O PS e o desemprego e a realidade – Bloco de Notas

David Dinis | Observador 5/8/2015

Das suspeições do PS, ficam 2 perguntas para daqui a uns meses: os estágios, políticas públicas de emprego, vão acabar? E vão incluir e discriminar nas estatísticas do INE emigrantes e estagiários?

O INE publicou a última análise trimestral do desemprego antes das legislativas. Vamos rapidamente olhar para os dados e perceber o que há ali de bom e o que há, ainda, de preocupante.
O que é indiscutivelmente bom
É a tendência. Ao fim de um ano de saída da troika – e portanto de alívio nas medidas mais duras de consolidação -, há mais 103 mil portugueses com emprego face ao (mau) trimestre anterior e mais 66 mil face ao mesmo período do ano anterior. Cruzando com os dados da população desempregada, pode dizer-se que a tendência confere: menos 92 mil desempregados face a março, menos 108 mil face ao mês homólogo de 2014. As discrepâncias só podem ser vistas ao milímetro.
Outros dados importantes: a descida do desemprego acontece em todas as regiões do país (8,5% apenas no Centro), com redução do trabalho a tempo parcial e do subemprego, há mais portugueses com Ensino Superior com emprego (sendo estes os que estão menos afetados pelo desemprego), também mais empregados em todas as faixas etárias (com uma exceção, já lá vamos). Tudo isto com a população ativa a subir, ligeiramente, no último trimestre.
Mas há outros dados a reter, para não nos enganarmos:
O primeiro é que o segundo trimestre é, pelo menos desde 2011, o melhor do ano, tendendo a ser corrigido depois. Isto não invalida que a tendência esteja progressivamente melhor, mas convém ficar atento aos dados mensais até às legislativas para ver como ela estabiliza.
A análise de fluxos que foi agora introduzida ajuda a ver à lupa: ainda há muita gente a entrar no desemprego (103 mil passaram para o desemprego, 144 mil para a inatividade num só trimestre). Mesmo assim, e ao mesmo tempo, isto é compensado pelas entradas no emprego 351 mil pessoas – 174 mil vindas do desemprego, 176 mil da inatividade. Isto mostra que o grau de volatilidade do mercado de trabalho é altíssimo, indiciando aquilo que adivinhávamos: as empresas estão ainda com pouca liquidez para carregarem no pedal e puxarem pela economia com investimento.
Há mais um indicador a mostrá-lo: os dados em bruto do INE mostram uma subida muito grande dos contratos a prazo – mais 68 mil no homólogo, mais 50 mil face ao trimestre anterior. Também há mais emprego sem termo (nos quadros), de 66 mil (homólogo) e 29 mil (trimestre). Mas a variação é realmente diferente e ainda precária – pelo que a necessitar de confirmação.
Depois vem a política:
E é aí que a pintura estraga: quando ouço o Governo dizer, sem se rir, que tem hoje menos desemprego do que há quatro anos (em vez de falar de uma clara inversão de tendência, que já é bem bom); mas sobretudo quando ouço vozes respeitáveis do PS a dizer que os dados estão “maquilhados” por causa da emigração e de um “aumento brutal dos estágios”.
É aí que registo duas perguntas para fazer ao PS daqui a dois meses, se e quando chegar ao Governo. Primeira: os estágios, que são políticas públicas de emprego, vão acabar? Segunda: quando o INE divulgar os primeiros dados respeitantes ao próximo Governo, vão incluir nas estatísticas oficiais os dados dos emigrantes e dos estagiários? Se a resposta for sim, encantado. Se for não, veremos o que dirão nessa altura.
O PS anda há meses a cometer um erro grande do ponto de vista político: alinhou um discurso como se o país estivesse tão mau agora como estava no auge da crise em 2013. Entendamo-nos: nessa altura, final do primeiro trimestre, havia 926 mil desempregados (e já muitos tinham emigrado); hoje há 620 mil. Nem toda esta redução será real, certo. Mas é difícil sustentar que nada disto tem a ver com uma normalização da economia (que cresceu 0,9% em 2014 e vai crescer mais este ano), com as empresas e – sim – com o papel que o Estado deve ter em empregar as pessoas. E havia, como expliquei atrás, muito por onde o PS podia pegar, mesmo a olhar para estes números.
Se não vão por mim, talvez possam ouvir Carlos Silva, o secretário-geral da UGT (e dirigente socialista): “Não vale a pena esgrimir os números oficiais. Para o bota-abaixo não contem connosco”. Acho que a falar assim ganhavam mais votos.
5/agosto/2015.
(Este artigo vai funcionar como o meu bloco de notas, atualizado até às eleições legislativas. Os textos mais analíticos estarão com links aqui, mas desenvolvidos aparte).

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