A maldição do ROA

JOSÉ MIGUEL PINTO DOS SANTOS 
Observador 06/08/2015

Os rácios são úteis quando usados por adultos. Mas cuidado que há crianças de fato e gravata que acham mais piada a 100% de 1 que a 5% de 100.
Os números não mentem. Somos nós, os homens, quem mentimos com os números. O que embora seja feio, admissivelmente pode ser útil. Mas inútil e estúpido é que nos enganemos a nós próprios com os nossos próprios números. Ironicamente, não são com números imaginários que nos iludimos na gestão empresarial e na administração pública. São com números racionais, uma subcategoria dos números reais. Mais comumente conhecidos como frações ou rácios.
Ninguém negará que ter uma rentabilidade dos ativos mais elevada é bom. Em princípio até pode parecer razoável que quanto mais alta for melhor será. Uma maneira de medir esta rentabilidade é com um rácio financeiro conhecido como “rentabilidade do ativo”, return on assets, ou ROA. Que se calcula dividindo uma medida de rendimento, ou lucro, obtido num período de tempo pelo montante total que uma empresa tem investido em ativos.
O ROA é usado nas empresas como uma das métricas de gestão. Em algumas é mesmo considerado que a maximização do ROA é um dos objetivos a conseguir. Era este o caso, por exemplo, da Dell nos anos 90. A Dell estabeleceu, nessa altura, a sua reputação como uma empresa inovadora e disruptiva no negócio dos PC para o grande consumo, e ainda por cima muito rentável. Uma maneira de fazer subir o ROA é conseguir mais lucro, o que a Dell conseguiu fazer até ao limite. Mas a partir de certo ponto, num negócio competitivo como o dos PC, tornou-se difícil aumentar o ROA conseguindo mais lucros. Outro modo de aumentar o ROA é diminuindo os ativos. Como? A tática da Dell foi subcontratar. Primeiro subcontratou um componente a uma empresa de Taiwan, depois três, depois dez, depois a montagem, depois a expedição. À medida que ia subcontratando ia podendo reduzir os ativos necessários à produção. O que resultava num denominador do ROA cada mais pequeno e, consequentemente, um valor cada vez mais alto para o rácio. Mas o truque de conseguir rentabilidades cada vez mais altas resultou na empresa se subcontratar completamente para fora deste negócio. O que certamente não estava na estratégia inicial da Dell que, diga-se em seu abono, conseguiu depois, senão prosperar, pelo menos sobreviver noutras linhas de negócio. Mas quem ficou com o negócio original foi a Asus, a subcontratadora Taiwanesa.
Os rácios são úteis quando usados por adultos. Mas cuidado que há crianças de fato e gravata que acham mais piada a 100% de 1 que a 5% de 100.
Professor de Finanças, AESE

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