O tempo de Luaty

Tomaz Dentinho | Igreja Açores | Out 19, 2015 

Sabemos que não há sistemas políticos perfeitos. No entanto há sistemas que evoluem e se adaptam ao contexto que regulam e outros que evitam a mudança mas provocam a catástrofe. Em Portugal, desde há um tempo a esta parte, preferimos esta segunda estratégia de aparente estabilidade até que surge o desastre. E assim aceitámos as ruturas do Liberalismo, da República, do Estado Novo, do 25 de Abril e da Troika, com todos os custos de destruição e atrasos de desenvolvimento que esses colapsos implicaram.
Talvez por afinidade cultural parece que o regime de Luanda vai preferindo esta estabilidade desequilibrada e, com a esperteza de 40 anos de guerra, evitando grandes mudanças. Só que a estabilidade em desequilíbrio gera mecanismos de desastre e por isso é importante escutar os sinais daqueles que têm a coragem de expressar o que vêm. Luaty Beirão é certamente a pessoa para salvar, salvando Angola.
Tenho um grande respeito e admiração pelos que constroem um país e toda esta geração de angolanos merece um enorme respeito. Tivéssemos nós mais narradores de histórias dos Meninos do Huambo, dos Musseques de Luanda, das fugas na Mata, das hesitações do Palácio ou da presença de milagre e de serviço da Igreja e certamente gostaríamos de ter como nosso esse sonho de criação de um país novo. E custa criar e manter um país e o espaço de liberdade que potencia. Em Portugal é que, por vezes, parece que nos esquecemos.
Queria hoje mesmo ver o Chefe de Estado de Angola, José Eduardo dos Santos a acompanhar Dom Alexandre Nascimento, príncipe de Angola e da Igreja, a visitar Luaty Beirão no Hospital de Luanda e libertá-lo com todos os outros. Já ganharam tantas guerras que certamente ganharão este novo passo na construção de Angola. É um passo urgente mas o caminho é longo. A certeza que temos é que este passo é certo e que Deus e os Homens ajudarão a iluminar os passos seguintes.
O caminho já foi feito por outros com revoluções, como foi o caso de Portugal, e já foi feito príncipes quando chegou a hora, como no caso de Espanha. No caso Português criámos um regime melhor mas perdemos dez anos de desenvolvimento e gerámos a guerra civil em Angola, Moçambique, Guiné bem como a terrível ocupação de Timor pela Indonésia. No caso Espanhol também se criou democracia mas nada se perdeu em termos de desenvolvimento e criou-se uma história de evolução sem rutura capaz de enfrentar novos desafios com frontalidade e coragem. Haja heróis e príncipes e Angola ainda os têm.
O caso de Luaty também tem a ver com Portugal, com a formação do novo Governo e com a eleição para a Presidência da República. Da mesma forma que a Alemanha só serve se ajudar a resolver o problema dos Sírios e dos Turcos também Portugal só serve se ajudar a resolver, com dádiva, o problema com que os angolanos se encontram. Um país que não serve os outros, não serve de nada. Na verdade não é possível criar um governo em Portugal se não se mobilizar num projeto de missão em favor dos outros, na construção de uma Europa em função do mundo e na criação de um Portugal de serviço aos outros, agora em Angola. E o mesmo acontece com o Presidente da República que, mais do que gerir o jogo de poder de um espaço fechado, devem mobilizar os portugueses para o serviço ao mundo. No fundo queremos Chefes de Estado que sejam Príncipes Luaties nestes países de gente livre e soberana.
O que me faz ter tanta certeza disto resulta de ter tido o gosto de conversar com pão, vinho e tempo de mesa com os protagonistas: os Meninos do Huambo, as guardadoras dos Musseques de Luanda, os heróis das fugas na Mata, um ou outro hesitado dos Palácios e a presença de serviço da Igreja. Passar para o lado dos homens que é a única forma de manter as instituições de serviço aos homens. E o lado dos homens está hoje em Luaty.

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