“O catolicismo está estritamente ligado à razão. Para mim, é muito importante tentar aprofundar as coisas em que acredito”

Catarina Melo | Diário Económico | 2015.08.16
Exigente consigo próprio e com os outros
Apesar do seu contributo para o processo de inovação e do marketing associado aos produtos da Renova, Paulo Pereira da Silva, alerta para a excessiva personalização que, por vezes, há na sua pessoa. "A Renova é um grupo de pessoas. Se puder contribuir para que o grupo seja inovador, criativo, faça coisas com paixão e arrisque, é essa a minha função. É mais fazer cultura do que fazer rolos de papel higiénico", faz questão de frisar. A viver no Chiado, em Lisboa, o gestor desloca-se todos os dias à fábrica em Torres Novas. Mas as viagens preenchem-lhe cerca de metade do ano, entre deslocações aos 60 mercados onde a Renova está e que contribuem para mais de metade da facturação da empresa, que ascende a 140 milhões de euros.
No dia-a-dia de trabalho, a rotina de Paulo Pereira da Silva é sempre diferente, entre reuniões e ver pessoas, mas há coisas das quais não prescinde. "Tenho de ler alguma coisa, espreitar as redes sociais, o que acaba por ser um hábito importante, e, se puder, à hora de almoço gosto de nadar", refere. As redes sociais são espaços que muito valoriza. "Gosto e aprendo todos os dias muito com as redes sociais".
Quem o conhece não lhe poupa elogios no papel de gestor. "As pessoas vêem nele um líder e uma pessoa de acesso fácil. Quando vai à fábrica não tem qualquer preconceito em falar com uma pessoa que está na linha de produção", refere Luís Saramago, director de marketing da Renova, que já estava na empresa quando Paulo Pereira da Silva lá entrou em 1984. O rigor e a exigência são características que sobressaem no seu perfil de trabalho. "É uma pessoa de um grau de exigência elevado e que pauta pelo rigor que exterioriza nas emoções, tanto na satisfação como na irritação", explica Luís Saramago. Uma exigência que considera ser uma virtude já que leva as pessoas a melhorar. Mas, no dia-a-dia, há coisas que Paulo Pereira da Silva não admite. Uma delas é a falta de qualidade na informação. "Para lhe exporem um assunto, as pessoas têm de o saber explicar e responder às questões que coloca", explica Luís Saramago.
Já o amigo José Luís Nunes Martins confessa que mudou a opinião que tinha acerca do gestor quando o conheceu há cerca de três anos. "É completamente diferente do que julgava. Pensava que era vaidoso e rígido. Na verdade é muito humilde. Só pode ser verdadeiramente humilde quem é extremamente genial", salienta o filósofo que desafiou Paulo Pereira da Silva a partilhar a escrita do livro "Via-Sacra para Crentes e Não-Crentes", lançado no início deste ano. Reconhece-lhe ainda a determinação, a vontade de estudar, conhecer os problemas a fundo e resolvê-los, entre os principais atributos.
A ligação entre a ciência e a religião
Numa das paredes do gabinete de Paulo Pereira da Silva salta à vista uma grande ardósia preta preenchida com equações de Schrödinger e Maxwell que este classifica de "muito belas", e que mostram até onde o homem chegou na compreensão do universo. Mesmo ao lado, está um grande telescópio que, ainda recentemente, foi usado para partilhar com os colaboradores um vislumbre do último eclipse solar. O entusiasmo com que fala nos fenómenos da física não significa que se considere um físico frustrado. "Não tenho frustração nenhuma. Tenho de ser humilde em relação àquilo que Deus me deu na cabeça para ser. Não foi para ser um Einstein, o que posso dizer?", diz a sorrir.
Mas a formação em física acaba também por influenciar o seu trabalho como gestor. "Quando tinha a função de engenheiro, tinha fenómenos físicos no dia-a-dia, hoje em dia não. Mas o rigor intelectual que está por detrás de uma ciência pura, isso sim. Ou seja, o método abstracto que está na base e a curiosidade, isso sim influencia o meu trabalho", refere.
Um físico que ao mesmo tempo é católico, à partida poderá parecer incompreensível. Mas não na cabeça de Paulo Pereira da Silva. "O catolicismo está estritamente ligado à razão. Para mim, é muito importante tentar aprofundar as coisas em que acredito. Tentar estudar", disse o CEO numa entrevista recente ao canal Família Cristã. Na mesma ocasião explicou que a religião é uma questão familiar. "Sempre fez parte da minha vida. É algo importantíssimo para o meu equilíbrio: para saber o que me move", esclareceu.
Os ‘hobbies'
Considerado bom ouvinte, Paulo Pereira da Silva é visto também como uma pessoa solitária, sendo que nunca casou nem tem filhos. É o próprio a admitir que às vezes precisa estar sozinho e de silêncio para "pensar e arrumar a cabeça". Podem ser três, quatro dias ou uma semana, mas, nesse espaço de tempo, todos os aspectos práticos do dia-a-dia têm de estar resolvidos. "Se não estiverem, não estou livre", confessa. Entre o grande número de viagens que faz ao longo do ano, parte são dedicadas ao lazer. Volta normalmente aos mesmos sítios e elege uma noite na Grande Chartreuse, o primeiro mosteiro e a casa-mãe da Ordem dos Cartuxos situado em Grenoble, França, como um dos melhores momentos das viagens que já fez.
Entre os ‘hobbies' preferidos os seus interesses divergem para um grande leque de áreas. Tanto pode estar absorvido a ler um livro, como nas profundidades do mar a fazer mergulho e a abservar peixes ou corais. "A água é um elemento que me tranquiliza, traz paz, e é um meio onde há sempre uma descoberta. Quando estou debaixo de água consigo ver com mais facilidade coisas que não estão tocadas pelo Homem e gosto também do silêncio", revela.
Paulo Pereira da Silva confessa-se também um leitor compulsivo. O gosto foi cultivado desde criança quando vivia em Abrantes e se deixou envolver pelos livros que a mãe lia. A literatura brasileira da colecção de livros "Dois Mundos" e autores norte-americanos como John Steinbeck estão entre as suas primeiras leituras. Hoje, os seus hábitos de leitura abrangem desde livros científicos como a "História da ciência em Portugal", do físico Carlos Fiolhais, que agora está a ler, até livros de fotografia - outro dos seus hobbies preferidos -, passando por obras de Agustina Bessa Luís ou de José Luís Peixoto. Os autores internacionais premiados também são leitura obrigatória. "Leio muito e não seria feliz se não estivesse a ler", confessa. Os audio-livros são seus parceiros, sobretudo quando viaja.
O coleccionismo de antiguidades é um dos gostos que habitualmente lhe atribuem. Algo que nega. "Se tiver uma edição dos ‘Pensamentos' de Pascal - de quem gosto muito - que comprei num alfarrabista, em Paris, é algo que me é muito caro, mas não é por colecção. Tem a ver com as coisas que quero. Gosto de ter e estar rodeado por muito poucos objectos, mas alguns deles demorei muitos anos até ter exactamente o que queria", conclui.

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