Discordo de quase tudo

Eduardo Cintra Torres | Correio da manhã | 13.09.2015

Sócrates é a sombra gigante sobre esta campanha, numa tripla condição. 

Discordo de quase tudo o que li e ouvi sobre o debate Passos-Costa. Achei-o esclarecedor. Um debate é apenas uma de muitas ferramentas para avaliarmos candidatos, as suas respostas, segurança, personalidade. Mesmo se não respondem às perguntas, avaliamos essa atitude. Não achei o debate aborrecido. Ao contrário de outros, não houve "entrevistas separadas" aos dois. Debateram mesmo. Não achei o debate "decisivo" para os resultados eleitorais. Não conheço nenhum estudo de opinião que confirme essa ideia. Os debates podem influir a intenção de voto dalguns. Pode haver fluxos de simpatia de um para outro interveniente. Mas quem vê debates é espectador e quem vota é eleitor. Em 2006, Louçã teve a segunda melhor apreciação de desempenho nos debates presidenciais e ficou no último lugar em votos. O debate Passos-Costa só foi "decisivo" para as TV que o emitiram, porque a televisão considera-se sempre a si mesma como "decisiva". Mas, num inquérito sobre factores que influenciaram o voto em 2005, os debates surgiram em quinto lugar. Não achei a realização televisiva enviesada. Foi equilibrada. Não achei mal as intervenções dos jornalistas (apenas longas demais e moralistas); estavam preocupados com os tempos e queriam respostas às perguntas. Já deveriam saber que os intervenientes não lhes ligam porque querem falar de outras coisas, mas fizeram o que julgam ser o seu papel. Ridículo, sim, foi haver três perguntadores para dois respondedores, mais um sinal de que a televisão se acha mais importante do que o debate. Não achei que os intervenientes "só falaram do passado". Pois se até do futuro plafonamento das pensões falaram longamente! Será que os próprios jornalistas e comentadores que o afirmaram prefeririam ouvir promessas e amanhãs que cantam? Discordo que se critique os intervenientes por falarem do passado. Este fornece a única factualidade, pois o futuro não existe, é promessa. Foi esclarecedor ouvir as perspectivas de ambos sobre o governo Sócrates e sobre o governo actual. Discordo em absoluto do tabu que jornalistas e comentadores criaram sobre as referências de Passos Coelho ao governo Sócrates, como se fosse crime. Era só o que faltava que não o pudesse fazer. Ainda por cima, Sócrates é a sombra gigante sobre esta campanha, numa tripla condição: como preso e acusado; como governante que originou a troika; como chefe da facção do PS que pôs Costa em secretário-geral. Que tristeza: jornalistas e comentadores que desejam autocensura nos debates e no discurso público. 
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Costa, o novo "animal feroz" 

O comportamento de António Costa para com o entrevistador Vítor Gonçalves, na RTP, foi horrível e revela um traço de carácter. Gonçalves colocou-lhe perguntas pertinentes, bem formuladas e diferentes do habitual. Costa, furioso porque o jornalista fez perguntas para permitir o esclarecimento dos espectadores, insultou-o, dizendo que ele era "porta-voz" de Passos e que "repetia" as posições da coligação. António Costa odeia o jornalismo independente. Espera-se o pior para a liberdade de expressão se chegar a primeiro-ministro, um novo "animal feroz" em S. Bento. Horrível, também, o silêncio do Sindicato dos Jornalistas e das habituais "virgens ofendidas" com estes ataques à independência jornalística. SIC: assumam-se  politicamente O jornalismo pró-PS e pró-Costa nos media da Impresa é legítimo, mas deveria ser assumido. É feio no caso da SIC (por ser um canal generalista), mas seria legítimo no caso do ‘Expresso’, ‘Visão’, etc. Ser enviesado, de forma subliminar, como todas as notícias da SIC, é que me parece uma traição aos espectadores.

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