Fé é plenitude de vida. É seguir Jesus na Cruz

P. DUARTE DA CUNHA | Voz da Verdade | 2014.04.13

Se em mim, e em tantos outros, vejo que a experiência da fé é de uma plenitude de vida, é porque a fé não é apenas uma convicção subjetiva da existência de Deus. Ela é muito mais. Ela envolve a pessoa toda. A fé cristã é um encontro, ou melhor, uma comunhão de amor com Jesus Cristo, e tem que ver com a pessoa inteira. Infelizmente no nosso tempo é fácil ter a sensação de que a vida está fragmentada numa soma de instantes e "partes". Não é estranho que neste ambiente a fé seja pensada e vivida como se fosse apenas uma dessas partes. Com isso ela perde a sua força e deixa de ser atraente.



A fé que nos salva não é, portanto, uma simples convicção intelectual, mas também não é, de modo nenhum, um sentimento subjetivo. Ela responde às grandes questões da pessoa: de cada pessoa e de todas as pessoas. A fé abraça todas as dimensões da vida humana. Nesse sentido, ela é, sem dúvida, uma experiência pessoal, que requer uma interioridade que dialoga com Deus, mas também exige uma pertença à Igreja, que é uma comunidade cuja natureza mais profunda é a de ser o corpo do próprio Cristo.
Se a fé introduz o crente numa vida nova e responde aos anseios da pessoa humana, é porque recupera a unidade da pessoa, tantas vezes perdida nos múltiplos fragmentos de que é composto o quotidiano e porque gera laços de amor que une as pessoas. Não podemos, porém, pensar que a fé chega e tudo está feito. Ela é um caminho. No concreto do dia a dia, a fé é seguimento de Cristo na Igreja, o que quer dizer que é "pegar na Cruz" e seguir Jesus. Este é o caminho da vida em abundância e é este o anúncio cristão. Querer aligeirar o peso da cruz ou adocicar o anúncio cristão, pensando tornar a fé mais fácil, significa afastar-se de Cristo e, por isso, da vida plena. Somos chamados a ajudar os outros não para convencê-los a abandonar a cruz, mas para os ajudar a carregar a cruz, como Simão de Cirene fez com Jesus. Tal como a fé pessoal é participação na fé da Igreja, também o carregar da cruz é algo de profundamente pessoal e, ao mesmo tempo, é partilhado pela Igreja. 
O que é, no fundo, a nossa cruz? Em parte podemos dizer que ela coincide com as circunstâncias da vida. É aí onde a vida acontece, com toda a sua dramaticidade, e, por isso, é aí que experimentamos o peso do sofrimento e muito especialmente do pecado. Jesus pede-nos para abraçar a vida real para o encontrar aí e vencer com a Sua graça e misericórdia o pecado. Ora o que aprendemos com a Páscoa é que a plenitude de vida coincide com a cruz porque coincide com o amor de que a cruz é sinal. Claro que se a cruz for reduzida ao peso das circunstâncias – tantas vezes muito complicadas – não faz sentido, mas se a cruz é amor e comunhão com Jesus ela torna-se já participação na vida gloriosa de Jesus e essa é a felicidade. Faz parte da vida cristã pegar na cruz e seguir Jesus. Contudo não é a cruz que em si salva, mas Jesus na Cruz, ou seja, no dom da Sua vida. Isto quer dizer que pegar na cruz é antes de mais nada abraçar Jesus na vida. É a relação com Jesus que importa.
Jesus salva-nos na cruz porque o Seu amor é total. Essa é a totalidade de vida, a unidade de vida e, por isso a felicidade que buscamos. Quando dizemos que é necessário pegar na cruz para nos salvarmos não devemos pensar que a salvação virá como prémio a quem pegou na cruz. Aliás, a cruz não tem valor por ser pesada, mas por ser amor, por ser acolhimento de Deus – ela é um sim a Deus – e da Sua misericórdia que leva à conversão, e, consequentemente, é um colocar-se ao serviço dos outros.
Temos, porém, um grande problema, é que não é possível a uma pessoa humana dar-se plenamente sem ser libertada. O pecado fecha o homem em si, dificulta o dom de si. A fé, por isso, que confere a unidade à pessoa, é também libertadora. A Páscoa é festa de libertação porque é a festa do dom total de Cristo que nos faz participar na Sua vida de ressuscitado que não é uma vida fácil mas uma vida dedicada aos outros e oferecida a Deus. É deste modo que a plenitude de vida se torna experiência e deixa de ser um sonho. 
Com as possibilidades técnicas e científicas surgiu no nosso mundo o sonho de que a felicidade seria a ausência da cruz. E com isso foi-se inventando um novo cristianismo, baseado em ideais longínquos como a paz no mundo e o fim da pobreza. Em vez de cada um pegar na sua cruz passou-se a falar à distância! Em vez de nos inclinarmos a ajudar o próximo falamos dos problemas globais! Pretende-se tirar Jesus da Cruz para ficar apenas o Jesus do Monte das Bem-aventuranças. Mas nunca se pode selecionar partes de Jesus. A missão da Igreja, que não se anuncia a si mesma mas a Cristo, coincide com o anúncio do Cristo total.

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