Debaixo das estrelas


O tempo nas estrelas está no passado, mas é agora que a luz delas nos chega.
Voltou a sombra e voltaram as estrelas. Voltaram no céu de segunda-feira à noite, que estava cheio delas, sem uma única nuvem. A temperatura lá fora ainda não era morna, mas já não era fria de ficar fechado em casa, de costas para as galáxias.
Estamos na parte mais enganadora e deliciosa de Março, em que a ilusão da Primavera conhece picos de delírio de já estarmos perto do Verão. Em noites estreladas em que o ar tépido está parado, como se o vento respeitasse a nossa observação dos astros, basta inclinar a cabeça para olhar para o infinito cintilante e perdemo-nos mais uma vez.
Quase cheira a Verão: é da tontura da nossa pequenez. A Terra pode não ser o centro do universo, mas parece – e a parecença tem muita força. Se é tudo visto daqui, onde estamos, é difícil desconvencermo-nos de que não está tudo à nossa volta.
Portugal também está na ponta da Europa, mas, para quem cá está, numa noite morna, a olhar para as estrelas da noite, rodeado pelo mar aluado, apetece jurar que aqui é o meio do mundo, onde o mundo pára para pensar.
O tempo nas estrelas está no passado – algumas já morreram há muito tempo – , mas é agora que a luz delas nos chega. E agora, tal como aqui, também tem muita força.
É bom sabermos destas ilusões e que, com um pouco de trabalho, descobriríamos como é que as coisas são realmente. Aumenta o prazer não nos darmos a esse trabalho e satisfazermo-nos com o engano, pensando que todas as estrelas vão dar a cada um de nós.

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