociências ocorreu, na década de 90, por mero acaso quando uma equipa de investigadores italianos realizava um estudo em macacos Rhesus. Um dos investigadores da equipa, liderada por Giacomo Rizzolatti, entrou no laboratório e começou a comer um gelado. O macaco olhou-o fixamente e depois aconteceu uma fenómeno espantoso: uma região do córtex pré-motor foi ativada, como se o próprio macaco estivesse a comer o delicioso gelado. Este fenómeno deu origem à descoberta dos “neurónios espelho”, que são células nervosas que espelham o ambiente no cérebro do observador e são fundamentais na socialização.
A ativação dos neurónios espelho ajuda-nos a compreender muitas coisas do dia a dia, quando por exemplo nos surge um conjunto de emoções (indignação, revolta, tristeza, etc.) ao observarmos um vídeo de uma notícia sobre refugiados de guerra ou vítimas de uma catástrofe natural de um país remoto. Deste modo, a visualização de uma determinada situação ativa os neurónios espelho e faz-nos sentir o que o outro está a sentir, criando um contágio emocional.
Mas qual a relação dos neurónios espelho com a política? Os neurónios espelho encontram-se ligados à empatia. A empatia traduz a capacidade de nos colocarmos no lugar do outro e, deste modo, compreendermos aquilo que a outra pessoa sente, bem como as suas necessidades. Facilmente se percebe a importância desta característica, pois um político sem empatia é um político que só se representa a ele próprio.
Brevemente iremos ter eleições legislativas. Os principais partidos já contrataram empresas de comunicação para ajudar a conquistar votos e ganhar as eleições. O marketing político tem-se tornado cada vez mais agressivo, esforçando-se para melhorar imagem de um candidato, tornando-o uma figura mais agradável para o eleitorado. Creio que é possível criar um “político simpático”, mas não se consegue fabricar um “político empático”; um político com a genuína capacidade de entender as dificuldades da população, colocando-se no seu lugar e sentindo aquilo que ela sente. Os recentes cartazes de campanha do PS refletiram essa dificuldade, expondo os limites (e os erros) de uma estratégia de propaganda eleitoral. Por isso, diversas pessoas consideram que o discurso político não se ajusta à realidade e não espelha a vida do cidadão comum, centrando-se cada vez mais em dados estatísticos e jargões económicos que muitos não compreendem.
A população está descontente com um sistema político que sente que não a representa como devia. Basta refletirmos sobre a taxa de abstenção recorde de 66,2% obtida nas últimas eleições europeias para percebermos que algo de grave se está a passar. Senão, vejamos: os vínculos duradouros que nós criamos com os outros são predominantemente emocionais. Infelizmente, os vínculos dos cidadãos com os políticos são cada vez mais frágeis e erráticos, o que ajuda a explicar o fosso progressivamente maior entre políticos e eleitores. O tempo demasiado prolongado na vida política acaba por contribuir para esse afastamento, subsistindo a ideia de que “eles” não vivem como “nós”; “eles” não sofrem como “nós”; eles estão todos contaminados pelos privilégios do poder.
Na verdade, por mais competentes que sejam os estrategas de marketing e comunicação dos partidos políticos, não é possível apenas através da imagem e de algumas frases conquistar a confiança das pessoas. A escolha do voto ­— tal como acontece em muitas áreas da nossa vida ­— tem uma forte componente emocional. Por isso é que há líderes que não sobem de popularidade nas sondagens de opinião. Se uns eram dissimulados, e deixaram de inspirar confiança, outros nunca nos tocaram o coração.  
Necessitamos de líderes políticos que usem de facto os seus neurónios espelho, pois é a única forma de compreenderem as dificuldades e aspirações do povo que se propõem governar.

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