O partido da democracia

JOÃO CÉSAR DAS NEVES | DN | 2014.04.14

Celebrando os 40 anos do 25 de Abril, é momento de avaliações a vários níveis. Questão interessante é determinar o partido mais notável deste já longo período democrático. Temos um regime parlamentar com os partidos no núcleo central do sistema. Qual é o mais marcante?
A situação é ambígua. Considerando a lista dos concorrentes às eleições constituintes de 25 de Abril de 1975 surge uma surpresa: dos 12 partidos de então, só dois constam dos actuais boletins de voto: Partido Socialista e Partido Popular Monárquico. Outros dois mudaram de nome (PPD e CDS) e um concorre apenas em coligação (PCP). Os sete restantes simplesmente desapareceram (MDP, FSP, MES, UDP, FEC, PUP, LCI). Isto confirma algo óbvio: o nosso panorama político, tal como o País, mudou muito em 39 anos.
Outra face do mesmo vê-se nas últimas legislativas em 2011: dos 17 partidos e coligações concorrentes, cinco foram fundados já neste século (MEP, PAN, PND, PPV e PTP), com mais três na viragem do milénio (BE, PNR e PH). Desde as eleições já nasceram mais dois (MAS e L). Isso aponta para a volatilidade política como regra do nosso espectro partidário. Mas tal conclusão é ilusória. De facto, só três partidos participaram nos governos constitucionais desde 1976, e apenas dois deles os lideraram. Tal significa que existe mercado para serviços partidários fora do poder, mas também que Portugal tem uma estrutura doutrinal bastante estável. Criou-se até o conceito novo de "partidos do arco da governação" para o expressar.
 Podemos aprofundar esta linha constatando que, uma vez no Governo, todos os partidos têm comportamento paralelo, independentemente da linha ideológica. Vivemos uma época de consenso nacional, onde as grandes opções de fundo estão feitas, restando apenas elementos de competência ou retórica para distinguir as formações. Assim, objectivamente, nestes 40 anos existiram realmente duas únicas linhas políticas coerentes, a que está no poder e a que está na oposição, com diferentes partidos desempenhando esses papéis. É muito curioso ver como o mesmo agrupamento faz para, ao sair ou entrar no Executivo, inverter a sua posição sobre os temas.
Pretender eleger o partido da democracia implica, portanto, defrontar estes dois obstáculos: excesso de volatilidade formal combinado com demasiada persistência efectiva. Este é o paradoxal rosto do nosso espectro partidário.
Tomando agora os critérios para escolher o partido mais notável, a variedade também domina. Considerando o número de militantes, o vencedor é claramente o PSD, que tem quase mais que todos os outros partidos somados. O segundo, em posição destacada, é naturalmente o PS, com cerca de 75% do primeiro. Mas se o padrão escolhido for a longevidade na chefia do executivo de novo a vitória é do PSD, mas a menor distância do PS, embora metade do seu tempo no poder fosse em coligação, sobretudo com o CDS, mas também com o PS.
Falando em flexibilidade ideológica, o partido centrista, embora mais pequeno, detém o recorde, pois já teve coligações com os outros dois, doutrinalmente bastante afastados. Em termos de sucesso súbito, ninguém bate o PRD, também o recordista na rapidez da extinção.
No entanto, o partido mais notável da nossa democracia não é nenhum destes, mas o Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses, PCTP/MRPP. Na vigência da Constituição de 1976, ele foi o único partido que concorreu sozinho em todas as 30 eleições partidárias (13 legislativas, 11 autárquicas e 6 europeias). Nunca se retirou, nunca desistiu e nunca fez alianças. Nunca elegeu para a Assembleia da República, Parlamento Europeu ou câmaras municipais, e teve derrotas presidenciais do líder Garcia Pereira em 2001 e 2006. Nos 44 anos desde a fundação, a 13 de Setembro de 1970, o que tem para mostrar são sete mandatos em assembleias municipais (um em cada eleição de 1982, 1993, 1997, 2001 e 2005 e dois em 2013) e 11 em assembleias de freguesia (três em 1979, dois em 1976, 1997 e 2013 e um em 1993 e 2001). Isto é dedicação democrática!

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