A festa dos cinco papas
JOÃO CÉSAR DAS NEVES
DN 2014.04.28
Ontem foi um dia especial. Dois papas vivos declararam perante o mundo que dois papas mortos estavam na vida plena. A canonização de João XXIII e João Paulo II pelo Papa Francisco, na presença do papa emérito Bento XVI, constitui um acto único na história do mundo. Será que interessa ao mundo?
O assunto é precisamente aquele que mais preocupa ao mundo. Podemos dizer que é o único que verdadeiramente preocupa o mundo. A vida e a felicidade constituem o único tema realmente importante. E o dia de ontem tratou só de felicidade. Quatro homens eminentemente felizes, tão diferentes nas suas origens e histórias, carácter e condições, unidos numa mesma felicidade a que dedicaram toda a sua vida, celebraram juntos uma festa de felicidade.
Eles entregaram toda a sua vida a anunciar ao mundo uma felicidade única, plena, invencível. E apresentaram-se a si mesmos como testemunhas dessa felicidade. O que a festa de ontem celebrou foi que dois deles tinham completado a sua missão com êxito e entrado na felicidade plena. Isso garantiam solenemente os outros dois, um dos quais já completou a sua missão com êxito, esperando apenas o transporte para a vida, e o outro está em plenas funções.
Quatro homens simples e frágeis, mas cheios de vida e felicidade, que irradiaram por todo o mundo. Porque todo o mundo soube de João XXIII. Na altura não havia internet nem SMS, mas havia rádio e começava a televisão, e assim o mundo vibrou com o sorriso do bom papa João. Conheceu-o menos de cinco anos, mas bastavam alguns segundos para perceber que era um homem sumamente feliz. E se preocupava com a nossa felicidade. A João Paulo II, esse nem é preciso dizer que todo o mundo o conhece. Começou antes da internet e do SMS, mas durou muito tempo e viajou ainda mais; e também bastavam alguns segundos para saber da felicidade que emitia. Bento XVI era tão diferente de cada um dos outros como eles eram diferentes entre si. Apesar disso também viajou por todo o lado e mostrou a sua felicidade a toda a gente. O Papa Francisco ainda mal conhecemos, mas bastaram uns segundos para ficarmos íntimos, e sabermos como o seu assunto é a minha felicidade, porque ele transborda da sua. Como o fizeram toda a sua vida, ontem estes quatro homens juntaram-se para celebrar a felicidade, a nossa felicidade, que dois deles já têm em plenitude. Estava lá um quinto papa. Mal se falou dele, mas era o que dava sentido à celebração. Olhando com atenção via-se, do lado esquerdo da praça, a estátua de um homem barbudo com duas chaves na mão. A importância dos quatro homens é que eles são sucessores dele. Aquele Pedro, que amava Jesus mais que os outros, e ouviu: "sobre esta pedra edificarei a minha Igreja" (Mt 16, 18).
Este é o segredo de toda esta festa. A felicidade que estes homens espalharam e espalham por todo o mundo não é deles. Não foi por João ser bonacheirão, João Paulo teatral, por Bento ser sábio e Francisco vibrante que difundiram felicidade por toda a terra. Nisso há muitos semelhantes e até melhores que eles. A felicidade que espargiam não era deles. Tinham-na recebido de Outro, do Deus da felicidade que se fez homem como eles, e nos trouxe a felicidade suprema. Trouxe-a e deixou-a com Pedro e alguns amigos, dizendo-lhes para a darem a outros.
Aliás o que Ele disse foi: "Ide, pois, fazei discípulos de todos os povos" (Mt 28, 19). Eles eram poucos, não tinham net nem rádio, só o conseguiram dar a alguns. Mas esses deram a outros, e esses depois a outros e "o seu eco ressoou por toda a terra" (Sl 19(18), 5). Finalmente, no tempo de João, João Paulo, Bento e Francisco, espalhou-se por toda a terra ao mesmo tempo. Foi cumprida a profecia. Todo o mundo pode ver claramente a felicidade que irradia destes quatro homens. E sabe que de onde ela vem.
A festa de ontem foi um acontecimento particular, limitada. Teve dimensão e brilho excepcionais, mas tratou-se de um rito local. No entanto, o seu significado abrangeu todo o mundo. A razão é óbvia: mais ninguém tem uma felicidade assim.
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